segunda-feira, 16 de março de 2020

Estado no Credo Ultraliberal

Ludwig von Mises, no livro “Ação Humana: Um Tratado de Economia”, apresenta seu inimigo principal.

“O Estado ou O Governo é o aparato social de compulsão e coerção. Tem o monopólio da ação violenta. Nenhum indivíduo tem o direito de usar violência ou ameaça de violência se o governo não o investir neste direito. O Estado é essencialmente uma instituição para a preservação de relações pacíficas entre os homens. Não obstante, para preservar a paz, deve estar preparado para reprimir as tentativas de violação da paz.

A doutrina social liberal, baseada nos ensinamentos da Ética Utilitarista e da Economia, vê o problema da relação entre governo e governados de um ângulo diferente daquele do universalismo e do coletivismo.

O liberalismo entende os governantes, sempre uma minoria, não podem permanecer indefinidamente no poder sem o apoio consentido da maioria dos governados. Em qualquer sistema de governo, a base sobre a qual é construído e seu sustentáculo é sempre o entendimento dos governados de obedecer e ser leal a este governo servir melhor os seus próprios interesses em lugar da insurreição e do estabelecimento de um novo regime.

A maioria tem o poder de rejeitar um governo impopular e usa este poder quando se convence de que o seu bem-estar assim o exige. Em longo prazo, não pode haver governo impopular.

A guerra civil e a revolução são os meios pelos quais as maiorias descontentes derrubam governantes e métodos de governo que não lhes convêm. Para preservar a paz social, o liberalismo é favorável ao governo democrático.

A democracia, portanto, não é uma instituição revolucionária. Ao contrário, é precisamente o modo de evitar revoluções e guerras civis, porque possibilita o ajustamento pacífico do governo à vontade da maioria. Quando os homens no poder e suas políticas, desagradam à maioria, na primeira eleição são substituídos por outros que defendem outras políticas.

O conceito de governo majoritário ou governo pelo povo como recomenda o liberalismo não visa à supremacia do medíocre, do inculto ou dos bárbaros. [Epa! Uai…]

Os liberais também acham uma nação dever ser governada pelos mais aptos a esta tarefa. Mas acreditam a aptidão para governar é mais bem demonstrada pela capacidade de convencer os seus cidadãos em vez do uso da força.

Nada garante, evidentemente, que os eleitores confiarão o poder ao candidato mais competente. Mas nenhum outro sistema poderia oferecer tal garantia.

Se a maioria da nação está dominada por princípios falsos e prefere candidatos indignos, não há outro remédio a não ser tentar mudar suas ideias, explicando princípios mais consistentes e recomendando homens melhores. Nenhuma minoria conseguirá êxitos duradouros ao recorrer a outros métodos.

O universalismo e o coletivismo não podem aceitar a solução democrática para o problema do poder. Em sua opinião, o indivíduo, ao agir de acordo com o código ético, não o faz em benefício direto de seus interesses particulares, mas, ao contrário, renuncia aos seus próprios objetivos em benefício dos desígnios da Divindade ou da comunidade.”

[Ludwig von Mises volta a atacar seus inimigos partindo de uma afirmação sem demonstração: de os desígnios da comunidade democrática não deverem ser tolerados até haver a alternância de poder. Fica contraditório com o dito antes por ele mesmo!

Curiosamente, a atual aliança entre ultraliberais e evangélicos no Brasil receberia uma crítica veemente do guru dos primeiros.]

“Os que receberam a inspiração celestial, iluminados por tal carisma, têm o dever de pregar o evangelho aos dóceis e de recorrer à violência contra os intratáveis. O líder carismático é o vigário da Divindade, o representante da comunidade, instrumento da história. É infalível e tem sempre razão. Suas ordens são a norma suprema.

O universalismo e o coletivismo são necessariamente sistemas de governo teocrático. A característica comum de todas as suas variantes é a postulação de uma entidade sobre-humana à qual os indivíduos devem obediência.

O que as diferencia uma das outras é apenas a denominação dada a esta entidade e o conteúdo das leis proclamadas em seu nome. O poder ditatorial de uma minoria não encontra outra forma de legitimação a não ser apelando para um suposto mandato recebido de uma autoridade suprema e sobre-humana.

Pouco importa se o autocrata baseia sua autoridade no direito sagrado dos reis ou na missão histórica da vanguarda do proletariado; nem se o ser supremo se denomina Geist (Hegel) ou Humanité (Auguste Comte).

Os termos Sociedade e Estado, como empregados pelos adeptos contemporâneos do socialismo, do planejamento e do controle social das atividades dos indivíduos, têm o significado de uma divindade. Os padres dessa nova religião atribuem a seu ídolo todas aquelas virtudes atribuídas pelos teólogos atribuem a Deus: onipotência, onisciência, bondade infinita, etc.

Se admitirmos que exista, acima e além das ações individuais uma entidade imperecível que visa a seus próprios fins, diferentes dos homens mortais, teremos já estruturado o conceito de um ser sobre-humano.

Não podemos, então, fugir da questão sobre quais fins têm precedência, sempre quando houver um conflito: se os do Estado ou Sociedade, ou os do indivíduo. A resposta a esta questão já está implícita no próprio conceito de Estado ou Sociedade como entendido pelo coletivismo e pelo universalismo.

Postularam-se a existência de uma entidade, por definição, a mais elevada, mais nobre e melhor se comparada aos indivíduos. Não pode haver qualquer dúvida de os objetivos de esse ser eminente deverem prevalecer sobre os dos míseros mortais.”

[Ludwig von Mises reconhece: é verdade certos amantes de paradoxos – Max Stirner, por exemplo – se divertem invertendo as coisas e, assim, sustentam a precedência ser do indivíduo.

Logicamente, você inverte os termos e toda a parolagem de von Mises pode ser feita por seus adversários contra seu credo, se ele não testar suas hipóteses face às evidências empíricas concretas.

Veja como ele coloca um fim para o impasse ideológico: pelo recurso à força das armas!]

“Os adoradores do Estado proclamam a excelência de um determinado Estado, qual seja o seu próprio Estado. Os nacionalistas, a excelência da sua própria Nação.

Se dissidentes contestam o seu programa, anunciando a superioridade de outro ídolo coletivista, sua única resposta é repetir muitas vezes: nós estamos certos porque uma voz interior nos diz que nós estamos certos e vocês estão errados.

Os conflitos entre coletivistas de seitas ou credos antagônicos não podem ser resolvidos pela discussão racional. Só podem ser resolvidos pelo recurso à força das armas. As alternativas aos princípios liberais e democráticos do governo da maioria são os princípios militares do conflito armado e da opressão ditatorial.

Todas as variantes de credos coletivistas estão unidas na sua implacável hostilidade às instituições políticas fundamentais do sistema liberal: governo da maioria, tolerância para com as opiniões divergentes, liberdade de pensamento, de expressão e de imprensa, igualdade de todos perante a lei.

Essa união dos credos coletivistas nas suas tentativas de destruir a liberdade deu origem à suposição equivocada de a controvérsia política atual ser entre individualismo e coletivismo. Na verdade, é uma luta entre o individualismo de um lado e uma variedade de seitas coletivistas do outro. E o ódio e hostilidade mútuos entre essas seitas são ainda mais ferozes se comparada à sua aversão ao sistema liberal.

Não é uma seita marxista uniforme a atacar o capitalismo, mas um bando de grupos marxistas. Esses grupos – por exemplo, stalinistas, trotskistas, mencheviques, seguidores da II Internacional, entre outros – lutam uns contra os outros de forma desumana e brutal.

Ademais, existem muitas outras seitas não marxistas aplicando os mesmos métodos atrozes nas suas lutas internas. Se o coletivismo vier a substituir o liberalismo, o resultado será uma luta sangrenta e interminável.”

[Ora, ora, Ludwig von Mises não aceita, de maneira apriorística, a existência de uma esquerda democrática. E tampouco vê os conflitos abertos entre os adeptos da extrema-direita. Ou dá “saltos na tumba” quando toma conhecimento das alianças conflitivas de seus adeptos na política brasileira. Os adjetivos distribuídos por ele podem ser “iguais e contrários”.]

 

 

Estado no Credo Ultraliberal publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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