quarta-feira, 24 de junho de 2020

3) A Ciência, incluindo a Ciência Econômica, oferece uma base alternativa para conceituar uma melhor Teoria dos Mercados?

A resposta é sim. Uma crítica ao paradigma neoclássico tem sido desenvolvida, bem como tem evoluído o estudo de sistemas complexos, nos últimos vinte anos. Para isso, podem ser adicionadas outras ideias sobre como descrever mercados, superando as suposições neoclássicas. Estas inovações científicas podem ser combinadas para produzir um novo conhecimento científico.

A Ciência da Complexidade permite nova conceituação de sistemas econômicos. Ela precisa ser desenvolvida antes de produzir modelos detalhados precisos da economia com complexidade suficiente para serem confiáveis. Mas oferece um caminho muito promissor.

Os principais componentes dessa visão e as metodologias subjacentes a ela incluem o seguinte.

1) A economia é um sistema físico, envolvendo fluxos de bens, informação e energia, portanto, pode ser útil modelar uma economia como um sistema em física. No entanto, enquanto houver um conceito de equilíbrio, tal como na teoria econômica neoclássica, o conceito de equilíbrio em a Física não é aplicável às economias porque se aplica apenas a tipos específicos de sistemas chamados de sistemas fechados.

Estes são fechados em relação ao mundo exterior e fixam quantias imutáveis ​​dos bens componentes. Eles possuem quantidades fixas de energia, logo, não podem ser adicionadas ou subtraídas energia do lado de fora. Os mercados não são descritíveis como sistemas fechados, portanto, a noção de estar em equilíbrio físico não pode ser aplicado.

2) Os mercados são exemplos de sistemas chamados pelos físicos de sistemas abertos. Eles não têm quantidades fixas de mercadorias ou moedas. Eles estão situados dentro de sistemas abertos maiores, incluindo a biosfera, a energia e os materiais fluentes através deles a partir do sistema maior onde estão contidos.

3) Os fluxos de energia e bens através de um sistema aberto podem levar sua organização se tornar um estado metaestável. Esses estados não são como equilíbrio, pois as flutuações ao seu redor são nem pequenas, nem aleatórias, nem correlacionadas.

4) Em vez de estar em equilíbrio, os mercados podem ser entendidos criticamente como sistemas auto-organizados. Esse é um construto teórico. Pode ser aplicado de maneira útil a mercados reais. Isso leva a se esperar, nos estados estacionários, os mercados serem aproximadamente invariáveis ​​em escala. Implica uma previsão de como determinadas quantidades serão distribuídas em uma economia, o que inclui riqueza, renda, tamanho de firmas, populações de cidades e valores totais de moedas. A previsão é essas distribuições se adequarem às Leis de Potência e a previsão possibilitada ser observada na economia real.

5) Complexidade é importante. Na economia neoclássica, muitas conclusões são tiradas do estudo de situações com apenas dois comerciantes e dois bens ou simplificações semelhantes. Três já resultam em interações complexas. As conclusões de modelar esses (e outros) sistemas simples é aplicado às economias reais com milhões de participantes e milhares de mercadorias. O novo paradigma conclui as características qualitativas das economias reais não podem ser capturadas corretamente por esses modelos simples, porque os recursos básicos de como elas funcionam depende de seu tamanho e complexidade.

6) Heterogeneidade é importante. No mundo real, os participantes têm um conhecimento muito incompleto de mercados e players diferentes. Sabem coisas diferentes. Jogadores diferentes também têm diferentes estratégias a respeito de como evoluírem entre si. Eles mudam, persistentemente, conforme o mercado, parcialmente engendrado por essas estratégias de mudança, ela mesma muda. Isso transforma a avaliação de risco em instrumentos difíceis. Essa diversidade não pode ser modelada pela economia neoclássica, mas pode ser modelada por novas técnicas, como sistemas adaptativos complexos.

7) O crescimento econômico é impulsionado pelo desenvolvimento de ciclos de materiais, bens, energia e dinheiro. São análogos aos ciclos seguidos por sistemas ecológicos. Esses ciclos são entendidos como componentes básicos de sistemas auto-organizados. Eles estão longe de equilíbrio. A economia neoclássica estuda fluxos de caixa ou renda, os quais geralmente não se fecham em ciclos. Portanto, perdem as principais questões relacionadas à estabilidade e instabilidade de uma economia.

8) Há muita experiência em modelar sistemas ecológicos. Eles são semelhantes às economias, pois são sistemas abertos e com auto-organização, devido a fluxos de energia e material. Este pressuposto nos fornece uma base metodológica para teorizar uma economia de uma maneira onde o papel da energia é intrínseco. Questões como o que fazer com os inevitáveis ​​resíduos de processos industriais necessariamente surgem.

9) As escalas de tempo são importantes. Diferentes ciclos funcionais de caixa a receber para caixa a pagar têm tempos muito diferente de escalas. As instabilidades podem ser facilmente introduzidas por processos de acoplamento muito forte em diferentes prazos.

10) Sistemas complexos podem funcionar em diferentes fases, análogas às diferentes fases da matéria: sólido, líquido e gás. Alguns deles são mais hospitaleiros para nós em lugar de outros. As transições entre fases podem ser abruptas e perturbadoras. Reguladores de sistemas econômicos fariam bem em acompanhar indicadores da proximidade com transição de fase – e agir para evitá-la em caso de fase negativa.

11) Existe uma linguagem natural para descrever e quantificar as condições de equilíbrio, descritas pela teoria neoclássica. São importantes porque são condições nas quais se baseiam as suposições modeladoras do design de muitos complexos instrumentos financeiros como os derivativos. Senão, eles deixam de ser confiáveis. Essa Física, em sua generalidade, tem importância para a economia. Ela foi descoberta apenas recentemente por Pia Malaney e Eric Weinstein.

[3] Isso nos dá um conceito chamado curvatura: mede a distância do mercado em relação ao equilíbrio, quanto os mercados não conseguem “esclarecer” (equilibrarem-se através de variações de preços relativos), quão grandes são as oportunidades de arbitragem e efeitos da mudança de preferências.

12) Os mercados econômicos podem ser descritos como redes de traders e transações. Elas evoluem no tempo. Existe uma teoria bem desenvolvida dessas redes. Ela fornece uma útil metodologia e linguagem para modelagem econômica. Por exemplo, a noção de uma pequena rede mundial foi aplicada aos sistemas econômicos, bem como a outras redes de uso atual, como a Internet. Os cientistas da computação têm muita experiência no desenvolvimento e uso de modelos de sistemas complexos baseados nessas redes.

13) O número de bens e serviços distintos, os tipos de empresas e os números de maneiras de ganhar a vida cresceram, dramaticamente, ao longo do tempo. Esse crescimento é impulsionado por inovação e, por sua vez, esta é uma das principais causas de crescimento econômico real. Modelos como os da economia neoclássica trabalham com cestas fixas de bens e serviços e, assim, perdem a chave do crescimento.

14) Há um limite para a precisão de previsões futuras, porque as inovações capazes de impulsionarem a crescente diversidade da economia e o crescimento econômico, geralmente, não podem ser previstos de maneira confiável. Mas pode-se tornar uma economia mais ou menos hospitaleira para eles.

Essas críticas da economia neoclássica apontam para a possibilidade de um novo paradigma na teoria e modelagem econômicas. Como alguns desses pontos foram discutidos e estudado por décadas, por economistas e outros, é pertinente perguntar se eles levaram a modelos econômicos mais precisos na previsão do comportamento dos mercados reais.

Houve alguns sucessos, como um modelo do mercado de ações da NASDAQ. Ao mesmo tempo, não se pode dizer o ponto de vista da Ciência da Complexidade ter levado a um desenvolvimento de modo tal a outra teoria econômica atualmente se apresentar como uma alternativa completa ao paradigma neoclássico.

Por exemplo, não houve, a nosso conhecimento, um modelo econômico de larga escala construído com essas ideias atuais. Mas novos teóricos com formação heterodoxa estão à altura do desafio de modelar as complexidades atuais de mercados financeiros do mundo. No entanto, resta muito a ser feito para desenvolver e testar modelos com base nessas ideias complexas e ver como elas se aplicam à economia real.

Essas novas ideias também não invalidam necessariamente os sucessos da economia neoclássica. A conclusão tirada disso é muito mais trabalho precisar ser feito. A boa notícia é tanto os aspectos bem-sucedidos do paradigma neoclássico quanto as novas ideias, baseadas em estudos de sistemas complexos, oferecem muito espaço para o desenvolvimento da Economia como Ciência. O que é necessário é um desenvolvimento aberto da teoria econômica, como em qualquer área da ciência, no desenvolvimento de modelos detalhados, através dos quais a aplicabilidade de diferentes princípios e hipóteses podem ser comparados com dados do mundo real.

O verdadeiro sucesso da economia americana tem funcionado bem como uma incubadora para inovação em bens e serviços reais. Isso deu experiência e tecnologia e levou agora à invenção de instrumentos financeiros cujo uso, em uma teoria falha em análise de contexto, amplamente não regulamentado ou compreendido, ameaça desfazer todo o progresso econômico das últimas décadas.

A questão diante de nós é se o mesmo espírito de inovação pode ser aplicado aos princípios da teoria econômica orientadora dos mercados financeiros. Temos de basear concepção e regulamentação desses mercados com base em princípios e modelos corretos e verificáveis.

3) A Ciência, incluindo a Ciência Econômica, oferece uma base alternativa para conceituar uma melhor Teoria dos Mercados? publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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