sábado, 7 de novembro de 2020

Maioria contra Populismo de Direita, Racismo, Protecionismo e Isolacionismo

Biden e Trump representam um EUA totalmente diferente, segundo a pesquisa AP VoteCast, realizada entre 28 de outubro e o dia da eleição com mais de 110 mil eleitores em 50 Estados.

Nessa pesquisa, a maioria esmagadora dos eleitores de Trump era branca – cerca de 86% a nível nacional, em comparação com 62% dos eleitores de Biden. Apenas um quarto dos apoiadores de Biden vem de pequenas cidades ou áreas rurais. Quase metade dos eleitores de Trump vive nessas áreas. Os dois campos políticos também têm experiências muito diferentes com a pandemia de covid-19.

Os apoiadores de Biden tinham mais chances em vez dos eleitores de Trump de ter tido uma experiência pessoal de perda de emprego ou de renda por causa da pandemia, ou de ter um amigo próximo ou um membro da família morto pela covid-19, segundo a pesquisa realizada para a AP pelo instituto independente NORC da Universidade de Chicago.

Outro ponto que também ressoa entre seus apoiadores: o fato de Trump dar prioridade à economia em detrimento de medidas de saúde pública mais rígidas para controlar a disseminação do vírus.

No geral, 39% dos entrevistados disseram que o governo deveria dar prioridade a limitar os danos à economia, mesmo que isso eleve a disseminação do vírus. Desse grupo, Trump conquistou 85%.

Trump também avançou entre a maioria dos eleitores que disseram o contrário – conquistou 2 em cada 10, segundo a pesquisa -, o que mostra os limites da ênfase que a campanha de Biden deu ao vírus sobre outras questões.

Um pouco mais de 4 em cada 10 eleitores de Trump afirmaram que se opõem fortemente ou se opõem de alguma forma à exigência do uso de máscaras em áreas públicas, de 5% dos eleitores de Biden que disseram o mesmo. A pesquisa também indicou que a retórica de Biden sobre o racismo sistêmico na sociedade americana e especialmente no policiamento não teve muito impacto.

Os eleitores de Trump eram menos propensos do que os de Biden a dizer que o racismo era um problema sério na ação policial ou que o sistema de justiça criminal precisa de uma revisão ou de grandes mudanças. Quando indagados sobre a gravidade do problema do racismo na sociedade americana, 54% dos eleitores de Trump afirmaram que era muito ou algo sério, em comparação com 96% dos eleitores de Biden.

Ainda assim, 88% dos eleitores do presidente Trump citaram os protestos contra a violência policial como um fator em sua decisão sobre em quem votar.

Rana Foroohar é editora especial do Financial Times em Nova York. Publicou artigo (Valor, 20/10/2020) sobre qual deve ser a aparência de um gabinete de Joe Biden. Boa parte da conversa foi sobre diversidade de raça e de gênero. Mas os democratas deveriam dar igual atenção à diversidade econômica e política.

Isso porque o próximo presidente precisará de uma equipe altamente heterodoxa para enfrentar um problema muito complexo: como reduzir a distância histórica entre a sorte das companhias e a dos trabalhadores americanos.

Joe Biden está absolutamente certo em dizer que é preciso começar a recompensar “o trabalho, não a riqueza”. As mudanças necessárias para aprumar o barco não são pautadas pelo aperfeiçoamento gradual, e sim sistêmicas

Tornou-se quase um clichê discutir a cisão entre Wall Street, onde os preços dos ativos continuam próximos dos recordes de alta históricos, e a economia real dos EUA, onde a queda de 31% do PIB alcançou as dimensões da Crise de 1929 no segundo trimestre. Ao mesmo tempo, os números dolorosamente elevados do desemprego agregado mascaram níveis ainda mais dolorosos de desemprego que atingem determinados tipos de trabalhador.

Apesar de todos conseguirmos compreender os contornos básicos do problema, há dados novos e perturbadores que nos mostram o quanto os mercados financeiros se distanciaram do cidadão comum. Abordar esse afastamento exige repensar a política pública de quase todas as áreas de governo – desde o Tesouro e o Comércio até o Trabalho e a Educação.

Por exemplo, uma nova pesquisa, realizada por acadêmicos da Universidade Estadual de Ohio e da Universidade de Pittsburgh, mostra: as empresas com ações registradas em bolsa nos EUA estão, como grupo, contribuindo muito menos para os níveis de emprego ou para os níveis do PIB do que em qualquer outra época desde a década de 1970.

Há muitos motivos para isso. Mas um ponto fundamental é o de a sorte do país, de suas companhias e de seus trabalhadores estar muito mais interligada quando as maiores empresas com papéis negociados em bolsa operavam no setor industrial e de indústria de transformação do que em serviços, como operam atualmente.

Isso se tornou ainda mais verdadeiro com a mudança para uma economia de alta tecnologia. Apesar de a parcela das empresas de tecnologia, como percentual da capitalização de mercado, ser de 32,8% no fim de 2019, crescendo para mais de 40% no segundo trimestre de 2020, essas empresas representavam apenas 16,3% do total do emprego entre as companhias de capital aberto, e menos de 5% do nível de emprego privado não rural.

Nas palavras do coautor René M. Stultz, “altas avaliações podem surgir por muitos motivos diferentes, mas muitos deles nada têm a ver com a atual contribuição[das companhias] para a economia”.

Daí o hábito do presidente Donald Trump de equiparar os preços das ações ao bem-estar econômico, embora útil para contas de planos de previdência privada com contribuição do empregado e do empregador [conhecidos como 401k] é tão gritantemente enganoso (10% das famílias detêm 84% das ações).

Como sabem os investidores, a natureza invertida das bolsas de hoje permite concluir, nos últimos anos, as notícias “boas”, como o fortalecimento da economia, muitas vezes foram notícias “ruins” para os preços das ações. Eles tendem a cair quando há um indício de os dirigentes do BC vão pôr fim às baixas taxas de juros e à política monetária expansiva. Esse é o principal motivo da alta recorde alcançada pelos atuais preços dos ativos.

É por isso também que Biden está absolutamente certo em dizer ser preciso começar a recompensar “o trabalho, não a riqueza”. Mas slogans são uma coisa, e mudanças do paradigma da economia são outra totalmente diferente.

As mudanças necessárias para aprumar as sociedades de capitais abertos não são pautadas pelo aperfeiçoamento gradual, e sim sistêmicas. Após mais de quatro décadas, o crescimento financializado por meio da política monetária expansiva está esgotado. O que precisamos agora é de um grande estímulo fiscal para enfrentar os próximos meses e anos.

Há também, com muita razão, crescente preocupação com o endividamento. Embora a não aprovação de mais um plano de estímulo de curto prazo tenha mais a ver com a política pré-eleitoral do que com temores autênticos em torno da posição fiscal americana, também é verdade, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA se aproximarem de uma relação nacional dívida sobre PIB de quase 100%.

Tudo bem com isso se as taxas de juros permanecerem baixas e o dólar continuar sendo a moeda de reserva mundial. Mas o privilégio do dólar não durará para sempre, em parte devido à dissipação da boa vontade e da confiança internacionais causada pelo governo Trump. Além disso, elevou a dívida nacional de forma mais acelerada do que seu antecessor democrata.

Se o setor público assumir mais dívidas, elas terão de ser dívidas produtivas. Em termos ideais, um estímulo fiscal de modo a criar empregos no curto prazo e direcionar os investimentos de longo prazo para áreas estratégicas de alto crescimento, como a de tecnologia limpa.

O plano de estímulo fiscal de Biden, de vários trilhões de dólares, interligaria a mudança climática, a infraestrutura e o investimento em capital humano. Ele tem capacidade para cumprir ambas essas finalidades.

Se executado corretamente, ele também não será pautado pelo aperfeiçoamento gradual. Estamos falando de remodelar toda a economia americana, e isso exigirá não apenas uma equipe de tecnocratas dispostos e competentes, mas verdadeiros líderes, com capital político suficiente para impulsionar a mudança.

Isso significa alguém como a senadora de Massachusetts, Elizabeth Warren, no Tesouro. Ela tem a vontade e a capacidade de reancorar o setor financeiro à economia real, e talvez o ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, no Departamento de Comércio. Ele poderia orquestrar um plano nacional de competitividade para um mundo no qual precisaremos de uma colaboração mais estreita entre empregadores, educadores e trabalhadores.

Biden disse, se eleito, será um presidente de transição. Ele atuará como ponte para uma geração mais jovem de dirigentes. Se isso se confirmar, ele não terá nada a perder em se aferrar à sua visão econômica – e em escolher uma equipe verdadeiramente diversificada para executá-la. 

Maioria contra Populismo de Direita, Racismo, Protecionismo e Isolacionismo publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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