Daniel Yergin, no livro “A Busca: Energia, Segurança e a Reconstrução do Mundo Moderno” (Rio de Janeiro: Editora Intrínseca; original “The Quest: Energy, Security, and the Remaking of the Modern World” publicado em 2011), conta: passou a haver muito mais investidores no mercado de petróleo — a parte do mercado do barril de papel — investindo sem intenção nem necessidade alguma de receber os ativos físicos em si.
Havia fundos de pensão, fundos de hedge e fundos soberanos. Havia os fundos de índice de commodities, associados ao petróleo e com a negociação de derivativos associada. Havia também os Exchange Traded Funds (ETFs). A administração das grandes fortunas também especulava com ele. Enfim, todos os tipos de investidores e negociadores, alguns jogando no longo prazo, outros no curtíssimo.
O petróleo deixou de ser apenas mais uma commodity física usada como combustível para carros e aviões. Tornara-se algo novo — e muito mais abstrato. Agora esses barris de papel eram também, na forma de futuros e derivativos, uma forma de manutenção de riqueza financeira, um ativo financeiro. Como tal, os investidores prudentes podiam diversificar seus investimentos além de ações, títulos e imóveis, aplicando seu dinheiro nesse novo tipo de ativo.
O crescimento econômico e a financeirização logo se associaram para elevar o preço do petróleo. Esse aumento trouxe também maior volatilidade, mais flutuações no preço, o que atraía os negociantes.
Os negociadores eram jogadores ágeis. Com um timing perfeito, atiravam de um lado para o outro para a arbitragem: aproveitar as menores anomalias e avaliações erradas de preços dentro desses mercados.
Essa financeirização foi reforçada por um avanço tecnológico. Tradicionalmente, o petróleo era negociado no pit no Nymex por operadores de pregão, com suas jaquetas coloridas, gritando até ficarem roucos, balançando os braços, agitados, e fazendo gestos estranhos com as mãos, visando registrar suas compras e vendas. Esse sistema era chamado de “ordem de viva voz” (open outcry) e era muito barulhento.
Mas, por volta de 2005, a importância dos operadores de pregão começou a declinar com a introdução das plataformas eletrônicas de negociação. Elas conectavam diretamente compradores e vendedores por meio de seus computadores.
Agora, bastava apenas apertar um botão e a negociação era feita na hora. Até o “botão” era uma metáfora, pois muitas vezes a negociação era executada por uma caixa preta algorítmica de um fundo de commodity, operando em microssegundos, sem nunca precisar dormir, tampouco de qualquer intervenção humana depois de programado. O barril de papel se tornara o barril eletrônico.
Os contratos de futuros nas bolsas de commodities eram apenas uma parte do novo mundo das negociações. Havia também os mercados de balcão. Estes não tinham as exigências regulatórias e de divulgação do mercado de futuros.
Seus críticos o chamavam de “mercados obscuros”, devido a essa ausência de supervisão regulatória e transparência, e por desconfiarem do modo de operação e impacto. Afinal, eram uma forma de derivativo financeiro — um ativo financeiro cujo preço é derivado de um ou mais ativos subjacentes.
Devido a sua alavancagem, complexidade e falta de transparência, o risco acumulado e o impacto sistêmico desses derivativos poderiam ser muito altos.
Os mercados de balcão eram o lugar certo para transações trabalhadas, ajustadas, nas quais os participantes podiam comprar derivados de petróleo de um tipo ou outro, destinados especificamente a atender um mercado ou uma estratégia de investimento em especial.
Os bancos tornaram-se os swap dealers [negociadores de swap], facilitando o swap (troca) de um título, moeda ou tipo de taxa de juros para outro entre investidores. Eles então protegeriam seus riscos em operações de swap nos mercados de futuros.
Os mercados de balcão começaram a crescer rápido por volta de 2003 e 2004. Eles tinham várias características atraentes. Era mais barato para os hedgers optar pelo mercado de balcão, pois os custos podiam ser menores e mais previsíveis. Eles podiam fazer negócios adequados às suas necessidades especiais, especificações e momentos oportunos.
Por exemplo, um investidor poderia querer fazer hedge com o combustível para avião no porto de Nova York, e o WTI de Cushing não era uma aproximação clara o bastante em seu preço. Também era possível realizar negócios muito maiores sem chamar atenção para si e, em consequência, forçar prematuramente o preço para cima ou para baixo, dependendo da natureza do hedge.
De modo geral, um volume cada vez maior de dinheiro fluía para o mercado do petróleo, por meio dos mais variados tipos de fundos e instrumentos financeiros. Tudo isso aumentou a atividade e também a “animação do investidor”.
Esta foi uma expressão usada pelo economista comportamental Robert Shiller, ganhador de Prêmio Nobel de Economia. Ele estudava as bolhas financeiras. Explicou o termo “exuberância irracional”.
Petróleo: Forma de Manutenção de Riqueza Financeira publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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