Ludwig von Mises, em determinado ponto de seu livro “Ação Humana: Um Tratado de Economia”, começa a destratar as ideias adversárias.
“Segundo as doutrinas do universalismo, do realismo conceitual, do holismo, do coletivismo e de alguns representantes da Gestaltpsychologie, a sociedade é uma entidade capaz de viver sua própria vida, independente e separada das vidas dos diversos indivíduos, agindo por sua própria conta e visando a seus próprios fins. Eles são diferentes dos pretendidos pelos indivíduos.
Assim sendo, é evidente poder surgir um antagonismo entre:
- os objetivos da sociedade e
- os objetivos individuais.
Para salvaguardar o florescimento e futuro desenvolvimento da sociedade, torna-se necessário controlar o egoísmo dos indivíduos e obrigá-los a sacrificar seus desígnios egoístas em benefício da sociedade.
Chegando a esta conclusão, todas as doutrinas holísticas têm forçosamente de abandonar os métodos tradicionais da ciência humana e do raciocínio lógico e adotar uma profissão de fé teológica ou metafísica.
Forçosamente têm de admitir a Providência, através de seus profetas, apóstolos e líderes carismáticos, obrigarem os homens – perversos por natureza, isto é, dispostos a perseguir seus próprios fins – a entrar no caminho certo determinado pelo Senhor ou por o Weltgeist ou por a história eles trilharem.”
[Evidentemente, é uma imagem caricata surgida da pergunta apressada para obter uma resposta pueril sem maior reflexão: – Ei, você, o que mais importa: sua vida ou a vida social?
Niilismo é uma atitude filosófica pessimista por sempre adotar um ceticismo extremo perante qualquer situação ou realidade possível. Consiste na negação de todos os princípios religiosos, políticos e sociais. O conceito de niilismo teve origem na palavra em latim nihil, significando “nada”.
Nietzsche o descreveu como “a falta de convicção sobre onde se encontra o ser humano após a desvalorização de qualquer crença”. Essa desvalorização acaba por culminar na consciência do absurdo e do nada. O niilismo representa uma atitude crítica em relação às convenções sociais.
Von Mises não é niilista. É sim um radical iluminista, adepto do liberalismo do século XVIII em luta contra o mercantilismo das monarquias absolutistas. Daí a sensação de anacronismo de sua obra.]
“A teoria científica elaborada pela Filosofia Social do Racionalismo e do Liberalismo do século XVIII e pela moderna Economia não recorre a nenhuma interferência miraculosa de poderes sobre-humanos. Toda vez quando o indivíduo substitui a ação isolada pela ação concertada, resulta uma melhora imediata e perceptível de sua situação.
As vantagens advindas da cooperação pacífica e da divisão do trabalho são universais. Beneficiam imediatamente quem assim age e não apenas, futuramente, os seus descendentes.
Aquilo sacrificado pelo indivíduo em favor da sociedade é amplamente compensado por vantagens ainda maiores. Seu sacrifício é apenas temporário e aparente. Renuncia a um ganho menor para poder obter um maior em seguida. Nenhum ser razoável deixa de perceber fato tão evidente.
O que motiva a intensificação da cooperação social – ampliando a divisão de trabalho, fortalecendo a proteção legal e garantindo a paz – é o desejo de todos os interessados em melhorar suas próprias condições de vida.
Ao defender o seu próprio – corretamente compreendido – interesse, o indivíduo contribui para intensificar a cooperação e a convivência pacífica. A sociedade é fruto da ação humana, isto é, do desejo humano de diminuir seu desconforto tanto quanto lhe seja possível.”
[Ludwig von Mises é um militante radical das ideias de Adam Smith. Infelizmente, suas ideias dão margem para a intolerância de seus adeptos com quem professa ideias alheias.]
“O problema essencial de todas essas Filosofias sociais do tipo universalista, coletivista, holística é o seguinte: como identificar a verdadeira lei, o autêntico profeta de Deus e a autoridade legítima?
Pois muitos pretendem terem sido enviados pela Providência e cada um prega um evangelho diferente. Para o crente fiel, não pode haver dúvida. Ele tem plena confiança de haver adotado a única doutrina verdadeira.
Mas é exatamente essa firmeza de convicções que torna os antagonismos irreconciliáveis. Cada grupo está disposto a fazer prevalecer seus próprios princípios.
Como não há argumentação lógica capaz de decidir entre os vários credos dissidentes, não resta outro meio para resolver tais disputas a não ser o conflito armado.
As doutrinas sociais não racionalistas, não utilitaristas e não liberais têm de provocar conflitos armados e guerras civis até um dos adversários ser aniquilado ou subjugado. A história das grandes religiões é um registro de batalhas e guerras como também o é a história das pseudorreligiões modernas como são o socialismo, a estatolatria e o nacionalismo.
A intolerância e a propaganda apoiadas na espada do verdugo ou do carrasco são inerentes a qualquer sistema de ética heterônoma.”
[Ludwig von Mises, no livro “Ação Humana: Um Tratado de Economia”, apresenta desse jeito seu inimigo principal apriorístico. Está intimamente relacionado com o apriorismo, com a doutrina conferindo importância aos conhecimentos, conceitos ou pensamentos “a priori”, independentemente da experiência ou da prática.
Heteronomia significa dependência, submissão, obediência. É um sistema de ética segundo o qual as normas de conduta provêm de fora.
A palavra heteronomia é formada do radical grego “hetero”, significando “diferente”, e “momos”, significando “lei”. Portanto, é a aceitação de normas não impostas por nós, mas reconhecidas como válidas para orientar a nossa consciência. Esta vai discernir o valor moral de nossos atos.
Heteronomia é a condição de submissão de valores e tradições. Pode ser vista como a obediência passiva aos costumes por conformismo ou por temor à reprovação da sociedade ou dos deuses.
Heteronomia é o oposto de autonomia, formada do radical grego “auto”, significando “por si mesmo”. Ela se refere à liberdade e à independência. É a faculdade de se reger por si mesmo, a propriedade pela qual o homem pretende poder escolher as leis regentes de sua conduta.
A autonomia não nega sua influência externa, os condicionamentos e os determinismos, mas recoloca no homem sua capacidade de refletir sobre as limitações lhe impostas e observadas, se elas lhe dão, de fato, a direção a seguir.
Autor de inúmeras obras de filosofia e, em especial, de filosofia política, Cornelius Castoriadis é considerado um filósofo da autonomia. Entre suas inúmeras obras destacam-se: Instituição Imaginária da Sociedade, Encruzilhadas do Labirinto, Socialismo ou Barbárie.
Os adeptos da autonomia criticam o totalitarismo sem cair no individualismo radical das ideias do Ludwig von Mises.]
Sua visão de Estado é maniqueísta. Confira no post a seguir.
Crítica de von Mises à Visão Holística e Metafísica da Sociedade publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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