Joseph Schumpeter, em seu livro “Teoria do Desenvolvimento Econômico” (original publicado em 1911), não nega o juro ser um elemento normal na economia moderna — caso contrário, de fato, seria absurdo — mas, pelo contrário, tenta explicá-lo.
O juro é um prêmio ao poder de compra presente por conta do poder de compra futuro. Esse prêmio tem várias causas. Muitas delas não constituem nenhum problema. Um desses casos é o juro sobre empréstimos ao consumo. Todas as categorias de crédito governamental se enquadram aqui.
Sempre houve tais casos de juros e obviamente eles também poderiam existir no fluxo circular onde não há nenhum desenvolvimento. Mas não constituem o grande fenômeno social necessário de explicação. Este consiste no juro sobre empréstimos produtivos. Pode ser encontrado em toda parte no sistema capitalista e não apenas onde se origina, ou seja, nos empreendimentos novos.
Apenas Schumpeter deseja mostrar o lucro produtivo ter a sua fonte nos lucros. Ele por natureza é uma ramificação deste último. Aquilo chamado de “aspecto juro” dos rendimentos se espalha por todo o sistema econômico a partir dos lucros inerentes à realização bem-sucedida de novas combinações e até força a sua passagem para a esfera dos negócios antigos, em cuja vida não seria um elemento necessário se não houvesse nenhum desenvolvimento.
Isso é tudo o que Schumpeter quer dizer com a afirmação: “a economia ‘estática’ não conhece o juro produtivo”. Certamente, esse raciocínio é fundamental em sua abordagem da estrutura e funcionamento do capitalismo. E não é isso quase evidente por si mesmo, a partir da sua análise?
Assim como a situação dos negócios decide o movimento da taxa de juros — e situação dos negócios significa normalmente, quer dizer, desprezando-se os efeitos das forças não-econômicas, simplesmente o ritmo existente de desenvolvimento —, assim também o dinheiro necessário para inovações constitui o fator principal da demanda industrial no mercado monetário.
Haveria uma distância tão grande dessa afirmação para o reconhecimento de o principal fator real ser também o fator teórico fundamental, apenas pelo qual a outra fonte da demanda desempenha um papel, enquanto a última, ou seja, a demanda dos velhos negócios na rotina continuamente testada e repetida, normalmente não precisaria procurar o mercado monetário, uma vez que os velhos negócios estão adequadamente financiados pelo rendimento corrente da produção? Disso procede o resto, especialmente o teorema de o juro se vincular ao dinheiro – e não aos bens.
O juro sobre o capital, assim nos ensina a experiência, é um rendimento líquido permanente, fluindo para uma categoria determinada de indivíduos. De onde e por quê?
Primeiramente, há a questão da fonte dessa corrente de bens: para poder fluir, antes de tudo deve existir um valor, do qual possa provir.
Em segundo lugar, há a questão da razão pela qual esse valor se torna presa desses indivíduos particulares: a questão da causa dessa corrente no mundo dos bens.
Finalmente há a questão, sem dúvida a mais difícil, descrita como o problema central do juro sobre o capital: como essa corrente de bens pode fluir permanentemente, e como o juro pode ser um rendimento líquido possível de alguém consumir sem prejudicar a sua posição econômica?
Os serviços do trabalho e da terra são as únicas fontes de renda cujo rendimento líquido não é reduzido a zero por esses fatos. Em face desse dilema podemos proceder de duas maneiras diferentes.
Primeiro, ele pode ser aceito. Parece então o juro deve ser explicado como uma espécie de salário ou renda, e como esta não é factível, então como salário: como espoliação dos assalariados (a teoria da exploração), como salário do trabalho dos capitalistas (teoria do trabalho no sentido literal), ou como salário do trabalho incorporado aos instrumentos de produção e às matérias-primas. Todas as três tentativas de explicação foram feitas. Schumpeter só tem a acrescentar à crítica de Böhm-Bawerk a sua análise do empresário, especialmente quando o isolamos dos meios de produção, também mina uma parte da base das duas primeiras variantes.
Em segundo lugar, a conclusão teórica leva ao dilema a ser contestado. Aqui novamente podemos estender a lista dos custos, ou seja, afirmar com os salários e a renda ainda não foram pagos todos os meios de produção necessários, ou procurar no mecanismo da imputação e da concorrência um freio escondido capaz de impedir permanentemente os valores dos serviços do trabalho e da terra alcançarem o valor do produto, de modo restar um permanente excedente de valor.
Estender a lista dos custos nesse sentido não significa meramente afirmar o juro representar um gasto regular na contabilidade de um negócio. Isso seria evidente por si mesmo e não teria poder explicativo. Significa muito mais: conceber o juro como um elemento do custo. Isso é equivalente a constituir um terceiro fator produtivo original. Ele criaria o juro como o trabalho recebe salário.
A questão de como é possível um excedente permanente sobre o valor dos serviços do trabalho e da terra também pode ser respondida apontando-se para um freio a este. Se houvesse um tal freio, então estaria indubitavelmente provada a possibilidade de um excedente de valor permanente, e dever-se-ia atribuir à circunstância capaz de o provocar — ao menos do ponto de vista “privado” — produtividade de valor no sentido mais amplo.
Ela — ou a mercadoria em que estivesse incorporada — produziria um rendimento líquido. Um excedente de valor especial e independente ocorreria em todo processo econômico. O juro não seria então um elemento do custo, no sentido real. Deveria sua existência a uma discrepância entre os custos e o valor ou preço do produto. Seria um excedente real sobre os custos.
Schumpeter formula cinco proposições da sua teoria do juro. Elas se seguem automaticamente da primeira conclusão elementar de o juro ser o fenômeno do valor e um elemento do preço — tem isso em comum com todas as teorias científicas do juro — e terão de ser completadas mais tarde por uma sexta proposição.
Primeiro, o juro provém essencialmente dos valores excedentes. Não pode provir de nada mais, uma vez que não há nenhum outro excedente no curso normal da vida econômica. Evidentemente isso só é válido para o chamado de juro produtivo no sentido mais estrito. Não inclui o “juro consuntivo-produtivo”.
Em segundo lugar, os valores excedentes no desenvolvimento deságuam, como vimos, em dois grupos — o lucro empresarial e os valores representantes das “repercussões do desenvolvimento”. Evidentemente o juro não pode se prender a estas últimas. Isto porque o processo onde se cria essa espécie de excedente é bastante evidente, de modo podermos ver imediatamente o que cabe e o que não cabe nele. O desenvolvimento, pois — de algum modo — leva de roldão uma parte do lucro do capitalista. O juro funciona como um tributo sobre o lucro.
Em terceiro lugar, contudo, é óbvio nem o lucro todo nem mesmo uma parte dele poderem ser direta e imediatamente juro, porque é apenas temporário. Analogamente, vemos de imediato o juro não se prender a nenhuma classe de bens concretos. Todos os valores excedentes presos a bens concretos devem ser por natureza temporários, e mesmo tais excedentes surgindo constantemente em um sistema econômico em pleno desenvolvimento — reconhecendo-se a efemeridade de qualquer um deles — no entanto não podem formar imediatamente uma renda permanente.
Uma vez que o juro é permanente, não pode ser entendido simplesmente como um valor excedente proveniente de bens concretos. Embora ele provenha de uma classe definida de valores excedentes, nenhum valor excedente per se é juro.
Essas três proposições, de o juro, enquanto um grande fenômeno social, ser um produto do desenvolvimento, provindo do lucro, e não preso a bens concretos, são a base da Teoria do Juro elaborada por Schumpeter. A sua aceitação põe um fim a todas as tentativas continuamente repetidas de encontrar um elemento do valor dos bens concretos correspondente ao juro e com isso concentra em um campo bem pequeno o trabalho relativo ao problema do juro.
A questão principal, cuja solução é decididamente o ponto mais importante do problema do juro, segue agora: como, a partir dos lucros transitórios, sempre mudando, se extrai essa corrente permanente de juros, fluindo sempre para o mesmo capital?
Essa apresentação da questão incorpora as conclusões até aqui obtidas e é independente da direção a seguir. Se for respondida satisfatoriamente, o problema do juro estará então respondido de maneira satisfatória a todas as demandas da análise de Böhm-Bawerk provadas serem indispensáveis e — quaisquer que sejam os outros defeitos verificados — não está exposta a todas as objeções fatais às teorias anteriores.
O juro é, pois, de fato, uma categoria econômica — não criada diretamente por forças não-econômicas — mas só surge em uma economia de trocas. O juro não é, como o lucro, por exemplo, fruto direto do desenvolvimento, no sentido de ser um prêmio pelas suas realizações. Ao contrário, é antes um freio — um freio necessário em uma economia de trocas — ao desenvolvimento, uma espécie de “imposto sobre o lucro empresarial”. O juro é apenas consequência de um método especial de se realizar novas combinações e esse método pode ser mudado com muito mais facilidade em relação às outras instituições fundamentais do sistema concorrencial.
Juro Sobre o Capital publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário