segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Política Externa Brasileira contraria Interesses Comerciais Nacionais

A atual política externa brasileira se submeteu, voluntária e ideologicamente, aos EUA. Compra uma “guerra comercial”, contrariando os próprios interesses nacionais, contra o maior parceiro comercial brasileiro: a China!

Arícia Martins (Valor, 27/07/2020) informa: contrariando expectativas de que a pandemia causaria estrago maior no comércio do Brasil com o exterior, a demanda firme da China, aliada a um câmbio mais depreciado, evitou retração mais forte das exportações brasileiras. De janeiro a junho, os embarques para o gigante asiático subiram 14,6% ante o mesmo período do ano passado, para US$ 34,35 bilhões, ao mesmo tempo em que as vendas para o resto do mundo caíram 15,2%.

Os cálculos são do Barclays, com base em dados do Ministério da Economia. No total, as exportações encolheram 7,1% no acumulado do ano. Ainda que em terreno negativo, o número foi uma surpresa favorável para economistas, que esperavam redução mais significativa diante da recessão mundial.

Como resultado da maior demanda da China, a participação do país na pauta de exportações nacional cresceu ainda mais, de 27% no primeiro semestre de 2019 para 34% no mesmo intervalo de 2020 – maior percentual desde 2000, primeiro ano da série elaborada pelo banco. Do superávit de US$ 22,3 bilhões da balança comercial brasileira no acumulado deste ano, a China responde por US$ 17,7 bilhões, ou quase 80% do total.

Embora boa parte do saldo positivo entre exportações e importações seja explicado pela crise econômica e o real desvalorizado, aumentando os preços em reais das importações e derrubando as compras do exterior, economistas afirmam: o “efeito China” também ajudou a sustentar o superávit. Para eles, essa tendência deve continuar ao longo do ano e coloca viés de alta nas estimativas para o saldo da balança em 2020, ainda que os possíveis desdobramentos da guerra comercial entre o país asiático e os EUA adicionem incertezas no cenário.

A queda de 13% do superávit comercial brasileiro entre o primeiro semestre do ano passado e igual intervalo deste ano teria sido consideravelmente maior sem a contribuição positiva do gigante asiático, destaca Roberto Secemski, economista- chefe para Brasil do Barclays. “As exportações brasileiras continuaram relativamente resilientes, graças à demanda da China”, diz Secemski, que se surpreendeu com recuo menos acentuado que o previsto das vendas externas.

A retomada mais rápida da economia chinesa e, possivelmente, a escalada das animosidades na relação entre o país e os EUA podem explicar por que as exportações brasileiras à China tiveram bom desempenho, sobretudo nos itens básicos, avalia o economista. De janeiro a junho, os embarques de soja e minério de ferro ao país asiático avançaram 31% e 27%, respectivamente.

Após cair 6,8% no primeiro trimestre sobre igual período de 2019, a economia chinesa cresceu 3,2% no segundo trimestre na mesma comparação, o que configura uma recuperação em “V”. A China deve sair do choque atual mais forte e será uma das poucas nações a crescer este ano, afirma Livio Ribeiro, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). No Boletim Macro de julho, Ribeiro estima que o PIB chinês terá alta de 1,2% em 2020 e, no quarto trimestre, já estará rodando perto de sua tendência de longo prazo, de 5,5% ao ano.

“Os resultados da balança comercial até junho mostram que, mesmo num cenário de crise, o desempenho das exportações brasileiras é positivo”, avaliou a pesquisadora Lia Valls, do Ibre/FGV, responsável pelo Indicador de Comércio Exterior (Icomex) da entidade. Ela destaca que, no sexto mês do ano, em valor, as exportações caíram 2,7% sobre igual período do ano anterior, mas, em volume, subiram 13,1%.

Além da reação chinesa, Secemski aponta a tensão comercial entre China e EUA como outra possível influência de alta nas exportações brasileiras. Até agora, expectativas de que a fase 1 do acordo comercial entre os dois países reduziria as compras chinesas de produtos brasileiros não se confirmaram, diz ele.

Nessa fase do acerto, a China se comprometeu a acelerar compras de bens agrícolas dos EUA. “Novos entendimentos entre os países poderiam mudar essa situação [de alta das exportações do Brasil para a China], mas conforme as eleições americanas se aproximam, a chance disso ocorrer parece diminuir”, afirma.

Para Paula Magalhães, economista-chefe da A.C. Pastore & Associados, possíveis surpresas em relação à guerra comercial adicionam incertezas nas estimativas para o saldo da balança comercial brasileira. “Na hipótese de um acordo entre os dois países, as exportações de commodities brasileiras poderão sofrer mais”, observa ela.

Paula espera aumento de cerca de US$ 20 bilhões no saldo da balança ante 2019, quando o superávit foi de US$ 48 bilhões. Em seu cenário, a melhora virá principalmente de forte retração das importações, mas o comportamento menos negativo das exportações até agora também é levado em conta.

Nos cálculos com ajuste sazonal da A.C. Pastore, a China elevou as compras do Brasil em 10% entre o primeiro e o segundo trimestres. Além da reação do nível de atividade no país, Paula aponta que a alta do dólar em relação ao real elevou a competitividade nas exportações à China. “A depreciação do real bem acima das moedas dos demais países emergentes levou a um câmbio real significativamente mais depreciado do que na média de 1994 a 2002”, ressalta a consultoria.

Sócio e economista da Tendências Consultoria, Silvio Campos Neto diz que a queda menor que o previsto das exportações, junto à intensa redução das importações, coloca viés de alta em sua projeção para a balança comercial no ano. “A pandemia mudou drasticamente a perspectiva de queda dos saldos comerciais em 2020. Temos expectativa de saldo de US$ 49 bilhões no ano, mas podemos rever esse número para US$ 55 bilhões”, diz. Segundo Campos Neto, a surpresa positiva com as vendas externas se concentrou no segundo trimestre.

O Barclays estima que o superávit comercial brasileiro vai crescer para US$ 53 bilhões em 2020. “Continuamos vendo risco de alta para o saldo comercial neste ano”, diz Secemski, para quem a tendência positiva das exportações à China tende a prosseguir.

Política Externa Brasileira contraria Interesses Comerciais Nacionais publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



Nenhum comentário:

Postar um comentário