Talita Moreira (Valor, 08/08/19) informa: o governo inoperante discute com o setor imobiliário o projeto de locação social, inspirado no existente PAR há muitos anos. Ele deve substituir o Minha Casa Minha Vida (MCMV) para as famílias com renda enquadrada na faixa 1. Uma possibilidade é relançar o programa perto de 7 de setembro, Dia da Independência, como mera propaganda política para um governo impopular a não ser para coxinhas boçais, militares e evangélicos submissos.
A ideia é as famílias de menor renda (onde a inadimplência é alta) receberem benefício para alugar o imóvel e possam comprá-lo com o tempo, em espécie de leasing residencial existente há décadas sob denominação de PAR – Programa de Arrendamento Residencial. Nas demais faixas, o modelo continuará sendo o de compra. O FGTS deve bancar, neste ano, R$ 9 bilhões em subsídios ao MCMV. O fundo representa 90% dos benefícios concedidos no programa. O restante vem do Orçamento da União. A medida é um pleito das construtoras para agilizar as obras, que estão paralisadas.
As discussões sobre os recursos para o MCMV mostram, na habitação social, não existir apenas uma questão de funding, mas também de capacidade de gerar dinheiro para subsidiar as famílias. O segmento de baixa renda precisa de crédito imobiliário com subsídio e juros baixos, o que requer políticas governamentais. No mundo todo, o comprador de baixa renda é subsidiado.
Pilar do financiamento à habitação social no Brasil, o FGTS terá seu perfil de investimentos rediscutido pelo governo do capitão ignorante nos próximos meses. O desafio é manter a rentabilidade das cotas em um ambiente de juros mais baixos.
As medidas em estudo incluem ampla revisão de receitas e despesas, além da busca por novos ativos em áreas como infraestrutura, saneamento e mobilidade urbana, diz o diretor do Departamento do FGTS no Ministério da Economia. Também se cogita revisão da gestão do fundo, hoje monopólio da Caixa. O fundo precisa encontrar uma solução para o desafio dos juros menores.
O nó do FGTS existe independentemente das novas regras para o saque dos recursos pelos trabalhadores. O grande dilema é o crédito à habitação responder por 60% dos ativos do fundo, por determinação legal, mas gera retorno inferior aos 3% mais TR pagos aos cotistas. A rentabilidade dos outros 40%, portanto, precisa compensar essa defasagem.
Mas hoje, para o depositante, isso não é assim, por conta do rendimento do FGTS superar o de depósito de poupança. A fórmula para essa compensação nos últimos anos está em xeque. Boa parte da receita do FGTS vem da aplicação de quase R$ 100 bilhões em títulos públicos, mas o rendimento desses papéis recua junto com a Selic. A taxa básica de juros da economia foi cortada em julho para 6% ao ano e a expectativa é que caia ainda mais.
O caminho para o FGTS passa por encontrar novos ativos para investir. Isso inclui projetos “maduros” de infraestrutura. Mas é preciso que haja um processo para a seleção de bons projetos, já que o FI-FGTS teve várias perdas.
As despesas também estão sob revisão. O governo considera elevados os gastos operacionais: totalizaram R$ 20,5 bilhões entre janeiro e setembro de 2018, informação mais recente disponível. O contrato de R$ 5 bilhões com a Caixa, por fazer a gestão dos recursos, é um dos pontos a serem revistos. Mas ainda não há clareza sobre o modelo a ser seguido.
Por enquanto, o que há de mais concreto é um programa de digitalização de processos. A expectativa é, com isso, as despesas caírem e a geração de receitas melhorar, por exemplo, em áreas como cobrança judicial de contribuintes inadimplentes com o fundo.
As discussões ocorrem em momento quando o governo amplia as possibilidades de resgate dos recursos do fundo, com a criação do saque-aniversário. Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, afirma as medidas foram calibradas de forma as retiradas com a nova modalidade serem equivalentes às do modelo atual, por demissão.
De acordo com Sachsida, o governo prevê até um efeito positivo para o fundo, porque a expectativa é as medidas ajudarem a aumentar a formalização da economia. A estimativa do ministério é, em dez anos, haver incremento de R$ 11 bilhões no fundo. O governo não tem a menor certeza de o funding à habitação ficar inalterado!
No Brasil, quem vive longe dos grandes centros urbanos e das plataformas de investimentos, a boa e velha poupança ainda tem seu apelo. A expectativa de bancos e empresas do setor imobiliário é que os recursos da caderneta continuem crescendo, ainda que de forma “vegetativa”.
O grande poupador vai para rentabilidades maiores, mas o pequeno fica. Nunca houve ameaça, nem nos tempos de crise.
A Abecip, associação das instituições financeiras que fazem crédito imobiliário com funding da poupança, prevê crescimento de 11% no saldo das cadernetas neste ano, para R$ 686 bilhões. Até julho, entretanto, a poupança teve resgate líquido de R$ 16,1 bilhões.
A captação negativa é mais resultado da economia fraca em vez de migração para outros investimentos. As plataformas digitais ainda atingem um público restrito.
Apesar disso, é consenso: a poupança será insuficiente para financiar o crescimento que se espera para o crédito imobiliário. O estoque da poupança era maior do que o crédito imobiliário. Hoje, não mais é suficiente, diz o presidente da Abecip.
No Banco Central (BC), a constatação é que o segmento não vai mudar de patamar apenas com esses recursos, daí a busca por alternativas de mercado, apurou o Valor. O presidente do órgão regulador, Roberto Campos Neto, tem ressaltado a importância do crédito imobiliário – linha de longo prazo, taxas de juros baixas e com garantia – para a economia. A visão do BC é que os imóveis têm um valor que hoje não é aproveitado para alavancar negócios, como se faz em outros países com o financiamento lastreado em ativos imobiliários (“home equity“).
Face à toda essa incompetência de gente de O Mercado fingindo saber fazer política pública para a população pobre, a expansão do crédito imobiliário nos próximos anos está condicionada à capacidade do setor de atrair recursos do mercado de capitais. As fontes capazes de bancarem os projetos até aqui – poupança e FGTS – não vão se esgotar tão cedo, mas serão insuficientes para atender a demanda diz o discurso tipo “me engana que eu gosto”…
O governo diz saber ter um desafio pela frente e, por meio do Ministério da
Economia e do Banco Central (BC), planeja uma série de ações com o intuito de tornar o mercado de títulos imobiliários mais atrativo para investidores. As medidas, em diferentes estágios de estudo, vão da liberação do uso do IPCA para indexar contratos no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) à criação do registro de recebíveis das incorporadoras.
A discussão sobre o funding ganha relevância por duas razões. Uma é que o governo espera aumentar a participação do crédito imobiliário no PIB – no Brasil, essa relação está em torno de 9%, metade do que se vê, por exemplo, no Chile, e muito inferior aos 68% vistos nos Estados Unidos. Ueba, vão inflar uma bolha imobiliária!!!
A outra questão é a queda na taxa Selic pressionar as duas fontes principais de recursos para o setor.
- No caso do FGTS, fontes importantes de receita – sobretudo, investimentos em títulos públicos – estão sob ameaça. Há também a mudança na forma de saques das contas do fundo. A medida foi desenhada pelo governo para neutralizar o impacto, mas o modelo ainda não foi testado na prática e preocupa as construtoras.
- Nos depósitos de poupança, há uma tendência de migração dos investidores para outras classes de ativos. A caderneta acumula resgate líquido de R$ 16,1 bilhões neste ano até julho.
“O crédito imobiliário vai crescer 30% neste ano e a poupança, não”, afirma o presidente da Abecip, associação de instituições financeiras atuantes no segmento. Para ele, o saldo da poupança vai crescer entre 6% e 10% “em um ano bom”.
A Abecip prevê alta de 13% no volume de financiamentos imobiliários concedidos neste ano, para R$ 132 bilhões. O crédito com recursos da poupança (SBPE) deve crescer 31%, para R$ 75 bilhões, enquanto as operações com funding do FGTS – basicamente, Minha Casa, Minha Vida (MCMV) – devem recuar 4%, para R$ 57 bilhões.
Na estrutura atual, há uma transferência de renda de quem poupa para quem toma o crédito imobiliário. É lógico que o funding secou e vai secar.
Estimativa da Habitat Capital Partners, gestora de fundos imobiliários, aponta falta funding para cerca de 300 mil imóveis por ano se consideradas as necessidades habitacionais para os próximos dez anos e o número médio anual de unidades financiadas com poupança e FGTS na última década. Os vendedores de ilusões dizem “esse espaço terá de ser preenchido pelo mercado de capitais”.
Somente para preencher essa lacuna, o volume representado por instrumentos como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), Letras Imobiliárias Garantidas (LIG) e Letras de Crédito Imobiliário (LCI), que hoje soma R$ 230 bilhões, teria de crescer quase 50%, segundo cálculo feito pelo Valor.
O crédito imobiliário no Brasil está muito concentrado nos bancos por causa da poupança e do monopólio da Caixa no FGTS. Tem de destravar essas amarras para o mercado crescer, imagina a casta dos mercadores controladora do governo.
O país tem um déficit habitacional de 7,7 milhões de residências e uma demanda de 9 milhões de novos domicílios até 2027, segundo estudo elaborado pela FGV para a Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).
FGTS e poupança foram e continuarão importantes, mas o setor não pode ficar preso a dois bolsões de funding.
A boa notícia é o mercado brasileiro começar a reunir as condições para se desenvolver. A taxa básica de juros desceu a 6% ao ano, com viés de baixa, e o marco regulatório está adequado após a solução para os distratos. Cada queda de 1 ponto percentual na Selic tem o potencial de colocar no mercado imobiliário mais 200 mil famílias, calcula o Bradesco. O que falta agora é uma melhora da confiança, o que passa pela recuperação do emprego.
A expectativa é, com juro baixo, papéis como LIG e CRI ganhem relevância e representem bem mais além da fatia atual de 18% no total do funding. No entanto, o governo desenha algumas mudanças nesses instrumentos para torná-los mais atrativos.
Uma das grandes mudanças previstas é a liberação do uso de índices de preço, como o IPCA, para indexar contratos de financiamento imobiliário. Desde o ano passado, isso já é possível nas operações feitas no Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), mas o efeito foi pequeno porque essas linhas atendem principalmente imóveis mais caros.
Por isso, nas próximas semanas o BC deverá estender a permissão ao SFH, modalidade em que os bancos seguem regras mais rígidas e o comprador pode usar recursos de sua conta do FGTS para comprar residências avaliadas em até R$ 1,5 milhão. A medida precisa ser aprovada pelo Conselho Monetário Nacional.
A Caixa aposta nesse caminho e aguarda a liberação dos reguladores para lançar linhas atreladas à inflação, por ora baixa, mas em 35 anos… Elas vão variar entre IPCA mais algo em torno de 3% a 5%, dependendo do relacionamento do cliente com o banco. O plano do presidente da instituição, Pedro Guimarães, é “empacotar” esses créditos, securitizá-los e vendê-los — e então abrir espaço no balanço para novas operações. A intenção da Caixa é distribuir parte dos CRI entre seus próprios clientes, em operações com taxas da ordem de IPCA mais 2% para os investidores.
A indexação dos contratos por índice de preços é considerada vital para a securitização. Hoje, praticamente não existe CRI de empreendimentos residenciais porque estes são necessariamente atrelados à Taxa Referencial (TR). Os investidores a consideram arbitrária e difícil de travar com mecanismos de “hedge”.
Os bancos vão ter apetite pelo IPCA até para manter em carteira. São créditos mais fáceis de negociar.
Pelo sonho da casta dos mercadores, a indexação pelo IPCA vai gerar concorrência aos bancos na oferta de crédito imobiliário ao facilitar a venda desses ativos. Uma pequena companhia hipotecária não consegue carregar uma operação de 30 anos no balanço.
Apesar de expor o tomador do crédito e os bancos à oscilação inflacionária, a indexação pelo IPCA não representa grandes riscos, na visão do BC presidido por operador de mercado. Os modelos de crédito das instituições financeiras vão definir o produto correto para cada cliente. Mas o Banco Central vai observar e poderá aumentar as exigências de capital se detectar problemas. Também há quem defenda as taxas serem repactuadas de tempos em tempos, como em outros países, quando essa condição gerou a crise da dívida externa dos anos 80.
As linhas baseadas no IPCA poderão usar funding tanto da poupança ou quanto de captações no mercado, como a LIG para financiar imóveis voltados às classes média e alta. Caso a taxa Selic continue em trajetória de queda, é possível os contratos indexados pela inflação chegarem às faixas mais altas da habitação social, financiada pelo FGTS. Esse, no entanto, é um processo longo ou fantasioso.
“O funding terá de vir cada vez menos de direcionamento e mais de mercado”, afirma gente de bens de O Mercado. Com essa expectativa, lançam fundo imobiliário, cujas cotas começam a ser negociadas para investir em CRI de empreendimentos espalhados pelo interior do país.
A solução desenhada por essa gente no poder no máximo por mais 3 anos para o Brasil prevê a coexistência da securitização, comum no mercado americano, e de títulos bancários garantidos por carteiras imobiliárias, modelo europeu. Por essa mistura à brasileira, o governo também pretende mudar a legislação da LIG. Inspirado nos “covered bonds” europeus, esse papel tem dupla garantia: do banco emissor e de um conjunto de ativos imobiliários.
O Ministério da Economia estuda já alterar a legislação recentemente criadora das letras imobiliárias garantidas para permitir os títulos serem emitidos também no exterior, mantendo a isenção tributária para investidores. Com isso, seria possível acessar “um bolso muito mais profundo”, especialmente na Europa.
Ao mesmo tempo, a Comissão de Valores Mobiliários deve regulamentar dois pontos relacionados à LIG: a criação de um mercado secundário e a possibilidade ofertas simplificadas, como as das emissões de Certificados de Operações Estruturadas (COE).
É cedo para saber qual modelo vai prevalecer, mas por ora os bancos privados preferem a LIG à securitização, até porque no mercado local não há grande tradição de venda de carteiras de crédito ativas. A LIG vai ser o carro-chefe, vai ter o grande papel na expansão do crédito imobiliário. Tem liquidez mais adequada e oferece prazos longos.
Esses títulos começaram a ser emitidos no fim de 2018, o mercado talvez alcance estoque no máximo de R$ 15 bilhões até dezembro. A tendência é, com o tempo, esses papéis substituírem a LCI, cujo lastro está atrelado ao direcionamento da poupança.
O BC trabalha ainda em outras frentes. Uma delas prevê a criação de mecanismos de registro de recebíveis das incorporadoras, da mesma forma feito com cartões de crédito. Assim, essas empresas poderiam usar esses ativos como garantia para se financiar não apenas nos bancos, mas também com outros investidores.
Outra iniciativa no radar do BC é permitir cooperativas de crédito passarem a captar poupança para o setor imobiliário, e não só rural, como fazem hoje. Com isso, entrariam mais competidores. A medida faz parte da Agenda BC#, mas não tem prazo para ser adotada.
MCMV: Destruição para Reconstrução sob Mercado de Capitais (Crônica do Fracasso Anunciado) publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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