Roberta Costa (Valor, 28/08/2020) avalia: a mudança de estratégia do Federal Reserve (Fed) ao abandonar uma meta pontual em favor de uma meta de inflação média de 2% trará algum benefício tangível para a política monetária americana?
É difícil dizer, mas tudo leva a crer que se trata de uma discussão que terá mais abrigo nos meios acadêmicos do que de mercado e, menos ainda, no “mundo real”. O que se sabe é que a mudança era necessária para dar razoabilidade a uma forma de agir que já vinha ocorrendo na estratégia do BC americano, qual seja, não reagir de pronto a desvios de variações dos preços em relação ao alvo.
Também é uma forma de reforçar seu “forward guidance”. Ele, formalmente, deve ser mudado na reunião de setembro, junto com o programa de compra de ativos, desencadeando assim a leitura dos agentes de a postura acomodatícia da política do banco central ir ainda mais longe, podendo inclusive (em tese) haver espaço para um aumento adicional das compras de ativos, já que a adoção de uma taxa de juros negativa tem sido veemente descartada.
Mas com o juro na mínima histórica e com a inflação abaixo da meta em quase todos os anos desde a crise financeira de 2008, a despeito da economia ter atingido o pleno emprego, é improvável a mudança proporcionar qualquer impulso significativo para a economia real.
O Fed, que entre 2016 e 2019 tinha em sua mira a normalização da política (juro chegou a 2,25% no fim de 2018), teve de recuar diante da decepção com a atividade econômica, e isso antes do aparecimento do novo coronavírus. Com ele, os cortes de emergência voltaram e a taxa encostou em zero novamente.
Historicamente, a taxa de juros nominal de equilíbrio era vista próxima a 4%, mas caiu à metade desde a crise, segundo estudos variados. Como bem observou Jerome Powell, presidente do Fed, em seu discurso em Jackson Hole, essa mudança de regime “codifica” o que já estava sendo feito. Assim, o Fed, como dito no comunicado, reagirá aos déficits de emprego em relação ao seu nível máximo, em vez de “desvios” – linguagem usada até então. Isso quer dizer que o desemprego abaixo da “taxa natural” (ou pleno emprego) estimada não é por si só uma razão suficiente para apertar a política.
De outro lado, o Fed permitirá que a inflação “estoure” a meta por algum tempo “como uma forma flexível” de metas de inflação média. Mas todos sabemos que na realidade o BC não conseguiu por um período longo conduzi-la de forma sustentável à meta de 2%. Mas, com a mudança, espera-se que as expectativas fiquem mais controladas e os agentes passem a “descontar” os períodos de queda de preços daqueles de alta.
A mudança era amplamente esperada e é bem-vinda até porque marca uma nova abordagem que pode influenciar a política monetária global, que se vê sem muitos instrumentos adicionais. Contudo, em um cenário de pandemia, com quedas abissais do produto em todo o mundo desenvolvido, pensar em elevação do nível geral de preços soa no mínimo fora de hora.
Vamos ver se os economistas neocolonizados culturalmente lá na matriz se comportarão na filial como a chefia lá “manda ver”: o Federal Reserve (Fed) aprovou por unanimidade uma nova estratégia e ela efetivamente deixará de lado uma prática seguida há mais de três décadas: elevar preventivamente as taxas de juros para evitar o aumento da inflação. O BC americano definiu uma meta de inflação média de 2% ao longo do tempo. Isso significa que vai permitir a inflação superar “moderadamente” a meta por algum tempo, após períodos na qual tenha caído abaixo desse nível.
Meta de Inflação Média em vez de Pontual: Pragmatismo do Federal Reserve publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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