sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Moeda com Poder Liberatório de Contratos e de Pagamentos de Impostos

No livro Modern Money Theory: A Primer On Macroeconomics For Sovereign Monetary (University of Missouri-Kansas City, US. – 2nd Edition; 2015), L. Randall Wray conta Hyman Minsky ter dito: “Qualquer um pode criar dinheiro”, mas “o problema reside em fazer com que seja aceito”. Você pode criar uma moeda denominada em dólar como “dinheiro”, escrevendo “10 IOU” em um pedaço de papel. Seu problema é conseguir alguém o aceitar. Governo soberano tem um modo fácil de encontrar aceitadores: em parte, porque dezenas de milhões de nós somos contribuintes devedores de pagamentos ao governo.

O Citibank tem facilidade em encontrar aceitadores porque milhões de nós devemos pagamentos ao Citibank, porque sabemos podermos trocar depósitos no banco por dinheiro, e porque sabemos o Fed estar por trás dele para garantir a compensação ao par. No entanto, umas poucas pessoas lhe devem e duvidam de sua capacidade de converter seu IOU em dólares para o IOU do tio Sam ao par. Elas estão embaixo nessa pirâmide de dinheiro.

Ainda assim, tanto o tio Sam quanto o Citibank estão limitados em sua criação de “dinheiro”. Tio Sam está sujeito à autorização orçamentária fornecida pelo Congresso e pelo Presidente. Ocasionalmente, ele também se depara com o louco (sim, louco!) “limite de dívida” imposto pelo Congresso. Congresso e o Presidente poderiam e deveriam remover esse limite de dívida, mas nós certamente queremos um processo orçamentário e queremos garantir o tio Sam ser limitado pelo orçamento aprovado.

No entanto, o tio Sam deveria gastar mais sempre quando temos desemprego.

O Citibank está sujeito a restrições e limites de capital nos tipos de empréstimos possíveis de conceder (e tipos de outros ativos possíveis de reter). Sim, nós libertamos os bancos da maioria dos regulamentos e supervisão nas últimas duas décadas – para nosso arrependimento. Aqueles com o “pote mágico de mingau” precisam ser constrangidos. Os bancos podem originar, e frequentemente fazem a geração de muitos empréstimos ruins capazes de explodir mercados e criar problemas de solvência para eles e até para seus clientes. O empréstimo prudente é uma virtude a ser exigida, ou pelo menos uma virtude para a qual os banqueiros deveriam se esforçar.

O problema não é a natureza “superficial” da criação de dinheiro por bancos e governo, mas sim as quantidades de dinheiro criadas e os propósitos para os quais foi criado. Gastos do governo para a finalidade pública é benéfica, pelo menos até o ponto de pleno emprego dos recursos da nação. Empréstimos bancários para fins públicos e privados, benéficos publicamente e em particular, também são geralmente desejáveis.

No entanto, os empréstimos trazem riscos e exigem boa subscrição, isto é, avaliação da credibilidade. Infelizmente nossos maiores bancos abandonaram em grande parte o processo de subscrição nos anos 90, com resultados desastrosos. Só podemos esperar os formuladores de políticas restaurarem as boas práticas bancárias desenvolvidas ao longo do último meio milênio, encerrando a vida de uma dúzia de bancos globais sem interesse em efetuar boa banca.

Alguns perderam a esperança em nosso sistema bancário. Sou solidário às suas visões pessimistas. Alguns querem voltar aos “dólares lastreados em ouro” da época do Presidente Lincoln ou aderem à proposta de “bancos restritos” do Plano de Chicago da década de 1930.

Alguns até querem eliminar a criação de dinheiro privado! Teria o governo de emitir “dinheiro livre de dívidas”! Sou solidário, mas não apoio a propostas mais extremas, mesmo se eu apoiar os objetivos. Tais propostas são imaginadas com base em um mal-entendido fundamental do nosso sistema monetário.

Nosso sistema é um sistema monetário estadual. Nossa moeda é passivo do governo, um IOU resgatável por obrigações fiscais e outros pagamentos ao Estado. A frase “dinheiro livre de dívidas” baseia-se em um não subsequente ou mal-entendido. Lembre-se: “qualquer um pode criar dinheiro, o problema é alguém aceitá-lo”.

São todos IOUs [assunções de dívida ou promessas de pagamento]. Eles são ou gastos ou emprestados a juros. Seus emissores devem aceitá-los em pagamento. Eles são aceitos por quem fará pagamentos, direta ou indiretamente, para os emissores.

Nas nações desenvolvidas, monetizamos completamente as economias. Grande parte (talvez a maioria) de nossa atividade econômica requer dinheiro, e precisamos de instituições especializadas capazes de emitir amplamente aceito ou IOUs monetários (tokens de dinheiro) para permitir essa atividade começar.

Embora nossos governos sejam grandes, eles não são grandes o suficiente para fornecer todas as IOUs monetárias necessária para mobilizar a escala da atividade econômica até atingir o nível desejado na geração de empregos e renda. E nós – pelo menos nós americanos – somos céticos em colocar toda a atividade econômica monetizada nas mãos de um governo muito maior.

Randall Wray não vê nenhuma possibilidade de se administrar um sistema capitalista moderno, monetizado e complexo como uma economia de mercado sem instituições financeiras privadas a criarem o valor monetário de IOUs necessárias para iniciar grande parte da atividade econômica preferida se deixar por conta da iniciativa privada. Certamente, há um papel a ser desempenhado pelo setor público no financiamento (incluindo bancos públicos, instituições nacionais, bancos de desenvolvimento e empréstimos diretos do governo para apoiar pequenas empresas, estudantes e proprietários), mas também há um papel a ser desempenhado por instituições financeiras nominalmente privadas.

A resposta para nossas atuais calamidades financeiras e econômicas não reside em vincular as mãos de nosso emissor de moeda soberana a limites de déficit ou dívida. Na verdade, os excessos das últimas décadas têm ocorrido principalmente no setor financeiro privado com fins lucrativos. Já tivemos demais “criação de dinheiro” privada, alimentando os mercados financeiros em fuga e muito pouca “criação de dinheiro” do governo para servir ao propósito público.

Precisamos de reformas fundamentais, incluindo a redução dos bancos gigantes, maior supervisão, mais transparência, processo judicial contra fraude financeira e colocar mais do “público” em parceria público-privado de instituições bancárias.

Também precisamos de uma discussão informada sobre o papel adequado a ser desempenhado por o governo soberano da economia. A discussão de políticas públicas precisa ser livre de todos os mitos sobre o que é “finanças sólidas” quando se trata orçamentos governamentais.

A política orçamentária mais “doentia” é a busca irracional de algo chamado de “orçamento equilibrado”, significando aquele quando “receitas” fiscais correspondem exatamente aos gastos do governo em um período determinado (geralmente um ano).

Se esse resultado for alcançado, significa todas as moedas fornecidas através de seus gastos terão sido “devolvidas” em pagamentos de impostos de modo o setor não-governamental não ter mais nenhum fundo para reservar para o proverbial “dia chuvoso” (ou de “vacas magras”). Como Randall Wray mostrará nos dois capítulos inicias, se o governo executar um “orçamento equilibrado”, não fará nenhuma contribuição líquida para a riqueza financeira da nação. Isto é difícil entender por parte de alguém defensor de um objetivo tão louco.

Como ensina a MMT, a dívida do governo (incluindo moeda, reservas bancárias e títulos do Tesouro Nacional) é a riqueza financeira do não-governo.

Os déficits do governo são iguais aos superávits de não-governo, gerando renda possível de ser economizada. E essa poupança está na forma mais segura – em reivindicações sobre um governo soberano impossibilitado de se tornar insolvente em sua moeda própria. Ela não pode ser forçada a perder nenhum pagamento quando vencer.

Imagine como o discurso político será alterado:

  1. quando nosso Presidente já não poder afirmar: “o tio Sam ficou sem dinheiro”;
  2. quando nosso governo não poder mais se recusar a criar empregos ou construir uma melhor infraestrutura, ou colocar astronautas em Marte por falta de fundos; ou
  3. quando especialistas [“economistas-chefe” de bancos] não serem mais autorizados a aumentar o espectro assustador de serem “vigilantes da solvabilidade de títulos de dívida pública” de modo seus bancos se recusarem a “emprestar” mais ao governo!

Pode haver razões pelas quais queremos deixar milhões de trabalhadores desempregados, ou a viver sob pontes, ou trafegar em rodovias inseguras, ou permanecer desocupados em zona rural, mas a falta de financiamento não pode ser um deles.

Esses são os tipos de problemas possíveis de você ver sob uma nova luz quando entender os conceitos básicos do MMT.

Moeda com Poder Liberatório de Contratos e de Pagamentos de Impostos publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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