quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Proposta Correta: Depósitos Voluntários dos Bancos no BCB e Mandato Dual para o Banco Central

Renan Truffi, Estevão Taiar e Vandson Lima (Valor, 08/09/2020) informam: o governo traçou uma estratégia para tentar aprovar, até novembro, o projeto de autonomia do Banco Central (BC), que está parado desde março no Senado. A ideia é atrelar a proposta a outro tema de modo a agradar a oposição e, principalmente, o PT. Trata-se de uma medida capaz de possibilitar ao BC substituir as operações compromissadas pelo depósito voluntário remunerado das instituições financeiras e pagar “juros negativos” como o custo de oportunidade para os bancos, caso eles empocem a liquidez e não emprestem dinheiro.

A proposta foi apresentada pelo líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), e levada ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, que apoiou o texto. O órgão já enxergava essa mudança com bons olhos há algum tempo. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e a liderança do governo também não se opuseram, o que deixou o caminho livre para negociação. A única barreira é o ministro da Economia, Paulo Guedes. Por conta disso, os líderes governistas devem promover uma reunião entre o senador petista e o chefe da equipe econômica, como forma de acertar os ponteiros.

O desejo de criar um novo mecanismo para gerenciar a liquidez da economia é antigo. No próprio governo do PT, o ex-presidente do BC Alexandre Tombini tentou discutir o restabelecimento da permissão para que a autoridade monetária coloque em mercado títulos de sua própria emissão. Essa faculdade foi eliminada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), com a justificativa de evitar o financiamento do Tesouro pelo BC. Diante das resistências à ideia, Tombini passou a defender a criação dos depósitos voluntários, agora retomada no Senado.

O principal argumento dos petistas é corrigir distorções na contabilidade da dívida bruta. “Os depósitos voluntários configurariam novo instrumento de gestão da liquidez, alternativo às operações compromissadas. Vale lembrar este instrumento já ser utilizado por diversos países, inclusive pelo banco central americano”, diz Rogério Carvalho, na justificativa da proposta.

“Tal inovação permitirá parcialmente a redução gradual do volume de títulos do Tesouro na carteira do BC. Com isso, haveria forte impacto potencial na redução da dívida bruta. No critério do BC, a dívida bruta poderia ser reduzida em até 18 pontos percentuais do PIB (considerando o atual volume de operações compromissadas). No conceito do FMI, a dívida poderia cair até 26,6 pontos do PIB (incluindo os títulos livres na carteira do BC)”, afirma.

O governo considera usar esse projeto para tentar “amaciar” os oposicionistas que ainda resistem à autonomia do BC, incluindo os próprios petistas. “A negociação está caminhando bem. Queremos manter o texto que foi aprovado na CAE. E aí surgiu uma sugestão boa do PT sobre operações compromissadas. Se a conversa entre o PT e o Guedes fluir bem, talvez interesse ao Rogério Carvalho negociarmos uma coisa [autonomia do BC] pela outra [operações compromissadas]. Vamos ver”, disse uma fonte do governo.

Ainda sobre a autonomia do BC, o governo também terá outro foco de negociação: a bancada do MDB. Isso porque o líder do partido no Senado, Eduardo Braga (MDB- AM), ainda insiste na retomada da tese de “duplo mandato”, para que a instituição tenha de zelar pela estabilidade dos preços, mas também pelo crescimento e emprego. Na avaliação dele, é necessário atrelar estabilidade a metas anuais de inflação e crescimento, por exemplo.

Apresentado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM), o texto do Senado é a reedição de um projeto de 2004 do atual prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), que na época era senador. A medida trata de mandatos de duração determinada para o presidente e os diretores da instituição. Atualmente, esses cargos são de livre indicação do presidente da República. No modelo proposto, os mandatos seriam de quatro anos, e a dispensa só seria possível em casos de condenação judicial ou desempenho insuficiente.

Em nota, o BC afirmou ao Valor que os depósitos são um “instrumento complementar de política monetária”, que representariam “importante avanço institucional, podendo vir a ser muito eficaz para administração da oferta de moeda na economia”. “Essa prerrogativa diversificaria os instrumentos à disposição do BC na administração da liquidez bancária, em linha com o ferramental disponível a bancos centrais de reconhecida reputação técnica, como, por exemplo, o Federal Reserve dos EUA, o Banco da Inglaterra e o Banco Central Europeu.”

Proposta Correta: Depósitos Voluntários dos Bancos no BCB e Mandato Dual para o Banco Central publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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