quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Fronteira Agrícola do Brasil: Centro-Oeste

Fernando Lopes (Valor, 27/07/2020) informa: com novas colheitas recorde de soja e milho e o mais numeroso rebanho bovino do país, o Centro-Oeste do país alcançará, em 2020, o maior valor bruto da produção (VBP) agropecuária de sua história e confirmará a condição de líder do campo brasileiro.

Dados do Ministério da Agricultura mostram: puxado pelos grãos, o VBP das lavouras de Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul e do Distrito Federal (a conta inclui 21 produtos) deverá somar R$ 168,4 bilhões neste ano, 17,5% mais se comparado com 2019. Em relação ao resultado de 2011, o aumento é de 92,5%, ou R$ 80,9 bilhões.

Esse aumento representa 66% da alta do VBP das lavouras de todas as regiões do país na última década. Segundo as projeções do ministério, o VBP agrícola nacional atingirá R$ 480 bilhões em 2020, com altas de 11,6% ante o ano passado e de 34,3% (ou R$ 122,6 bilhões) na comparação com 2011 – os valores estão deflacionados pelo IGP-DI da Fundação Getulio Vargas (FAGV) de junho.

Soja e milho lideram o avanço do VBP agrícola do Centro-Oeste. A colheita de soja na região somou 58,9 milhões de toneladas na safra 2019/20, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), 12% a mais que em 2018/19 e volume 73,7% superior ao do ciclo 2010/11. Na última década, a região respondeu por 54,8% do incremento da colheita brasileira da oleaginosa, que em 2019/20 atingiu 120,9 milhões de toneladas.

A seu favor na balança, o Centro-Oeste conta com propriedades produtoras de grãos em média maiores que as das demais regiões. Seus donos sabem que têm de investir em tecnologia desde que a Embrapa começou a desenvolver sementes adaptadas ao Cerrado, na década de 1970, e hoje contam com uma multiplicação de ferramentas digitais para melhor aproveitar a possibilidade de cultivar duas safras com produtividades elevadas.

Daí porque a colheita de milho também baterá recorde em 2019/20. Semeado sobretudo na safra de inverno, depois de colhida a soja de verão, o cereal deverá render 55,6 milhões de toneladas em 2019/20, com crescimento de 5,3% em relação a 2018/19 e de 221,4% ante 2010/11. Assim, o Centro-Oeste responderá por 88,7% do incremento da colheita total brasileira na última década.

Embora todas as unidades federativas do Centro-Oeste apresentem avanços, Mato Grosso é o grande destaque. No maior Estado agropecuário do Brasil, o VBP das lavouras, encabeçado por soja e milho, deverá alcançar R$ 102,3 bilhões em 2020, 110,5% mais que em 2011.

O cruzamento de dados do ministério também mostra que, enquanto a participação do Centro-Oeste no VBP agrícola sobe de 24,5%, em 2011, para 35,1%, em 2020, caem principalmente as fatias do Sudeste e do Sul. No Sudeste, a queda nos últimos dez anos é de 32,8% para 24,9%, enquanto no Sul, origem de boa parte dos agricultores do Brasil central, é de 26% para 20,7%.

Com a demanda internacional aquecida e as compras domésticas firmes e com perspectivas positivas – sobretudo por parte de frigoríficos de aves e suínos -, a expansão das lavouras de grãos continua a preocupar os ambientalistas, uma vez que o Cerrado já sofreu grande desmatamento e a tendência pode se aprofundar, por mais que grande parte do avanço das lavouras seja sobre áreas de pastagens degradadas.

Em meio a um processo de intensificação, e também estimulada por novas tecnologias, as cinco principais cadeias da pecuária deverão alcançar um valor bruto da produção de R$ 56,6 bilhões no Centro-Oeste este ano, aumentos de 7,2% sobre 2019 e de 32,2% (ou R$ 14,1 bilhões) na última década. Nessa frente, a região respondeu por 26% da alta do VBP brasileiro desde 2011.

Os bovinos puxam a fila do valor da produção da pecuária. Nessa cadeia, o VBP deverá chegar a R$ 38,7 bilhões no Centro-Oeste em 2020, 42,8% mais que em 2011. São mais R$ 11,6 bilhões em uma década, ou 36,1% da alta total registrada pela bovinocultura no país. Mato Grosso também é o principal Estado da região quando se trata de pecuária.

Na pecuária, quem mais perdeu enquanto a participação do Centro-Oeste passou de 23,3% para 23,9% foram Sul e Nordeste. No Sul, a fatia do total deverá ficar em 30,4% em 2020, ante 33,5% em 2011, e no Nordeste a queda é de 7,3% para 6,5%.

Para especialistas, como tem escala maior, empresários rurais cada vez melhor preparados, tecnologia à disposição e novas fontes de financiamento no mercado, o Centro-Oeste deverá ampliar sua liderança no campo brasileiro nos próximos anos.

“O Centro-Oeste é o Maracanã onde será jogada a partida a final da copa do mundo dos alimentos”, afirma Roberto Rodrigues, coordenador do FGV Agro, o Centro de Estudos em Agronegócios da FGV – e, claro, o ex-ministro da Agricultura aposta todas as fichas na vitória do Brasil.

Com quase metade da próxima safra vendida, os produtores de Mato Grosso já começaram a comercializar a soja que será colhida em 2022. As primeiras negociações foram confirmadas na semana passada pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea). A antecipação é puxada pelo câmbio vantajoso e reflete o bom momento do grão no Estado, que teve colheita recorde neste ano e preços acima de R$ 100 para a saca disponível em julho.

Os contratos antecipados são fechados, geralmente, a partir de dezembro. A precocidade das negociações para a safra 2021/2022 surpreende quem acompanha o setor. A comercialização ocorre 15 meses antes do plantio e 18 meses antes da colheita do grão. “Não é tão comum vender tão adiantado. Nessa velocidade, quantidade e montante nunca vimos antes no Estado”, disse Marcel Durigon, responsável pela área de agricultura do Imea.

O dólar acima de R$ 5 é um item determinante. A valorização da moeda levou o preço da saca de soja disponível a ultrapassar os R$ 100 neste mês, patamar inédito para o produtor mato-grossense. Mas restam poucos grãos para pronta entrega. Quase 96% da safra colhida esse ano já foi vendida.

A antecipação também é influenciada por um conjunto de fatores, como as exportações em alta, facilitadas por incrementos na logística para envios pelo Arco Norte e impulsionadas por quebra de safra nos EUA e problemas de escoamento na Argentina.

“O mercado quer se antecipar para ter segurança sobre a matéria-prima e o ano foi bom para o produtor, já que a valorização do dólar ajudou nos preços. Fica bom para o agricultor e para o comprador”, relata o especialista.

As dúvidas sobre a relação comercial entre EUA e China e uma possível, mesmo que improvável – o conflito entre os dois países até se acentuou na última semana – queda acentuada nas compras da oleaginosa brasileira pelos chineses em detrimento da americana também pesam na decisão dos mato-grossenses. Os negócios fechados para 2022 até agora são majoritariamente para exportação. O produtor não sabe o que vai acontecer com o mundo, para ele é importante se puder fixar preço bom.

O Imea ainda não tem um balanço do volume negociado, mas diz que as principais tradings e muitas revendas já fecharam contratos em algumas regiões do Estado, responsável por cerca de 10% da produção mundial de soja.

Fonte do setor exportador diz que a comercialização para 2022 ainda é tímida, com cerca de 1 milhão de toneladas de soja ou 3% do volume previsto. Já a negociação para a colheita de 2021 segue avançada. Entre 50 e 55 milhões de toneladas já foram vendidas para as tradings em todo o país. No caso do milho, o número gira em torno de 13 a 17 milhões de toneladas.

Os preços não foram revelados, mas Durigon garante que eles não se distanciam dos valores negociados para o ciclo que terá início em outubro. Em junho, a saca de 60 quilos da soja foi travada a R$ 89 em Mato Grosso para 2021. Mais de 47% da safra 2020/21 já foi negociada, outro recorde. “Mais que o dobro do volume negociado em julho de 2019 e da média dos últimos cinco anos”, revela o Imea.

O cenário se repete no milho, puxado mais pelas exportações do que pela demanda das usinas de etanol para 2022, segundo o vice-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Glauber Silveira. “O produtor está aproveitando a alta do dólar e negociando para travar os custos a longo prazo”, afirmou o dirigente.

De acordo com o Imea, mais de 87% da safra do cereal que está sendo colhida já foi vendida. Para 2020/21, os negócios começaram em fevereiro e já atingiram 40% este mês, bem acima dos 26% registrado em julho do ano passado.

Fronteira Agrícola do Brasil: Centro-Oeste publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



Nenhum comentário:

Postar um comentário