terça-feira, 29 de outubro de 2019

ZIRP [Zero Interest Rate]: Taxa de Juro Zero

A Real-World Economics Review (A journal of the World Economics Association (WEA) – Issue no. 89, dedica um número especial à “Modern Monetary Theory and Its Critics”, publicado em 1 October 2019. Na coletânea de artigos de diversos autores pós-keynesianos notáveis, L. Randall Wray escreve o primeiro capítulo após a Introdução: Alternative paths to modern money theory. Concluo abaixo a tradução de seu último tópico. Versa sobre meu verdadeiro motivo de o consultar: queria saber o dito pela MMT sobre Juros Negativos. Encontrei só sobre Juro Zero… talvez por ser autor norte-americano.

Os procedimentos da relação Banco Central – Tesouro Nacional foram um pouco simplificados nos últimos anos com a alteração do pagamento de juros sobre reservas, para as reservas excedentes não resultarem em um “ZIRP” [Taxa de Juros Zero] indesejado, e com o Quantitative Easing, e colocando tantas reservas excedentes em risco. Por esse sistema, não há perigo de a venda de títulos causar reservas insuficientes.

Os críticos do MMT querem alegar isso provar impostos e empréstimos “financiarem” os gastos do Tesouro, portanto, ele está sujeito a uma restrição orçamentária do governo no ponto final. A MMT responde: as operações descritas seriam concluídas mesmo se o orçamento do governo estivesse equilibrado, excedente ou deficitário (conforme definido convencionalmente) ao longo do ano.

Isso ocorre porque, mesmo quando os gastos do governo sejam inferiores aos impostos pagos ao longo do ano, pode haver grandes diferenças entre os fluxos de gastos e impostos, diariamente, semanalmente e mensalmente. Como o Fed não deve permitir ficarem a “descobertos”, o Tesouro precisará vender títulos ao longo do ano, mesmo quando termine o ano com receita tributária total superior ao gasto.

Além disso, a venda de títulos exige os bancos terem reservas, o que só pode vir de gastos do Tesouro (realizados em seu nome pelo Fed), compras de ativos pelo Fed ou empréstimos do Fed. As reservas devem ser colocadas no sistema bancário antes delas poderem ser retiradas.

O mesmo se aplica aos pagamentos de impostos. Como o banco do contribuinte perde as reservas quando os impostos são pagos, primeiro as reservas devem ser colocadas no sistema por gastos do Tesouro, compras do Fed ou empréstimos do Fed.

Nem os impostos nem a venda de títulos podem ser uma fonte líquida de financiamento para o governo. Na realidade, os meios para pagar impostos ou comprar títulos (reservas no Fed) devem vir do governo (Tesouro e/ou Fed) antes de os impostos serem pagos ou os títulos serem comprados.

O argumento é análogo ao argumento de Keynes de a poupança [ex-post] não pode ser uma fonte líquida de financiamento para [decisões ex-ante de] investimentos. Paradoxalmente, o consumo é uma melhor fonte de financiamento.

Um crédito para uma conta bancária deve ocorrer antes de um poupador poder comprar um título corporativo. A renda de uma família pode ser acumulada na forma de depósitos bancários, alguns dos quais são usados ​​para consumo e outros usados ​​para economizar. Apenas uma parte da poupança será destinada à compra de títulos. Alguns permanecerão em uma forma mais líquida e, portanto, não estão disponíveis para financiar investimentos.

Por outro lado, toda a parte da renda consumida fluirá para os produtores. Portanto, estará potencialmente disponível para financiar os gastos dos negócios, exceto para compras de importações pelos consumidores. Estes estarão disponíveis para investimentos por produtores estrangeiros.

Os impostos, como a poupança, são um vazamento criado por injeções como investimentos e gastos do governo geradores de renda. Nem os impostos nem a poupança podem financiar os gastos no nível agregado. São vazamentos a serem criados por gastos financiados. Essa lógica é entendida por alguns economistas heterodoxos quando aplicada ao vazamento de poupança, mas eles ficam “atordoados e confusos” quando se trata de vazamento de impostos.

As preferências do portfólio podem afetar as taxas de juros e as taxas de câmbio. Como Keynes insistiu, isso ocorre no segundo passo da decisão de poupança – não no primeiro passo, como na Teoria dos Fundos para Empréstimos. Há um grande medo de os “vigilantes de títulos” [pressões dos investidores sobre a dívida pública de países sem disciplina fiscal] possam entrar em greve contra a dívida do governo, fazendo as taxas de juros subirem e as taxas de câmbio caírem.

Mas o Banco Central de qualquer nação emissora de moeda soberana pode fixar qualquer taxa de juros desejada, simplesmente anunciando uma meta. Nenhum “vigilante” tolo vai contra um Banco Central, cujas “bolsas” [poderes de emissão] são ilimitadas. Certamente, não, principalmente depois de virem os Bancos Centrais dispostos a gastar US $ 4 trilhões ou mais nas experiências tolas de Quantitative Easing.

Muitos MMTers seguem Keynes na defesa de uma política permanente de ZIRP – o que ele chamou de “eutanásia do rentista”. Ele eliminaria qualquer recompensa de juros sobre passivos sem risco, o que inclui dívida governamental soberana de curto prazo. Isso é feito definindo a taxa de apólice como zero (taxa de fundos overnight nos EUA) e depois limitando a emissão de passivos governamentais soberanos a Notas de curto prazo [NTNs brasileiras são em longo prazo], cuja taxa acompanha a taxa overnight.

O método mais simples é permitir o Fed fornecer saques a descoberto automáticos ao Tesouro, precedendo as vendas de notas. Quando o Tesouro gasta, O Banco Central simplesmente fornece um cheque especial à conta de depósito do Tesouro e credita simultaneamente as reservas de um banco privado.

Ao longo do ano, as reservas líquidas em circulação aumentarão se houver um excedente líquido de gastos (o que é chamado de déficit orçamentário) ou diminuirão se houver um déficit líquido de gastos (o que é chamado de superávit orçamentário). Isso eliminaria os pagamentos de juros do governo (“sacrifício do rentista com sua eutanásia”). Geralmente, é uma forma ineficiente de gasto, principalmente um vazamento acumulado como poupança doméstica e no exterior, aquilo capaz de aumentar a desigualdade.

Observe esta ser uma proposta de política monetária – não uma descrição. Essa mudança de política não é de todo necessária para alcançar as características distintivas da soberania cambial listadas acima:

  1. ausência de uma “restrição orçamentária”,
  2. impossibilidade de “ficar sem dinheiro”,
  3. capacidade de efetuar todos os pagamentos no vencimento e estabelecer taxas de juros.

Mesmo sob os acordos atuais, os emissores de moeda soberana operam livres de tais restrições financeiras. Mas a proposta de eliminar títulos (em especial, títulos do Tesouro) simplifica os procedimentos operacionais, elimina pagamentos desnecessários de juros pelo governo e torna as operações de gastos do governo muito mais transparentes.

Também elimina todo um setor da economia formado em torno do mercado de títulos do governo – para melhor ou talvez para pior. No entender de Randall Wray, é uma política interessante a considerar, embora não seja uma condição prévia necessária para a reforma da política fiscal e monetária.

ZIRP [Zero Interest Rate]: Taxa de Juro Zero publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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