sábado, 11 de janeiro de 2020

Venezuela: Maldição do Petróleo, Dolarização e Hiperinflação

Em meio à pior crise econômica de sua história, a Venezuela vê a produção de petróleo despencar. O país produzia em média 1,3 milhão de barris diários em 2018. Hoje, vem produzido somente 697 mil de barris/dia, segundo dados da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).

A Venezuela tem as maiores reservas de petróleo do mundo, mas produz hoje menos que Brasil e Colômbia e vem caindo para perto da produção do Equador. Relatório mensal da Opep de dezembro de 2019 informa: a Venezuela passou de uma produção de 1,9 milhão de b/d em 2017 para 1,3 milhão de b/d em 2018. Nos três primeiros trimestres de 2019, a produção média foi de 821,6 mil b/d. Em outubro caiu para 685 mil b/d, e em novembro subiu para 697 mil b/d.

A produção do Brasil, segundo a Agência Nacional de Petróleo, passou de uma média de 2,68 milhões de b/d, em 2018, para 2,9 milhões b/d neste ano.

A Colômbia também aumentou a sua produção, de 864,2 mil b/d em 2018 para 882,6 mil b/d atuais, segundo a Agência Nacional de Hidrocarbonetos colombiana. O Equador, segundo a Opep, produziu em média 519 mil b/d em 2018 e 530 mil b/d neste ano.

Marsílea Gombata (Valor, 07/01/2020) informa: a Venezuela chega em 2020 no seu sétimo ano de recessão, com hiperinflação e um processo de dolarização informal tão avançado a ponto do próprio governo já cogitar adotar a moeda americana.

O país está em recessão desde 2014 e encerrou 2018 com inflação anual de 1.370.000%. A inflação desacelerou, mas continua alta – a taxa mensal foi de 35,8% em novembro e a anual, de 13.475,8%, segundo a estimativa da Assembleia Nacional. Economistas privados falam em inflação mensal de 50% e anual em torno de 20.000%.

Com os venezuelanos perdendo a referência do valor do bolívar soberano, a moeda local, o país vê a dolarização informal avançar. Nas grandes cidades entre 48% e 86% das operações em dinheiro são feitas em dólar.

No fim de novembro, o presidente Nicolás Maduro deu força ao debate ao dizer, pela primeira vez, que “não acha má ideia” dolarizar a economia para acabar com a hiperinflação. Economistas, no entanto, alertam que só a dolarização não é suficiente para conter a espiral inflacionária.

Segundo pesquisa da consultoria Ecoanalítica, 48,5% das transações em Caracas são feitas em dólar. Na cidade de Puerto Ordaz esse total chega a 49%, em Barquisimeto, 59,6%, e em Maracaibo, a segunda maior cidade do país, 86%.

A moeda americana foi usada em 94,7% das compras de eletrodomésticos e itens eletrônicos, e em 84% das aquisições de roupas e calçados. O dólar foi utilizado também em 52,2% das transações para compra de alimentos.

A pesquisa mostra, em média, 53% das operações na Venezuela no fim de 2019 serem feitas em dólar, ante 40,1% em abril.

“Com uma previsão de 3.000% de inflação para 2020 e maior deterioração dos meios de pagamento, não é difícil pensar que a dolarização na Venezuela se tornará mais comum no futuro”, afirma o relatório da consultoria.

Maduro disse, em novembro, um processo formal de dolarização poder ajudar a recuperar a economia. “Não vejo como algo ruim (…) esse processo que chamam de dolarização. Pode servir para recuperar as forças produtivas e o funcionamento da economia”, afirmou. Ele acrescentou, porém, que a Venezuela não abrirá mão do bolívar, apesar de os venezuelanos estarem abandonando cada vez mais a moeda local.

A fala marca mudança de postura de Maduro. Ele há pouco mais de um ano demonizava o dólar, chamando-a de moeda do “império”, e criticava a ideia de dolarizar a economia do país, como proposto por Henri Falcón, seu rival na eleição de 2018.

“É uma mudança de posição importante, já que Maduro admite a dura realidade do país e também a ideia de que a dolarização poderia ser algo bom se feita de maneira ordenada”, diz Henkel García, da consultoria Econométrica.

As sanções americanas são o maior obstáculo, uma vez que a dolarização formal requer um processo coordenado com o país que emite a moeda. “Imagina como seria isso entre Venezuela e EUA hoje….”, diz García.

Diferentemente da dolarização informal em curso, na qual o dólar não é moeda oficial, mas é utilizado em certas operações, dolarizar a economia formalmente significa tirar o bolívar de circulação. “Isso teria a vantagem de solucionar o problema inflacionário quase que imediatamente. Mas não resolveria todos os problemas econômicos do país”, diz Carlos de Sousa, da consultoria Oxford Economics.

A Venezuela teria condições de fazê-lo se utilizar boa parte das reservas internacionais — atualmente em apenas US$ 7,8 bilhões. Mas antes teria de resolver problemas fiscais, incluindo o déficit orçamentário de 14% do PIB.

Países que não resolveram seus problemas fiscais antes de dolarizar a economia, como Equador e El Salvador, viram a dívida pública acelerar, o que limitou o crescimento econômico, diz Sousa. “Na Venezuela, que é alvo de sanções e não tem acesso ao mercado, não há como cobrir o déficit a não ser fazendo importantes cortes do gasto público”, diz. “Mas Maduro não parece disposto a isso.”

Mesmo que a dolarização formal fosse implementada, ela não é garantia de que a inflação se manterá baixa. É preciso que o país tenha superávits orçamentários e de conta corrente para não ter de emitir “quase-moedas” para cobrir gastos, o que acabaria alimentando a inflação, diz Quinn Marwith, da consultoria Capital Economics.

Ele lembra que o Equador manteve uma política fiscal rígida após a transição para o dólar, em 2000, enquanto o Zimbábue decidiu emitir as “quase-moedas” – atreladas ao dólar – para financiar o déficit. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê para 2019 inflação anual de 0,4% para o Equador e de 161,8% para o Zimbábue, que dolarizou sua economia em 2009.

“Se a dolarização for feita como no Equador, a inflação na Venezuela desaceleraria. Mas, enquanto o atual governo estiver no poder, é improvável que essa seja uma opção, pois requer disciplina e orçamento equilibrado. Não parece haver muita vontade política para isso”, conclui Markwith.

Venezuela: Maldição do Petróleo, Dolarização e Hiperinflação publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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