quarta-feira, 20 de maio de 2020

Zero Lower Bound and Twilight Zone: “Qui p**** é está?!”

Alex Ribeiro (Valor, 13/05/2020) informa: a última ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central discute um limite para a queda da meta da taxa Selic mesmo antes de os juros caírem a zero, o chamado “zero lower bound”. Como definir esse limite inferior azero?

Para um especialista em política monetária, o Banco Central vê o que ele chama de “twilight zone” [zona crepuscular] para a taxa de juros. Está em um patamar onde, caindo os juros abaixo dele, pode-se gerar instabilidade com repercussões imprevisíveis e perigosas sobre os preços dos ativos financeiros, atividade e inflação.

Seria algo bem diferente do “zero lower bound”, ou o limite que as economias geralmente desenvolvidas se defrontam quando os juros chegam na vizinhança de zero. Nessas circunstâncias, não há muito espaço adicional para cortar mais os juros para estimular a economia.

É possível levar os juros para o terreno negativo (alguns países fizeram isso), mas com moderação. Isso porque há um ativo, o dinheiro em espécie, que rende zero, algo que é melhor do que um ativo que promete devolver menos do que o valor investido.

O “zero lower bound” parece ser uma doença de países ricos, já que o Banco Central brasileiro se refere a um outro limite à queda de juros que se aplica antes a países emergentes, devido à existência de prêmios de risco. No Brasil, em especial, esse limite seria mais alto em decorrência da fragilidade fiscal e das incertezas sobre a continuidade do ajuste das contas públicas.

Mesmo dentro do Copom, porém, esse debate não parece pacificado. Há um membro solitário do colegiado que acredita que não existe essa “twilight zone”. Para ele, os juros podem seguir caindo, ainda que, quando chegar a patamares mais baixos, possa se intensificar o impacto nos preços dos ativos.

Ou seja, a resposta do dólar a quedas de juros se intensificaria à medida que a Selic testa patamares mais baixos, mas de uma maneira mais ou menos previsível. Assim, o Banco Central não se afundaria num pântano com consequências perigosas.

Do ponto de vista prático, o Banco Central está dizendo que não vai avançar para esse território assustador? Aparentemente, por enquanto não há um limite rígido. O que a ata do Copom destaca, apenas, é a “importância do gradualismo na condução da política monetária para a avaliação da resposta dos preços de ativos financeiros”.

Ou seja, parece haver a disposição de testar, com cuidado, o terreno para baixar a taxa de juros. Nesse processo, o Banco Central vai avaliar se o entendimento da maioria dos membros do Copom é a mais acertada ou se, ao contrário, a opinião solitária dentro do colegiado está com a razão.

Note que, nas duas visões, o espaço para baixa de juros é bem menor. Isso significa que as chances de a taxa básica cair abaixo de 2% são menores.

O especialista em política monetária ouvido diz que a “twilight zone”, se de fato existir, afasta o país da “zero lower bound”. A taxa de juros neutra, nesse ambiente do “twilight zone”, tende a ser mais alta, o que reduz a chance de a meta da taxa Selic ser baixada até a “zero lower bound”.

Embora essa “twilight zone” e o chamado “zero lower bound” sejam coisa diferentes, estamos discutindo limites para a política monetária convencional. Quando se avança nesse terreno, o tema que se coloca é se o Banco Central terá que lançar

mão de instrumentos não convencionais de estímulos, como a expansão quantitativa (QE, na sigla em inglês).

É bom lembrar que o BC ganhou poderes especiais do Congresso para esse tipo de operação. E o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem falado muito sobre imprimir dinheiro quando os juros chegarem a zero. Em tese, o BC poderia decidir lançar mão mais cedo de políticas não convencionais justamente para evitar se afundar no pântano da “twilight zone”.

Dois meses após a crise mais profunda em décadas, algumas das maiores economias da América Latina estão perto de perder sua principal ferramenta de combate à recessão: cortes das taxas de juros.

Peru e Chile já reduziram o juro para quase zero e são obrigados a considerar novas táticas para resgatar as economias em colapso. Brasil e Colômbia podem em breve estar no mesmo barco.

A chamada armadilha de liquidez, quando a política monetária perde força à medida que as taxas de juros se aproximam de zero, atormenta países ricos há anos. O economista e Prêmio Nobel Paul Krugman diz que o problema agora se espalhou para alguns mercados emergentes.

“Não há nada na lógica da armadilha de liquidez que diga que isso não pode acontecer em um país em desenvolvimento”, disse Krugman em entrevista por telefone. Na semana passada, o banco central do Peru disse que está pronto para usar diferentes tipos de estímulo monetário para sustentar a demanda durante a pandemia de coronavírus, enquanto no Chile a autoridade monetária começou a comprar títulos emitidos por bancos.

Porém, medidas desse tipo são uma forma muito menos eficaz de estímulo do que simplesmente reduzir a taxa básica, de acordo com Krugman.

Muitos países em desenvolvimento enfrentam a crise atual com inflação baixa e níveis modestos de dívida em dólar. Isso os torna menos vulneráveis a uma crise de mercado emergente tradicional, na qual uma onda vendedora na moeda desencadeia uma espiral inflacionária ou dificulta o serviço da dívida externa. Em vez disso, os emergentes enfrentam um novo conjunto de problemas.

“Se olhamos para a Turquia ou Argentina, estão passando por um tipo relativamente clássico de crise de mercado emergente com um corte nas entradas de capital”, disse Krugman. “Mas grande parte do mundo emergente avançou muito nessas questões, e o mais perverso é que, ao ganhar algum tipo de credibilidade no estilo do primeiro mundo, conseguiram se tornar vulneráveis aos tipos de problemas do primeiro mundo.”

Quando a crise financeira global atingiu a América Latina há 12 anos, bancos centrais no Brasil, Colômbia, Chile e Peru reduziram as taxas de juros em cinco pontos percentuais ou mais. Essa não é uma opção neste momento.

Quando a pandemia surgiu, os quatro países tinham a taxa básica abaixo de 5%. Agora, os juros variam de 0,25% no Peru a 3,25% na Colômbia. Algumas das menores economias da região, como Paraguai e Guatemala, agora também têm juros próximos a zero, assim como vários mercados emergentes na Ásia e no Leste Europeu.

O México, a única grande economia da América Latina que ainda possui taxas significativamente acima da inflação, também corta os juros rapidamente, com outra redução de meio ponto percentual prevista para esta semana.

Enquanto países como EUA, Reino Unido e Japão têm “uma enorme margem de manobra” para emprestar dinheiro destinado a programas de estímulo, devido ao longo histórico de devedores confiáveis, mercados emergentes são mais restritos na capacidade de usar estímulo fiscal, disse Krugman. O economista diz que se fosse ministro da Fazenda de um mercado emergente “ficaria nervoso” em adotar o tipo de estímulo na escala da Europa e EUA. O Chile, com níveis mais baixos de dívida e um histórico mais longo de solvência, tem “muito mais margem de manobra” do que o Brasil, segundo Krugman.

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