Em julho de 2019 a B3 alcançou 1 milhão de investidores em produtos de renda variável que incluem ações FIIs, BDRs, ETFs, etc. No mês passado, dobrou o número de CPFs que investem na bolsa. Em abril, o total de pessoas físicas com recursos na depositária de renda variável da B3 chegou a 2 milhões. Esse crescimento representa uma mudança estrutural no mercado de capitais brasileiro e para entender quem é este novo investidor, a B3 divulgou no dia 19 de maio de 2020 um estudo que traça o perfil da pessoa física que está na bolsa.
De forma geral, ele é mais jovem, se preocupa em diversificar seus investimentos e começa a montar sua carteira com valores baixos. Além disso, tem demonstrado uma visão de longo prazo ao manter suas posições mesmo no auge da volatilidade dos mercados.
O estudo elaborado pela B3 traz dados demográficos, como, por exemplo, a predominância das regiões Sudeste, Sul e Distrito Federal com o maior número de investidores pessoas físicas no país. Em relação ao volume de recursos acumulados, em março de 2017, os investidores pessoas físicas tinham R$ 203 bilhões na B3 e hoje o volume chega a quase R$ 260 bi, um aumento de 30%.
Observando a evolução do comportamento desse investidor ao longo do tempo, é possível notar que a partir de 2019 houve uma queda no valor médio investido pelas pessoas físicas, mostrando uma democratização do mercado de capitais. Em 2011, 44% das pessoas físicas tinham carteiras com até R$ 10 mil de saldo. Em março de 2020, esse percentual já havia subido 10 pontos percentuais, representando 54% do universo total de CPFs que têm recursos na B3. Outro dado que chama a atenção: dos 223 mil investidores que entraram na renda variável em março de 2020, 30% fez o primeiro investimento com menos de R$ 500.
“Há dois anos temos acompanhado a entrada constante da pessoa física na renda variável, e estamos desmistificando a história de que as pessoas precisam de muito dinheiro para investir. As pessoas físicas estão cada dia mais na renda variável e os valores investidos não são altos”, afirma Felipe Paiva, diretor de Relacionamento com Clientes da B3.
“Trazer a pessoa física para a bolsa, contribui para que o mercado de capitais brasileiro seja mais forte e resiliente e o trabalho conjunto que vem sendo feito pela B3 e pelos agentes de mercado indicam que estamos dando passos importantes”, reforça Tarcísio Morelli, diretor de Inteligência de Mercado da B3.
Quando se trata de mudança geracional, o dado que mais chama atenção é o de jovens investindo na renda variável. A faixa etária de 25 a 39 anos teve uma evolução de 21 pontos percentuais de 2017 para cá. A faixa que antes representava 28% de todas as pessoas físicas, hoje representa 49%. “Ainda é muito cedo para concluirmos que esse movimento será contínuo, mas, de qualquer forma, traz um quadro positivo e sinais de que talvez estejamos tendo uma mudança geracional quando falamos de investimentos no Brasil”, afirma Paiva.
Diversificação
Ao longo do tempo, os investidores também estão descobrindo novos produtos como os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs) e os Exchange-Traded Fund (ETFs). Em 2016 havia uma base de investidores bastante concentrada em ações, já em março de 2020 quase metade da base (46%) passa a ter posição em mais de um produto de renda variável.
Além disso, as pessoas estão investindo em mais empresas, diversificando seus portfolios de ações. Se em 2016 apenas 26% da base tinha 5 ou mais empresas em carteira, esse número subiu para quase metade da base em 2020 (48%).
Para acessar a coletiva de imprensa realizada em 19 de maio, clique aqui.
Acesse o estudo completo sobre o perfil do investidor pessoa física.
Fernando Torres (Valor, 21/05/2020) avaliou o estudo abaixo.
“Sabe a cara de uma criança quando ganha um presente de aniversário ou mesmo um simples pirulito? É parecida com a que faz um jornalista quando se depara com uma informação inédita sobre a área que acompanha.
Cubro mercado de capitais há quase vinte anos, e nunca tive acesso a dados mais detalhados sobre o perfil dos brasileiros que investem em ações.
Dá para imaginar, então, como recebi bem a inciativa da B3 de finalmente divulgar mais informações sobre quem são essas pessoas, o que elas comem, onde e como se reproduzem…
Ainda falta saber muita coisa, mas o retrato que a B3 trouxe já nos permite ter algumas impressões, e a fazer perguntas.
Antes de começar a análise, vale situar o leitor. A bolsa sempre divulgou o número de contas de “investidores individuais” com algum saldo em custódia, bem como o volume de compras e vendas de ações por parte deste público.
O número de contas não se confunde com o de CPFs, já que um mesmo investidor pode ter aplicações em bolsa por mais de uma corretora. E isso é ainda mais verdadeiro hoje, com a facilidade para abertura de novas contas, o crescimento da concorrência, e a isenção de taxa de manutenção de conta na maioria das plataformas.
Agora a B3 abriu os dados por CPF, e trouxe outras informações. São 2,4 milhões de contas e 1,9 milhão de CPFs, dos quais 1,7 milhão possuíam alguma ação em março (alguns investidores podem ter apenas fundos imobiliários, por exemplo). Esse número se compara com 600 mil em 2018, e com 1,2 milhão em 2019.
Esses dados mostram um organismo em movimento. Se a então BM&FBovespa tivesse começado a divulgar esses números anos atrás, eles seriam bastante monótonos. Entre 2011 e 2017, o número de CPFs com investimento em bolsa ficou estacionado em 500 mil.
O cenário que a B3 divulga agora é de transformação. O crescimento expressivo do número de contas foi acompanhado da redução do saldo mediano das aplicações. Metade dos 600 mil investidores tinha menos que R$ 16 mil na carteira de ações em 2018, e agora metade dos 1,7 milhão possui saldo inferior a R$ 6 mil.
Trata-se, sem dúvida nenhuma, de uma democratização do investimento em ações. Com o trabalho da própria B3, da CVM, das plataformas de investimento, das casas de análise, de influenciadores, de algumas empresas, e também da mídia especializada, cada vez mais os brasileiros vêm tendo contato com a renda variável. Como motor desse movimento, o avanço da tecnologia e, claro, a queda da taxa Selic para o nível mais baixo de todos os tempos.
Foi o que esse grupo de agentes sempre desejou. Que a aplicação de parte da carteira em ações fosse algo natural para o brasileiro, como é para pessoas de países ricos.
E o papel principal do mercado de ações tem ficado mais claro.
Nas emissões primárias de IPOs e ofertas subsequentes, os investidores entram para financiar planos de crescimento ou para mudar a estrutura de capital de companhias de verdade, que empregam pessoas de verdade. Já o mercado secundário, a negociação diária que acompanhamos nos sites de finanças, serve para dar preço e condições de liquidez para que esses investidores mudem de ideia e de planos no meio do caminho. Sem o segundo não existe o primeiro, e vice-versa.
Quando essas duas pernas do mercado de capitais funcionam bem, as empresas não dependem apenas do setor bancário e/ou do governo para crescer. E há uma correlação positiva entre mercado de capitais forte e desenvolvimento econômico.
Então os dados divulgados pela B3 são motivos apenas de comemoração, certo? Talvez.
Por razões além da racionalidade – às vezes por ambição, por mero divertimento ou até mesmo por patologia -, algumas pessoas usam o mercado, especialmente o de derivativos, para fazer apostas. Embora seus executivos tenham dito que os day-traders são uma porção diminuta do universo de investidores (mesmo dos novos), a B3 não trouxe dados (ainda) para comprovar a afirmação. É importante que os intermediários assegurarem que o perfil do investidor que entra nessa atividade está adequado ao nível de risco que ele pode suportar.
O segundo ponto de atenção tem relação com o tíquete do primeiro investimento. Cerca de 40% das novas aplicações em bolsa em março foram de até R$ 1 mil. Isso pode revelar que o patrimônio das pessoas não é muito grande. Mas também que estão entrando com uma parcela pequena do patrimônio, colocando só o pé na piscina para testar. Isso seria uma boa notícia, mas ainda dependente de confirmação.
O valor baixo da aplicação de entrada poderia trazer uma preocupação com baixa diversificação. Sobre esse ponto, os dados são mistos. Há baixa penetração de ETFs (que garantiriam a diversificação), mas aumento do número de ativos por carteira.
Agora, se o valor investido é baixo, e o número de ativos tem crescido, o risco que se coloca é sobre os custos. Num exemplo, a compra de três ativos, com taxa de corretagem de R$ 15 por ordem executada, já implicaria num custo de 4,5% na aplicação. Apenas para entrar.
Ao trazer essas preocupações, não quero criticar o crescimento do mercado. Pelo contrário. A ideia sim é chamar a atenção de investidores e dos participantes de mercado para que se promova uma saudável popularização da bolsa. Ter acesso aos dados da B3 ajuda todos a buscar esse objetivo.”
B3: Estudo sobre o Perfil dos Investidores Pessoas Físicas na Bolsa de Valores publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário