sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

Bolha de Otimismo com “Pitadas de Heterodoxia”

Pedro Cafardo é editor-executivo do ‘Valor’. Ele tem independência para escrever um artigo (Valor, 08/01/20) fora da ladainha neoliberal contumaz na imprensa brasileira. Ele reconhece: “pitadas de heterodoxia” estimularam consumo e melhoraram um pouco o ambiente econômico. E critica os erros das diretorias do Banco Central do Brasil em retardar excessivamente a queda da taxa de juros básica. Confira abaixo.

“Há uma bolha de otimismo nesta passagem de ano. A inflação (IPCA-15) deu um pequeno salto em dezembro, mas todos acham que seja um ponto fora da curva, por conta das altas da carne e de combustíveis. O IPCA deve ter terminado o ano em 4%, abaixo da meta de 4,5%. Ninguém teme mais o famoso dragão da inflação, protagonista nas charges dos jornais nos anos 1980 e 1990.

O otimismo se espalhou também para o comércio, a construção de imóveis e para outros setores. O emprego ainda patina. Embora tenham sido criadas cerca de 900 mil vagas com carteira assinada durante o ano, houve precarização do trabalho, com as contratações temporárias e informais.

Além disso, diminuiu pouco o número de desempregados, para cerca de 12 milhões. Muita gente que estava no desalento voltou a procurar colocação e, com isso, voltou também às estatísticas como desempregada.

Apesar das ameaças de guerras comerciais e militares, é inegável que o ano começa com um certo otimismo na economia. É boa hora, portanto, para refletir sobre as causas da ligeira reativação da atividade.

Segundo o discurso de início de governo, toda força seria dedicada à reforma da Previdência e à contenção de gastos, manobras que fariam o “milagre” de ressuscitar a economia. Elas reduziriam a incerteza sobre as contas públicas e isso criaria um clima de confiança que estimularia os investimentos e reativaria a economia.

Não foram os investimentos, porém, que provocaram essa ainda tênue reativação. Eles ainda não vieram, nem públicos nem privados. Foi o consumo das famílias. E por que aumentou o consumo das famílias?

Depois de uns sete meses de governo, a equipe econômica rendeu-se às evidências de que seria preciso colocar um pouco de heterodoxia em sua receita para que a retomada da economia se iniciasse. Numa batelada, liberou recursos do FGTS e do PIS/Pasep e começou a injetar R$ 42 bilhões na economia. Grande parte desse dinheiro foi para compras.

O Banco Central também atenuou a ortodoxia monetária. A partir de setembro, passou a reduzir a taxa de juro, depois de mantê-la teimosamente em 6,5% ao ano durante 16 meses. Nesse período, ignorou a inflação baixa e a estagnação econômica, que explicitamente recomendavam a redução da taxa.

Observa-se no gráfico acima o vacilo do BC na linha reta. Ela começa em março de 2018. Com a inflação controlada, a taxa Selic permaneceu inalterada até setembro de 2019. Já em janeiro de 2019, mostra o gráfico, havia espaço para uma redução.

Quando o BC começou a baixar a taxa, os bancos permaneceram impassíveis. Praticamente mantiveram sua taxas de juros no crédito, como se nada tivesse acontecido. Aí entrou em ação a Caixa, cortando agressivamente suas taxas no cheque especial, no cartão e no crédito imobiliário. E os juros caíram, mas ainda estão em níveis estratosféricos, o que levou o BC a tabelar, por exemplo, os juros do cheque especial em 8% ao mês, medida que entrou em vigor ontem. Outro soluço heterodoxo.”

Bolha de Otimismo com “Pitadas de Heterodoxia” publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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