sábado, 16 de maio de 2020

Efeitos da Queda da População

Robin Harding (FT, 15/01/2020) recorda o Efeito Demográfico sobre o crescimento econômico, apontado originalmente por Keynes. Em um mundo de população declinante os padrões de vida entrariam em estagnação.

“Em 1937, John Maynard Keynes deu uma aula sobre “Some Economic Consequences of a Declining Population” (“Algumas Consequências Econômicas da queda da População”) na universidade. Muitos na época sentiam que o mundo estava superpopuloso e que um contingente menor de pessoas podia apenas fazer bem, uma opinião compartilhada pelo próprio Keynes.

Mas o objetivo de sua aula era fazer uma advertência: quedas da população vêm acompanhadas de efeitos colaterais econômicos ruins. Ao que se revelou, a preocupação de Keynes despontou com algumas gerações de antecedência. O número de nascimentos deu um salto no chamado “baby boom” do pós-guerra. Atualmente, no entanto, sua advertência parece uma profecia.

A população já está em queda em países como Japão e um declínio mundial futuro é muito plausível. Como ocorreu na década de 1930, muitas pessoas veem com bons olhos essa perspectiva, em grande medida por motivos ambientais, mas o risco de deterioração pode ser mais grave até do que o previsto por Keynes.

As populações futuras serão reflexo de uma queda verdadeiramente notável da fertilidade mundial. Nos países ricos, as taxas de fertilidade pairaram em patamares inferiores aos níveis de reposição de 2,1 filhos por mulher ao longo de décadas, mas estão agora abaixo desse limiar em países de renda média do mundo inteiro, do Irã à Tailândia, passando pelo Brasil. Na Coreia do Sul, a taxa de fertilidade caiu para apenas 0,98 filho por mulher no ano passado, e até nos Estados Unidos alcançou sua baixa recorde de todos os tempos de 1,73 nascimento por mulher.

Em vista do desejo dos pais de investir em cada filho, é pouco provável uma escalada da fertilidade nos países ricos. De acordo com o mais recente relatório Perspectivas da População Mundial, da ONU, 27 países têm agora uma população menor do que em 2010. O documento prevê, além disso, que 55 países — entre os quais a China — vivenciarão quedas entre o momento atual e o ano de 2050. No século XXI, a queda das populações vai se tornar algo normal.

Algumas das consequências econômicas são óbvias: menos pessoas fazem menos coisas, portanto uma queda da população implica em desaceleração do crescimento econômico ou mesmo em diminuição da produção. Mas menos pessoas também consomem menos coisas: o que interessa, em termos de padrão de vida, é a produção por pessoa, e a pergunta decisiva é se a queda da população pode afetá- la. Existem razões pelo menos teóricas para acreditar que a resposta seja “sim”.

A principal preocupação de Keynes era a fragilidade da demanda por investimentos, em um mundo em que as empresas preveem o decréscimo da população de clientes. Isso, temia ele, levaria a uma demanda deficiente e, portanto, a uma alta taxa de desemprego.

A demografia era estreitamente ligada à teoria original a de Alvin Hansen, da década de 1930, da “estagnação secular” — uma situação de baixo crescimento e de baixas taxas de juros consolidados –, que tem sido revivida nos últimos anos.

A solução proposta por Keynes foi impressionantemente semelhante à resultante dos debates atuais: “Com uma população estática, seremos, na minha visão, absolutamente dependentes, para a manutenção da prosperidade e da paz civil, de políticas públicas em favor do aumento do consumo por meio de uma distribuição mais equitativa de rendas e de forçar a queda da taxa dos juros”. Esta última certamente aconteceu.

Para Keynes, o risco decorrente da queda da população era o desemprego – ele não via qualquer motivo pelo qual ela deveria afetar os padrões de vida ou o avanço da nova tecnologia. Já a economia contemporânea, que tenta explicar o ritmo das descobertas científicas, é menos otimista.

Em novo estudo, instigantemente intitulado “The End of Economic Growth?” (“O fim do Crescimento Econômico?”), Charles Jones, professor de economia da Universidade de Stanford, projeta o que poderia acontecer em um mundo de população declinante. Em vez do avanço persistente do crescimento per capita, apesar da queda do total da produção, Jones argumenta que os padrões de vida entrariam em estagnação com o desaparecimento gradual da população.

Ele pressupõe que a expansão da economia decorre, em última instância, das novas ideias, e que a descoberta de novas ideias depende do número de pessoas dedicadas à pesquisa para chegar a elas. Se a população começar a cair em nível mundial, isso significará que um número de pessoas cada vez menor se dedicará à pesquisa e, portanto, envolverá um progresso cada vez mais lento, em uma época em que novas tecnologias já parecem ter ficado mais difíceis de encontrar.

O trabalho de Jones sugere que a queda da população pode causar a desaceleração do crescimento dos padrões de vida. Mas existe uma possibilidade ainda mais alarmante: um círculo vicioso no qual a baixa fertilidade de uma geração causa a baixa fertilidade da geração seguinte, o que levaria a uma espiral descendente da população. Esse é o cenário que o demógrafo Wolfgang Lutz e seus colegas chamam de “A Hipótese da Armadilha da Baixa Fertilidade”.

Eles propõem um conjunto de mecanismos por meio do qual a baixa fertilidade pode se propagar de geração para geração. Em especial, sugerem que a disposição de casar e de ter filhos depende, em parte, da possibilidade de um casal conseguir preencher suas aspirações materiais. Mas a baixa fertilidade anda de mãos dadas com o envelhecimento das populações e com a elevação da carga fiscal para custear aposentadorias e assistência médica. Em lugares com baixa oferta de residências, a queda das taxas de juros, além disso, levará à elevação dos preços dos imóveis residenciais, o que pressionará ainda mais as condições financeiras dos jovens.

Há motivo para suspeitar que esses mecanismos já estão operando na contenção da fertilidade. No Japão, por exemplo, quase toda a expansão de renda recente das pessoas em idade ativa foi absorvida pelas elevações dos impostos e dos prêmios dos seguros sociais.

Keynes concluiu: “Só quero advertir vocês que aprisionar um dos males [o do crescimento da população] pode, se não formos cuidadosos, apenas servir para libertar outro ainda mais cruel e mais insolúvel”. É hora de levar essa advertência a sério”.

Efeitos da Queda da População publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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