terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Factfulness: o hábito libertador de só ter opiniões baseadas em fatos

Hans Rosling (1948-2017) foi o palestrante TED mais didático e desafiador visto por mim. Ele testava o conhecimento da plateia como um professor faz em sala-de-aula, motivando a busca por maior atualização em termos de fatos e dados. Ele foi médico de saúde pública, inclusive na África, pesquisador e palestrante sobre saúde global.

Foi lançado um livro póstumo com sua obra: “Factfulness: o hábito libertador de só ter opiniões baseadas em fatos” (Rio de Janeiro: Record, 2019). É de coautoria dele e sua família colaboradora. As ilustrações e gráficos são baseados em material gratuito da Fundação Gapminder (https://www.gapminder.org/), criados por Ola Rosling e Anna Rosling Rönnlund.

Em 2005, fundaram a Fundação Gapminder, com a missão de combater a ignorância com uma visão de mundo baseada em fatos. Ola e Anna ficaram responsáveis pela análise de informações, explicações visuais inventivas, histórias envolvendo dados e um design de apresentação simples. Foi ideia deles medir sistematicamente a ignorância. Eles projetaram e programaram os gráficos dinâmicos de bolhas proporcionais, marca registrada das palestras de Hans Rosling.

Este livro é sobre o mundo real e sobre como compreendê-lo. Compartilhado com o leitor um conjunto de ferramentas simples para pensar. Elas irão ajudá-lo a compreender bem o quadro geral. Melhorará seu senso de como o mundo funciona, sem precisar aprender todos os detalhes estatísticos.

Revela principalmente a tendência de queda da pobreza extrema. Ao longo dos últimos vinte anos, a proporção da população global vivendo em pobreza extrema caiu pela metade. Isso é totalmente revolucionário. Rosling considerou-a como a mudança mais importante acontecida no mundo no período da sua vida.

Gente com mais educação não se sai melhor em relação a um chimpanzé, cujas respostas são aleatórias, ao responder questões sobre o mundo contemporâneo. Rosling testou plateias do mundo inteiro e de todas as classes: estudantes de Medicina, professores, acadêmicos, cientistas eminentes, banqueiros, executivos de multinacionais, jornalistas, ativistas e até mesmo autoridades públicas graduadas. São pessoas altamente educadas e interessadas pelo mundo.

Mas a maior parte delas — uma impressionante maioria — errou a maior parte das respostas. Alguns desses grupos tiveram até mesmo desempenho pior se comparado ao público geral. Alguns dos resultados mais deploráveis vieram de um grupo de vencedores do prêmio Nobel e pesquisadores médicos. Não é uma questão de inteligência. Todos parecem compreender o mundo de uma maneira sistematicamente equivocada. É uma ignorância maciça!

Todo grupo de pessoas questionado por Rosling pensa o mundo ser mais assustador, mais violento e menos esperançoso — em suma, mais dramático — em lugar do mundo real. Percebeu o problema não poderia simplesmente ser o fato de as pessoas não terem o conhecimento, porque isso resultaria em respostas aleatoriamente incorretas — respostas de chimpanzés —, e não em respostas piores se comparado ao randômico, isto é, acertos inferiores aos dos chimpanzés, respostas sistematicamente erradas. Um desempenho tão ruim poderia vir apenas de um “conhecimento” diligentemente errado.

Pensou, por muitos anos, ser um problema de atualização: seus estudantes de saúde global, e todas as outras pessoas testadas ao longo dos anos, tinham conhecimento, mas ele estava desatualizado, frequentemente em várias décadas. As pessoas preservavam uma visão de mundo da época em que seus professores haviam saído da escola.

Desse modo, para erradicar a ignorância — pelo menos dentro da sua conclusão —, ele precisava atualizar o conhecimento das pessoas. Para tanto, era necessário desenvolver materiais didáticos de modo a apresentar os dados de forma mais clara. Ola e Anna se envolveram e começaram a desenvolver gráficos desenhados.

Viajou pelo mundo com essas extraordinárias ferramentas didáticas. Elas lhe levaram a palestras TED em Monterey, Berlim e Cannes, às salas de reuniões dos Conselhos de Administração de multinacionais como Coca-Cola e IKEA, a bancos e fundos de cobertura globais, ao Departamento de Estado dos Estados Unidos. Ficou entusiasmado ao utilizar seus gráficos dinâmicos para demonstrar a todos como o mundo havia mudado.

Aos poucos, porém, percebeu haver algo mais acontecendo. A ignorância não era apenas um problema de atualização. Não podia ser resolvida simplesmente com o fornecimento de animações mais claras sobre dados ou melhores ferramentas didáticas. Percebi até mesmo as pessoas curtidoras de suas palestras não estarem realmente ouvindo o dito. Continuavam atoladas em sua antiga visão e negativa de mundo.

As novas ideias simplesmente não pegavam. Por que a dramática visão de mundo era tão persistente? A culpada seria a mídia? Naturalmente, pensou sobre isso. Mas essa não era a resposta. Sim, a mídia tem um papel, mas não podemos nos resumir a apenas vaiar a mídia.

Por isso, ele escreveu este livro. Ele compartilha com você as conclusões às quais finalmente chegou, baseadas em anos tentando ensinar uma visão de mundo a partir de fatos e ouvindo como as pessoas interpretam mal os fatos mesmo quando eles estão bem ali na sua frente. Mesmo especialistas extremamente inteligentes e altamente educados, se saem pior do que chimpanzés em perguntas factuais a respeito do mundo.

Pense o mundo. Guerra, violência, desastres naturais, desastres provocados pelo homem, corrupção. As coisas vão mal, e parece que estão piorando, certo? Os ricos ficam mais ricos, e os pobres, mais pobres; o número de pobres não para de crescer; os recursos naturais logo vão acabar, a menos se fizermos algo drástico. Pelo menos esse é o quadro encontrado pela maioria dos ocidentais na mídia e carregado em suas mentes.

Rosling chama isso de visão de mundo superdramática. É estressante e enganadora.

Na realidade, a vasta maioria da população do mundo encontra-se em alguma parte no meio da escala de renda. Essas pessoas talvez não se enquadrem no pensado como classe média, mas não estão vivendo em pobreza extrema. Suas filhas frequentam a escola, suas crianças são vacinadas, elas vivem em famílias com dois filhos, e querem ir para o exterior não como refugiadas, mas em viagem de férias.

Passo a passo, ano a ano, o mundo está melhorando. Não em cada uma das estatísticas, não em todos os anos, mas melhora como regra. Apesar de enfrentarmos enormes desafios, fizemos tremendo progresso. Essa é a visão de mundo baseada em fatos.

A visão de mundo superdramática leva as pessoas às respostas mais dramáticas e negativas para as perguntas factuais. Se uma pessoa tem uma visão de mundo equivocada, então sistematicamente ela terá palpites errados.

Mas essa visão superdramática não é causada simplesmente por conhecimento ultrapassado, como Rosling imaginava antigamente. Até mesmo as pessoas com acesso às informações mais recentes entendem errado o mundo. Ele ficou convencido disso não ser culpa de uma mídia diabólica, propaganda, fake news ou fatos errados.

Minha experiência, ao longo de décadas dando palestras, aplicando testes e ouvindo a forma como as pessoas interpretam mal os fatos, mesmo quando estão diante deles, finalmente fez ele perceber ser muito difícil mudar a visão de mundo superdramática porque ela decorre precisamente da maneira como nosso cérebro humano funciona.

As ilusões acontecem nos nossos cérebros. Eles têm equívocos sistemáticos, sem relação com problemas de visão individuais.

Por que os cérebros de tanta gente sistematicamente interpretam mal o estado do mundo? O cérebro humano é produto de milhões de anos de evolução. Seus “circuitos” contêm instintos capazes de terem ajudado nossos ancestrais a sobreviver em pequenos grupos de caçadores e coletores.

Nossos cérebros frequentemente se apressam em chegar a conclusões rápidas sem muita ponderação, algo propício a ajudar a evitar perigos imediatos. Estávamos interessados em fofocas e histórias dramáticas, para prevenção contra inimigos ou adversidades potenciais, como a única fonte de notícias e informação útil.

Enfim, segundo Hans Rosling, no livro “Factfulness: O hábito libertador de só ter opiniões baseadas em fatos”, “nossos cérebros rápidos no pensar e por buscar algum alarde — nossos instintos dramáticos — estão causando concepções equivocadas e uma visão de mundo superdramática.” Está em linha com o pensamento de Daniel Kahneman em seu livro “Pensar Rápido, Pensar Devagar”, psicólogo ganhador do Nobel pela elaboração da Economia Comportamental.

“Se filtrássemos cada informação que chega e analisássemos racionalmente cada decisão, seria impossível ter uma vida normal. Não devemos cortar todo açúcar e gordura, e não devemos pedir a um cirurgião que remova as partes do cérebro que lidam com as emoções. Mas precisamos aprender a controlar a quantidade de drama que consumimos. Sem limites, nosso apetite pelo dramático vai longe, o que nos impede de ver o mundo como é e nos põe terrivelmente fora da rota.

Factfulness apresenta uma visão de mundo baseada em fatos. Este livro é a derradeira batalha da missão da vida inteira de Hans Rosling em combater a devastadora ignorância global. É sua última tentativa de causar um impacto no mundo:

  • mudar a maneira de pensar das pessoas,
  • acalmar seus temores irracionais e
  • redirecionar suas energias para atividades construtivas.

Antes, ele se armava com enormes conjuntos de dados, softwares para abrir os olhos das pessoas, em um estilo energético de palestrar. Não foi o bastante. Mas esperava este livro pudesse ser. Contém dados como você jamais viu: informações como uma forma de terapia. É a compreensão como uma fonte de paz mental.

O mundo não é tão dramático quanto parece. Com sua leitura, você será capaz de substituir a sua visão de mundo superdramática por uma baseada em fatos. Você será capaz de entender corretamente o mundo sem ter de aprender pela memorização. Você tomará decisões melhores, ficará alerta para os perigos e possibilidades reais, e evitará ficar constantemente estressado com as coisas erradas.

Trata-se de reconhecer histórias superdramáticas e obter ferramentas para pensar e controlar os instintos dramáticos. Assim, você será capaz de mudar seus conceitos errados e desenvolver uma visão de mundo baseada em fatos.

O mundo é totalmente diferente do imaginado em geral. Muitas das mudanças pensadas impossíveis de ocorrerem já aconteceram.

Este é um livro sobre o mundo como ele realmente é. E você não enxerga o mundo como ele realmente é. Então, faça sua leitura:

  1. se você estiver mais interessado em estar certo em lugar de continuar a viver na sua bolha,
  2. se estiver disposto a mudar sua visão de mundo,
  3. se estiver pronto para substituir reações instintivas por pensamentos críticos, e
  4. se estiver se sentindo humilde, curioso e pronto para se maravilhar.

 

Factfulness: o hábito libertador de só ter opiniões baseadas em fatos publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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