Investiguei os dados atuais sobre as Finanças Pessoais no livro O Trabalho: Capital Acumulado (Blog Cidadania & Cultura; julho 2020). Na minha nova pesquisa sobre a alavancagem e a desalavancagem financeira, ocorridas na última década, cujo relatório denominei “Golpe Econômico: Locaute ou Nocaute da Economia Brasileira”, meu foco se incidiu sobre Finanças Corporativas e, brevemente, Finanças Públicas.
Reuni fatos e dados contra a retórica neoliberal. Infelizmente, o debate midiático brasileiro não é plural nem impessoal. Por isso, quem os assiste ou lê só vê um lado da questão. Não aprende o contraponto crítico. Daí pode errar em suas decisões no mundo real pleno de conflitos de interesses.
“Não há história sem rosto” em cobertura jornalística. O individualismo metodológico não se importa com o fato de sucesso depender muito mais da situação econômica geral ou evolução sistêmica. Este é o viés de atribuição de quase tudo a um único indivíduo.
Enquadramento noticioso se refere à teoria de comunicação adotada pela “grande” imprensa brasileira. A mídia se utiliza de certas ideias, expressões e adjetivos de modo a moldar o acontecimento à sua feição ideológica, destacando alguns aspectos e ocultando outros.
Assim, recorta apenas determinado ângulo do fato ou do problema tratado, tornando-o mais conhecido por algum depoimento pessoal, e, portanto, mais real. Condiciona a atitude dos cidadãos em relação ao ocorrido e, eventualmente, interfere nos processos de mudanças sociais. Aborda apenas um ângulo de visão sobre o fato.
Através da análise do enquadramento, utilizado por um veículo de mídia, pode-se perceber sua linha editorial e os interesses defendidos por ele. É o caso do jornalismo econômico oficioso e seus economistas neoliberais habituais. Os escolhidos são “os midiáticos”.
Eles se desdobram em apontar ideologicamente a causa costumeira para o mau desempenho de O Mercado: seus adversários progressistas ao pressionarem pelo aumento do gasto social. Face à essa teoria conspiratória, já fazem lobby junto ao seu colega Guedes para dar prosseguimento ao chamado “austericídio”, ou seja, manter a austeridade fiscal (“teto dos gastos”) sem perceber isso ser um suicídio econômico.
Têm a tendência de interpretar novas informações de modo elas sempre serem compatíveis com suas teorias, visões de mundo e convicções. Filtram, então, novas informações contraditórias de tal forma suas crenças permanecerem intactas sem testar suas hipóteses como a ciência exige.
Não se importam muito com a veracidade dos fatos disseminados em narrativas orientadas por sua ideologia. O algoritmo deles os força a sustentar posição absurda, face à Grande Depressão deflacionária. Basta corresponder ao medo ou à raiva de seguidores ignorantes. Cultivam a cólera do “povo” contra a “elite intelectual” progressista.
Cometem também o viés do algoritmo: movem cada vez mais apenas em comunidades de pessoas com pensamento econômico e ideológico tal como o deles.
O diagnóstico é o simplório já esperado com a acusação do culpado de sempre: O Estado. A novidade é o populismo de direita.
Quanto a O Mercado, nenhuma crítica há para esse ser divino, contraditoriamente, onipotente e onisciente, mas sempre onipresente. Prosseguem com a ladainha em louvação às Reformas Neoliberais.
O eterno combate deles é contra o desenvolvimentismo, mesmo tendo sido militar nos anos 70. Com o Estado desenvolvimentista, a economia brasileira obteve a maior taxa média anual de crescimento no mundo no século XX de 1940 até 1980. Foi quando assumiu o poder o monetarismo e, em 1988, o neoliberalismo, todos defendidos por eles.
Atribuem todas as mazelas à esquerda com o pressuposto dos “esquerdistas” não terem a mesma inteligência, imaginada ser retida apenas por eles. Aí brigam contra os fatos.
O governo neoliberal-autoritário, apoiado por seus colegas, cortou a expectativa de ajuda financeira às empresas não-financeiras, por meio do BNDES, sob o argumento de os bancos privados e o mercado de capitais já terem resolvido grande parte dos problemas. A equipe econômica diz: “as grandes companhias tiveram acesso a crédito com soluções privadas”. Revela, mais uma vez, sua inapetência ideológica para agir, dada sua incompetência técnica, formada na doutrina pró-business.
“O mal virá para o bem” se os empresários mal atendidos em suas necessidades de crédito reverem seu apoio ao neoliberalismo, aliado ao autoritarismo militar. Quando surge uma crise sistêmica percebem a necessidade de atuação anticíclica dos bancos públicos federais.
O individualismo metodológico é revelado pelos economistas neoliberais ao defenderem a educação de indivíduos ser o necessário e suficiente para o desenvolvimento. Do restante, cuida O Mercado.
Curiosa é a atitude típica de intelectuais neoliberais de direita, aqui na filial brasileira e lá na matriz norte-americana: salvar o capitalismo contra os capitalistas reais “de carne-e-osso”. Pretendem impor o capitalismo da meritocracia, isto é, do mérito só deles, contra o capitalismo de compadrio, isto é, dos supostos “amigos do rei”.
Defendem a concorrência acima de tudo, destacadamente, acima de o relacionamento corporativo e as defesas de seus interesses particulares pelas associações patronais. Confrontam-se com o capitalismo do mundo real.
O programa econômico deles é um “saco-de-maldades” como uma purgação para levar ao pressuposto paraíso do capitalismo competitivo, meritocrático e igualitário. Imaginam o sistema capitalista poder ser tal como lido em seus manuais… E jamais visto na realidade.
Liberal de verdade é quem conjuga os valores básicos dos direitos e liberdades individuais com tolerância e respeito às minorias. Enfatiza a condição da igualdade de oportunidades para haver justa avaliação de méritos de cada indivíduo.
Defende o Éthos da comunidade. Embora critique o conluio com corporações no Capitalismo de Compadrio, rejeita a estatofobia do liberismo. Frente à dicotomia Estado ou Mercado, apoia o terceiro pilar da sociedade democrática: a Comunidade.
O princípio do planejamento econômico contraria a ideologia do liberalismo restrita ao “liberismo”, isto é, à defesa da liberdade econômica de mercado acima de todas as demais liberdades. Sempre houve participação de Estados capitalistas na economia de mercado, notadamente, para atuação anticíclica.
Um bom governo é avaliado por resultados econômicos, sociais e políticos. Não deve ser cobrado pela execução de um plano consistente com a ideologia apregoada por neoliberais, sequer debatida na campanha eleitoral, ou seja, deixar o Estado mínimo.
O “posto Ipiranga”, ex-banqueiro de negócios, um dos fundadores do Instituto Millenium, um think tank neoliberal brasileiro, é apenas um ideólogo. Pauta o governo com excesso de ideologia, misturando “liberismo”, autoritarismo militar e conservadorismo evangélico de costumes. Ah, tempera essa mistura com pitadas de olavismo, terraplanismo, negacionismo da ciência…
O objetivo desse meu Relatório de Pesquisa, cujo link se encontra no início do artigo, é recuperar e aprofundar a análise do fio-condutor do processo cumulativo de problemas econômicos, gerador de um ambiente propício à articulação golpista. A avaliação da situação financeira de uma amostra representativa das empresas não-financeiras, pré e pós-golpe, joga mais luz sobre os cenários futuros possíveis.
Não há base científica para, atualmente, fazer com precisão uma previsão de cenário futuro. Como a pandemia se trata de um evento extraordinário global com quebra de oferta e da demanda agregada, não há regularidade do passado ao presente para ser extrapolada para o futuro.
Além disso, decisões cruciais poderão ser tomadas por governos, alterando o contexto de maneira irreversível. Falar em V, U, W ou WM, são respostas de economistas simplesmente porque foram perguntados, não por saberem a resposta…
Michal Kalecki argumenta a “disciplina nas fábricas” e a “estabilidade política” serem mais apreciadas em comparação aos lucros pelos líderes empresariais. Seu instinto de classe lhes diz um pleno emprego duradouro ser inaceitável por ameaçar seus lucros.
A aversão à política de gastos do governo, componente fundamental da ideologia neoliberal, é superada sob o neofascismo. Nesse caso, a máquina do Estado passa a estar sob o controle direto de uma aliança com as grandes corporações. É removida a necessidade do mito das “finanças públicas saudáveis”, antes capaz de impedir o governo de ocasião, inclusive sob hegemonia trabalhista, de causar uma crise de confiança quanto à solvabilidade governamental, devido aos gastos públicos.
“Em uma democracia, não se sabe como será o próximo governo. Sob o fascismo não há próximo governo”, disse Kalecki. O sistema neofascista começa com aceitação popular por causa da assistência social. Desenvolve-se em uma economia armamentista, levando até à escassez de mão-de-obra. Submetida à lógica da casta dos militares, termina, inevitavelmente, em guerra, seja externa, seja interna, e em um tremendo fracasso histórico, depois de imensa mortandade.
Publicado originalmente em:
Golpe Econômico: Locaute ou Nocaute da Economia Brasileira publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário