Ronaldo Pilati, no livro “Ciência e pseudociência: por que acreditamos naquilo em que queremos acreditar”, aborda o essencial para uma boa compreensão do conhecimento adjetivado como científico. Porém, existem cinco posturas que considero relevantes descrever aqui.
Essas cinco características referem-se a uma postura perante tudo o que você pode saber sobre a realidade e são pilares de uma visão científica e racional do universo.
Questione a autoridade. Pense por si mesmo. Questione a si mesmo. A ciência não é um movimento de produção de conhecimento que utiliza a autoridade, seja de pessoas ou de argumentos, para conhecer a realidade. Ao contrário, o seu principal propósito é avaliar o conhecimento já existente e questioná-lo, pensar em alternativas e formas mais eficientes de conhecer. Por esse motivo, pensar por si mesmo, de forma livre e independente, é essencial na empreitada.
É importante, entretanto, salientar: para pensar por si mesmo e questionar o que os outros sabem é necessário compreender como eles conheceram a realidade, quais explicações já foram apresentadas. Portanto, conhecer com cuidado e propriedade aquilo já sabido sobre determinado assunto é o ponto de partida para seguir a caminhada do saber. Porém, isso não implica aceitar o que já foi dito e escrito por alguém, mas sim utilizar tal informação como fundamento para questionar e buscar desenvolver algo mais aproximado e exato para compreender determinado assunto.
Não acredite em nada simplesmente porque você quer acreditar. Possuímos uma tendência a desenvolver explicações sobre aquilo que nos rodeia e sobre nós mesmos. Entender é uma motivação fundamental em nossa espécie.
O problema reside no fato de acreditarmos em explicações do mundo simplesmente porque queremos acreditar, desconsiderando ou ignorando critérios e indicadores capazes de nos apontarem para a inadequação daquela explicação.
Ainda quando tenhamos uma tendência a acreditar em explicações das mais variadas sobre o que ocorre no mundo, uma visão científica exige sermos capazes de avaliar a adequação e a capacidade de tal explicação ser a forma mais precisa de compreender algo, evitando uma predisposição em acreditar simplesmente porque queremos acreditar.
Não devemos ser seduzidos pela lógica interna do argumento sem evidências que o sustentem. Esse aspecto é crucial, ainda que eu reconheça a enorme dificuldade de se questionar argumentos que, retoricamente, parecem bem alinhados, até perfeitos. Lembre-se de sempre questionar a si mesmo. Acredite porque você tem indícios de aquela crença ser eficiente para explicar/conhecer algo.
Teste ideias por meio da experimentação. Se elas não sobreviverem, abandone-as. Criar formas de confrontar as ideias com o mundo é o único meio para aceitá-las ou rejeitá-las. O princípio de testar ideias pela experimentação significa confrontá-las com algum critério externo a elas mesmas.
Uma ideia apenas será boa o suficiente se passar por essa provação. Você não deve ter apego às ideias antes de submetê-las a este tipo de teste. Não se deve ajustar os fatos advindos da observação às ideias como estratégia para torná-las verdadeiras.
Entenda a palavra “experimentação” referir-se a algum tipo de experiência, seja ela observacional, seja um teste experimental controlado. Mesmo possuindo características distintas, há diferentes formas de confrontar uma ideia com a realidade. O importante é garantir haver real confrontação com base nos recursos metodológicos e de mensuração disponíveis.
Siga as evidências aonde quer elas o levem e, se não houver evidências, não julgue, não conclua possuir todo o conhecimento. Uma parte significativa do trabalho de investigação científica exige o cientista desenvolver formas e estratégias para produzir evidências sobre o seu objeto de estudo.
Tais estratégias, muitas vezes, exigem aprendizagem a partir de erros e, não raro, de descobertas casuais, decorrentes do desenvolvimento de novas formas de produção de evidências. Desenvolver meios e formas inovadoras de buscar evidências é uma das tarefas mais importantes a que os cientistas se dedicam. Essa perseverança é uma das mais importantes características possuídas pela ciência para conhecer a realidade.
Sempre lembre: Você pode estar errado! O ceticismo é a base de uma postura racional de compreensão do mundo. Isso implica considerar, mesmo com todos os elementos a favor de suas ideias, ser sempre possível elas estarem erradas, incompletas ou imprecisas.
Essa atitude possibilita o avanço e o espaço para o surgimento de novas ideias, sejam aquelas partidas de você ou as vindas de outras pessoas. Essa é a oxigenação que permite a eficiência do conhecimento científico para compreender a realidade.
Como você já deve ter percebido, o que alicerça a forma como a ciência apreende a realidade está baseado na concepção de o conhecido é incerto. Reconhecer a fragilidade do sabido é, na verdade, a maior força de nosso conhecimento sobre a realidade poder nos proporcionar, além de ser um exercício da humildade do saber.
Essa postura cética trouxe e traz profundo efeito sobre a condição da existência humana. É um exercício difícil para a maioria de nós, mas fundamental. Antes vivermos na incerteza do sabido em lugar de viver com a certeza de algo possível de ser equivocado, nos distanciando da verdade.
Esse caráter de incerteza tem outra consequência positiva: o constante questionamento. Perguntar é algo básico para a postura racional sobre o mundo. Aceitar como plausível a resposta à pergunta pode estar errada é o que possibilita a formulação de novas perguntas, trilhando um caminho possível de rever e aprimorar o sabido. Somos curiosos em essência.
Sistemas infalsificáveis de compreensão do mundo reprimem em nós a necessidade de fazer perguntas porque já nos apresentam as respostas finais. Assim, sistemas infalsificáveis nos prestam um desserviço, quando nosso objetivo é compreender a realidade com a constante busca do aprimoramento do sabido hoje.
Pilares de uma Visão Científica e Racional do Universo publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário