sexta-feira, 13 de março de 2020

Política de Ecoestrutura em Sistema Complexo

David Colander e Roland Kupers, coautores do livro “Complexity and the Art of Public Policy: Solving Society’s Problems from the Bottom Up” (Princeton University Press, 2014), no Capítulo 12, intitulado “Ativismo em Laissez-Faire”, afirmam: “neste capítulo, reconsideramos as questões de estrutura e governança de corporações e empresas em geral como um exemplo concreto de como uma abordagem de complexidade muda a maneira como pensamos sobre políticas. Mostramos como uma pequena mudança na ecoestrutura, especialmente quando aplicada no estágio embrionário formativo das instituições emergentes, pode mudar fundamentalmente a sociedade de baixo para cima, sem intervenção estatal maciça.”

Eles argumentam, ao longo do tempo, em alguns setores importantes da economia onde as metas sociais são importantes, as empresas com fins lucrativos e sem fins lucrativos existentes podem ser substituídas por empresas com fins lucrativos e socialmente amigáveis, projetadas para permitir as metas sociais serem alcançadas maneira sustentável de baixo para cima.

O objetivo da política defendida por eles é incentivar o desenvolvimento de um ambiente institucional favorável às soluções políticas de baixo para cima, para novas empresas com foco social poderem surgir e se desenvolver. O poder da política reside não apenas em sua adaptabilidade, mas também em sua capacidade de permitir suas soluções evoluírem à medida que surgem novas preferências, valores e gostos. Ele deixa as estruturas existentes no lugar, simplesmente expandindo a escolha das estruturas empresariais possíveis dos empreendedores sociais adotar.

Uma das principais diferenças entre a política de complexidade e a política padrão é a primeira ver muitas das iniciativas políticas mais importantes como afetando a ecoestrutura. Essa ecoestrutura trabalha indiretamente com incentivos.

A política de complexidade pergunta o seguinte: como a ecoestrutura influencia o que as pessoas fazem e querem, enquanto o foco da política padrão está nos incentivos diretos – como o preço de algo influencia o que as pessoas fazem? Isso faz uma enorme diferença em termos de política.

Neste capítulo, os coautores fornecem um exemplo do tipo de política indireta aberto pelo quadro de complexidade da política. É chamada por eles de política social de baixo para cima. Descrevem uma política projetada para incentivar a natureza mais social dos indivíduos a se expressar através do mercado, em vez de ações governamentais e controle direto.

Começam este capítulo com uma citação de Keynes sobre a evolução do objetivo de acumular riqueza. Keynes faz uma afirmação poderosa sobre a necessidade humana de acomodar objetivos mais amplos além do “amor ao dinheiro” em nossas sociedades.

Aqui está a citação completa:

“Há mudanças em outras esferas para as quais devemos esperar chegar. Quando o acúmulo de riqueza não for mais de alta importância social, ocorrerão grandes mudanças no código moral. Poderemos nos livrar de muitos dos princípios pseudo-morais dominantes há duzentos anos, pelos quais exaltamos algumas das mais desagradáveis ​​qualidades humanas para a posição das mais altas virtudes. Seremos capazes de ousar avaliar o motivo monetário pelo seu verdadeiro valor. O amor ao dinheiro como uma possessão – tão distinto do amor ao dinheiro como um meio para os prazeres e realidades da vida – será reconhecido pelo que é, uma morbidade um tanto nojenta, uma daquelas propensões semi-criminais e semi-patológicas que se entrega com um estremecimento aos especialistas em doenças mentais. Todos os tipos de costumes sociais e práticas econômicas que afetam a distribuição da riqueza e de recompensas e multas econômicas, que agora mantemos a todo custo, por mais desagradáveis ​​e injustas que possam ser em si mesmas, porque são tremendamente úteis na promoção da acumulação de capital, então seremos livres, finalmente, para os descartar.”

A citação de Keynes serve para destacar um aspecto central da abordagem de complexidade da política. Ele pressupõe os indivíduos serem inteligentes e adaptáveis ​​e, se lhes for dada responsabilidade, eles os usarão para evitar problemas e projetar instituições de modo a atingirem os objetivos desejados. Mas eles farão isso apenas se tiverem a chance e apenas no ambiente institucional apropriado.

“Ter uma chance” significa o governo não “resolver” o problema prematuramente. Nessa visão, a abordagem da complexidade da política é semelhante à visão fundamentalista do mercado. Mas difere da posição fundamentalista do mercado de duas maneiras cruciais:

  • primeiro, vê os indivíduos preocupados com muito mais além do bem-estar material, suas aspirações estendendo-se a melhorias mais amplas do bem-estar social;
  • segundo, enquanto a posição fundamentalista do mercado pressupõe o mercado permitir uma solução ótima, o quadro de complexidade reconhece pode haver aprisionamentos, efeitos coletivos emergentes ou falhas de mercado.

Eles precisam ser deliberadamente superados por meio de ações coletivas para permitir a economia mudar em direção a uma atração mais desejável.

O desenho de nossas instituições atuais e as premissas implícitas construídas em sua estrutura, da qual o bem-estar material é o objetivo principal ou único, direciona nossa sociedade estritamente nessa direção materialista. Com o tempo, o materialismo se torna tão arraigado a ponto de ser difícil reconhecer não ser inerente a nós. Isso aconteceu com o capitalismo.

Economistas clássicos viam o foco nas necessidades materialistas e na maximização do lucro como temporariamente úteis. As empresas eram muito melhores em atender às necessidades materialistas em lugar das alternativas. Com as pessoas passando fome, esse foco materialista era aceitável, como Keynes sugere.

Mas economistas clássicos esclarecidos também viam esse foco materialista como temporário. Eles esperavam a estrutura institucional mudar logo quando a sociedade se tornasse rica e o problema econômico fosse resolvido. Mas a estrutura institucional não mudou – ficou trancada.

O quadro de políticas de complexidade nos leva a refletir sobre o modo como nossas instituições evoluíram e a considerar se elas poderiam ter evoluído e, daqui para frente, poderiam evoluir de maneira diferente.

Os coautores acreditam em nossas instituições poderem evoluir, se for criada um ecossistema propício a empreendimentos com benefício próprio e esse ecossistema incentivar ativamente as pessoas a criar um foco social em seus objetivos. Em vez de competir para construir maiores mansões, as pessoas competirão para alcançar objetivos sociais de maneira mais eficiente e eficaz em comparação aos outros do passado.

Muitos dos chamados barões ladrões viam seu papel de beneficiar a sociedade com sua renda. Bill Gates está dedicando suas energias e grande parte de sua fortuna à eliminação de doenças. Agora imagine um mundo onde existem centenas de milhares de Bill Gates, buscando alcançar objetivos sociais não depois de terem ganho bilhões, mas desde a sua primeira entrada nos negócios.

Vale a pena explorar se alguma mudança estrutural institucional poderia criar um mundo onde as normas incentivassem os empreendedores a serem empreendedores sociais e se concentrassem em alcançar objetivos sociais, não objetivos materialistas.

O que David Colander e Roland Kupers, coautores do livro “Complexidade e arte das políticas públicas: resolvendo os problemas da sociedade de baixo para cima”,  argumentam é, se as instituições forem projetadas para incentivar as pessoas a enfrentar problemas sociais, haveria empreendedores sociais capazes de liderar o caminho na criação de soluções não-governamentais resilientes de baixo para cima para esses problemas sociais.

Isso não acontece ainda porque a atual estrutura institucional não é amigável para empreendedores sociais. Portanto, o objetivo da política de complexidade é expandir a estrutura institucional para abrir espaço para empreendedores sociais.

Política de Ecoestrutura em Sistema Complexo publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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