domingo, 29 de dezembro de 2019

Causa do Boom e daí do Crash ou Crise Econômica

Joseph Schumpeter, no último capítulo de seu livro “Teoria do Desenvolvimento Econômico” (original publicado em 1911), diz o aparecimento de empresários em grupos é a única causa do boom. Ele tem sobre o sistema econômico um efeito qualitativamente diferente do de um aparecimento contínuo, distribuído uniformemente no tempo. Não significa, como esse último aparecimento, uma perturbação contínua, e mesmo imperceptível, da posição de equilíbrio, mas uma perturbação espasmódica, uma perturbação de uma ordem de grandeza diferente.

Enquanto as perturbações causadas por um aparecimento contínuo de empresários poderiam ser absorvidas continuamente, o aparecimento em grupo necessita de um processo de absorção especial e distinto, de incorporação de coisas novas e de adaptação a elas do sistema econômico, de um processo de liquidação, ou, como Schumpeter costumava dizer, antes da elaboração de sua teoria dinâmica do ciclo, de aproximação a um novo estado estático.

Esse processo é a essência das depressões periódicas. Portanto, podem ser definidas, do ponto de vista schumpeteriano, como o combate do sistema econômico no sentido de uma nova posição de equilíbrio, sua adaptação aos dados alterados pela perturbação trazida pelo boom.

Essa Teoria da Evolução possibilita a metáfora da criação de anticorpo sistêmico, isto é, um tipo de proteína encontrada no soro sanguíneo, produzida em resposta ao aparecimento no organismo de uma substância estranha. Anticorpos são proteínas atuantes no sistema imunológico como defensoras do organismo vivo contra bactérias, vírus e outros corpos estranhos… tais como empreendedores inovadores!

Por que os empreendedores aparecem, não de modo contínuo, ou seja, individualmente, a cada intervalo escolhido apropriadamente, mas aos magotes? Exclusivamente porque o aparecimento de um ou de poucos empresários inovadores facilita o aparecimento de outro, e estes provocam o aparecimento de mais outros, em número sempre crescente movido pela onda tecnológica.

Isso significa, primeiro, pelas razões explicadas na Teoria do Desenvolvimento Econômico, a realização de combinações novas é difícil e acessível apenas a pessoas com certas qualidades, como se vê melhor por um exemplo dos tempos antigos ou por uma situação econômica no estágio quando mais se parece a uma economia sem desenvolvimento, a saber, o estágio de grande estagnação. Apenas poucas pessoas têm essas qualidades de liderança e só algumas podem ter sucesso nesse sentido em tal situação, ou seja, em uma situação onde em si ainda não é um boom.

Contudo, se um ou alguns tiverem avançado com êxito, muitas dificuldades desaparecem. Outros podem então seguir esses pioneiros, como o farão certamente, sob o estímulo do sucesso agora atingível. O seu sucesso torna ainda mais fácil para mais pessoas seguirem o exemplo, mediante remoção cada vez mais completa dos obstáculos surgidos no processo de desenvolvimento, até finalmente a inovação se tornar habitual e sua aceitação uma questão de livre escolha.

Em segundo lugar, se a qualificação empresarial é algo distribuído em um grupo etnicamente homogêneo, segundo a Lei do Erro, como muitas outras qualidades, aumenta continuamente o número de indivíduos capazes de satisfazerem padrões em diminuição progressiva nesse aspecto. Assim, desprezando casos excepcionais com a progressiva simplificação da tarefa, cada vez mais pessoas poderão tornar-se empreendedores e o farão, razão pela qual o aparecimento bem-sucedido de um empresário é seguido pelo aparecimento não simplesmente de alguns outros, mas de um número cada vez maior deles, embora progressivamente menos qualificados. Assim se dá na prática, cujo testemunho ocular é meramente interpretado por Schumpeter.

Em indústrias nas quais ainda há concorrência e grande número de pessoas independentes, vemos antes de tudo o aparecimento singular de uma inovação — em grande parte dos casos em firmas criadas ad hoc — e depois vemos como as firmas existentes a agarram com rapidez e perfeição variáveis, primeiro algumas firmas depois muitas outras. Já nos deparamos com esse fenômeno, em conexão com o processo de eliminação do lucro empresarial.

Aqui isso entra novamente em consideração, embora de outro ponto de vista. A eliminação do lucro empresarial — prevista em sua maior parte — não é “a” causa em sua Teoria das Crises.

Em terceiro lugar, isso explica os empresários aparecerem em grupos, na verdade, a ponto de eliminar o lucro empresarial, antes de tudo no ramo da indústria onde aparecem os pioneiros. A realidade também revela todo boom, normalmente, começar em um ou em poucos ramos da indústria (construção de ferrovias, indústrias químicas e elétricas, etc.). Percebe-se o seu caráter das inovações na indústria onde se inicia.

Mas os pioneiros removem os obstáculos para os outros, não apenas no ramo da produção onde primeiro aparecem, mas também ipso facto em outros ramos, devido à natureza desses obstáculos.

Muitas coisas podem ser copiadas por esses outros. O modelo enquanto tal também age sobre eles. Muitos empreendimentos também servem diretamente a outros ramos, como por exemplo a abertura de um mercado estrangeiro, deixando-se inteiramente à parte as circunstâncias de importância secundária quando logo aparecem — preços crescentes, etc.

Assim, os primeiros líderes são eficientes além da sua esfera imediata de ação. Desse modo, o grupo de empresários cresce ainda mais e o sistema econômico é impulsionado mais rápida e completamente caso o fosse por qualquer outro meio para o processo de reorganização tecnológica e comercial constituinte do significado dos períodos de boom.

Em quarto lugar, quanto mais o processo de desenvolvimento se torna comum e é visto como um simples problema de cálculo para todos os interessados, e quanto mais fracos se tornam os obstáculos, no correr do tempo, menor a “liderança” necessária para suscitar inovações. Assim se tornará menos pronunciado o aparecimento conjunto dos empresários e mais suave o movimento cíclico. De modo evidente, essa consequência da interpretação schumpeteriana também é notavelmente confirmada pela realidade.

A trustificação progressiva da vida econômica atua no mesmo sentido, mesmo quando hoje em dia um grande conglomerado, com suas vendas e exigências financeiras, ainda seja tão dependente da situação de mercado. Esta é determinada em medida considerável pela concorrência, de tal modo ser só possível esporadicamente o adiamento totalmente vantajoso de suas inovações, especialmente da construção, para os períodos de depressão — como é exemplificado pela política das ferrovias norte-americanas. Mas, na medida em que opera, esse elemento também confirma a interpretação schumpeteriana.

Em quinto lugar, o aparecimento de novas combinações em conjunto explica fácil e necessariamente os traços fundamentais dos períodos de boom. Explica por que o aumento do investimento de capital é o primeiro sintoma do boom quando chega, porque as indústrias produtoras de meios de produção são as primeiras a apresentar estimulação acima do normal, e, acima de tudo, por que aumenta o consumo de ferro/aço.

Explica o aparecimento em grande volume de novo poder de compra, com isso o aumento característico dos preços durante os booms, o que obviamente nenhuma referência a aumento das necessidades ou a aumento dos custos pode sozinha explicar. Além disso, explica:

  • o declínio do desemprego e a elevação dos salários,
  • a renda da terra também subiria, em princípio, mas onde a terra for alugada por longo prazo, essa renda não pode subir e, adicionalmente, muitas circunstâncias evitam a rápida elevação desse ramo da receita,
  • a elevação da taxa de juros,
  • o aumento dos fretes,
  • a crescente pressão sobre os saldos e as reservas bancárias etc., e,
  • a produção de ondas secundáriasa difusão da prosperidade por todo o sistema econômico.

Por fim, a Teoria do Ciclo Econômico, elaborada por Schumpeter, não está entre as que procuram a causa do ciclo no dinheiro e no sistema de crédito, por mais importante que seja em sua interpretação o elemento da criação de poder de compra. Não obstante, não nega os movimentos cíclicos poderiam ser influenciados e mesmo evitados pela política creditícia — com eles, na verdade, também esse tipo de desenvolvimento econômico em geral.

Causa do Boom e daí do Crash ou Crise Econômica publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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