Notícia publicada duas semanas antes da eleição presidencial norte-americana, crucial para todo o mundo: “A decisão das redes sociais Twitter e Facebook de limitar o compartilhamento de uma polêmica reportagem sobre o candidato presidencial democrata Joe Biden irritou os republicanos. Eles acusaram as empresas de censura e retaliaram com uma intimação para seus executivos depor no Congresso dos EUA”.
O caso reacendeu o debate sobre se as redes sociais devem controlar o conteúdo a circular entre seus usuários e, nesse caso, com quais critérios. Seus controladores, depois dos escândalos de sua interferência com contrapropaganda, nas eleições de 2016 nos EUA e 2018 no Brasil, tentam conter o fluxo de desinformações ou “fake News”.
Em Economia e Negócios, um Efeito de Rede, também designado externalidade de rede ou busca de economias de escala, é o efeito de um utilizador de um bem ou serviço sobre o valor do produto para outros utilizadores. Quando se apresenta, o valor de um produto ou serviço depende do número de utilizações de outras pessoas.
Em externalidade positiva, um utilizador pode usar uma rede social sem a intenção de criar valor para os outros utilizadores, mas acaba por fazê-lo, inapelavelmente. As redes sociais online, como Twitter, Facebook e Instagram, tornam-se mais úteis quantos mais utilizadores aderirem a elas.
O número de Dunbar define o limite cognitivo teórico do número de pessoas com as quais um indivíduo pode manter relações sociais estáveis. Neste tipo de relação, o indivíduo conhece cada membro do grupo e sabe identificar em qual relação cada qual se encontra com os outros indivíduos do grupo.
Proposto pelo antropólogo britânico e psicólogo evolucionário, Robin Dunbar, ao analisar pequenos grupos ao longo da História da Humanidade, esse número costuma variar entre 100 e 230 pessoas. O tamanho de pequenas comunidades – tribos, aldeias, grupos de interesse comum – costuma se manter nessa faixa. Por exemplo, 150 é a média do número de acadêmicos em uma sub-especialização de uma disciplina.
Um pergunta-chave contemporânea é se a derrocada em representatividade coletiva de um sistema partidário fragmentado se deve:
- ao individualismo dos pretendentes a se tornarem “representantes do povo” e/ou
2. às redes sociais intolerantes à hierarquia imposta de fora, autoritariamente?
As redes informais costumam ter uma relação altamente ambivalente, seja submissa a um mito, seja hostil com as instituições estabelecidas.
Há fluxo e refluxo irregular na história. Houve longas épocas quando as estruturas hierárquicas dominaram a vida humana e eras históricas mais raras quando as redes foram favorecidas, graças em parte às mudanças na tecnologia: imprensa, internet, etc.
Quando a hierarquia predominava, o poder de cada indivíduo equivalia ao do seu degrau na escada organizacional de um Estado, corporação, ou instituição sistematizada de modo similar como um partido. O de feição leninista, seja à esquerda, seja à direita, impunha seu “centralismo democrático”. Cabia aos “índios” mitificar, de maneira bovina, “o cacique”, recitando a ladainha: “Tudo o que o seu mestre mandar… Faremos todos! E se não fizer? Levaremos bolo!”
No caso contemporâneo, o “bolo” é o congelamento, o isolamento ou o cancelamento. Quanto mais pessoas em um grupo social, maior a demanda por esforço na socialização por parte de seus indivíduos. O medo da solidão impera em meio aos ínfimos “likes”.
De maneira pressuposta, quando as redes predominam, o poder de cada um equivale ao da sua posição em um ou mais grupos sociais estruturados horizontalmente. Abominam, por isso, a hierarquia vertical de cima para baixo.
Dúvida atroz do militante moderno: é melhor hoje fazer parte de uma rede influente em lugar de uma hierarquia poderosa? De qualquer jeito, somos cidadãos de um Estado hierárquico, empregados de uma corporação hierárquica, estudantes ou professores de uma instituição educacional sob a hierarquia de títulos, currículos ou patotas.
São curiosos e expressivos os significados de “patota”: intenção ou ato de quem busca trapacear no jogo; ato para induzir alguém em erro; negócio sem inspirar confiança. No popular, refere-se à “turma de amigos”. Estes a gente escolhe, colegas não…
A maioria de nós se sente mais à vontade ao pertencer a mais redes em lugar de uma hierarquia. Muitas pessoas se encantam em ter contas no Facebook ou no Twitter para seguir os comentários levianos e agressivos de adeptos das Teorias Conspiratórias.
Temos, entre outras, redes de parentes, de amigos, de vizinhos, de colegas, de pessoas com compartilhamento dos interesses pessoais em artes ou esportes. A participação em atividades de instituições com estrutura hierárquica como igrejas ou partidos políticos têm maior relação com redes, enquanto se participa como voluntários sem expectativa de compensação monetária. Em caso inverso – igreja atuando como partido em conduta mercenária –, ainda esperamos ver até qual limite é atingido pelo cinismo social.
Os mundos das hierarquias e redes se encontram e interagem. Dentro de qualquer grande corporação ou instituição, no mundo real, há redes bem distintas do “organograma” oficial. Um chefe acusado de favoritismo ou nepotismo deturpa o processo formal de promoções por mérito.
Nomenklatura (palavra russa derivada do latim) era como se designava a “burocracia”, ou “casta dirigente” da União Soviética (1917-1991). Ela incluía a alta hierarquia do Partido Comunista e submetia trabalhadores com cargos técnicos, artistas e outros oportunistas em busca de gozar da simpatia do líder para obter ascensão profissional ou mobilidade social. Nem a esquerda nem a direita se distanciaram dessa prática.
Redes com estrutura hierárquica são “mal-usadas” (sic) pelos carreiristas em busca de escalada profissional ou mobilidade social. Um YouTuber, também conhecido como celebridade do YouTube ao criar conteúdo visto por multidões, ao longo de um tempo breve ganha popularidade no site de compartilhamento de vídeos.
Networks (redes) apoiam tais celebridades. Obtêm patrocinadores corporativos. Estes pagam pela colocação de produtos (merchandising) em seus clipes ou inclusão explícita de anúncios online. Daí muitos midiáticos ambicionam se transformar em políticos profissionais com os votos de seus telespectadores, ouvintes, seguidores…
Será possível encontrar um meio-termo entre atenuar o papel das redes ou exagerar esse papel por contumazes defensores de teorias conspiratórias? Será possível uma narrativa histórica do futuro onde mudanças importantes serão compreendidas, essencialmente, como desestabilizações dessas hierarquias “artificiais”, insustentáveis ou efêmeras, estabelecidas pelas redes?
Há milhares de redes: redes de televisão, redes de computador, redes de transporte, redes financeiras, redes terroristas, redes de assistência médica, isso sem falar outras como educacionais, criminais, elétricas, de telefone, de rádio, etc. Redes sociais constituem redes de inteligência? Não parece.
Tudo isso dá a impressão de um mundo onde tudo está conectado à idiotice. Nele, os idiotas não têm consciência do malfeito a si e aos outros ao transmitir fake News ou contrapropaganda. Ao espalhar contrainformação, os membros das redes de ódio se imaginam conspiradores contra o establishment. São militaristas raivosos decididos a impor um ponto de vista diferente com “negacionismo científico”.
Um sistema de seres humanos idiotas, interativos entre si, provoca um sistema caótico. Uma fake News ou um factoide pode ser a pequena modificação inicial capaz de produzir imensos efeitos secundários, inclusive uma comoção social influente em uma eleição.
Em pesquisa realizada pelo Instituto Travessia (Valor, 16/10/2020), 28% definem-se como conservadores. Entre esses, há mais mulheres, pessoas entre 45 e 49 anos de idade, além de integrantes das classes médias baixa e alta. Esse percentual está muito próximo da base política atribuída ao bolsonarismo: em torno de 30% do eleitorado.
Quem afirma ser socialista soma 19% do total, alia-se a 3% de comunistas. Nessa esquerda, a prevalência é entre homens de 35 a 44 anos e renda de até dois mínimos por mês. Entre os liberais (19%) e os progressistas (9%), os mais jovens (de 16 a 24 anos) formam a maioria. Se somar os 9% progressistas à esquerda resulta em 31%.
Entretanto, a enquete com alcance nacional a partir de 1.010 entrevistas por telefone, indica 32% preferirem candidatos à direita no espectro ideológico. Esses eleitores são majoritariamente homens, em idades de 35 a 49 anos, ganham entre 2 e 5 mínimos mensais na classe média baixa, mas também incorporam os mais ricos com renda de 10 salários ou mais. Só́ ficam de fora desse grupo os mais pobres, com renda de até 2 mínimos.
Os políticos de esquerda têm a preferência de 20% dos pesquisados, na maioria homens jovens (entre 16 e 24 anos). O centro tem o apoio de 16% do eleitorado, em um segmento no qual as mulheres predominam. A cota de “quem não sabe responder à pergunta” é bastante significativa por alcançar 32% e empatar com os direitistas.
No segundo turno, o efeito da rede (e de sistema partidário fragmentado) se afunila na opção binária: Tico ou Teco. Esses “2 neurônio” (sem S, sic) não conversam entre si e escolhem. Cerca de 1/3 se omite com votos nulos ou inválidos, outro 1/3 vota na direita. Se a esquerda se aliasse ao centro, em Frente Ampla, a centro-esquerda ganharia por pouco: 36% a 32%.
Mas esse seria o caso de voto majoritário, apurado em todo o território nacional. Tal como na eleição norte-americana, desconsidera as decisivas nuances locais. De maneira pragmática, predominará a reeleição de prefeitos “testados e aprovados” – e não a ideologia.
Efeitos de Rede, Partidos e Ideologia publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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