Emma Jacobs (Valor, 25/02/19) escreveu reportagem sobre a crise profissional na meia-idade.
Jane Lockwood teve uma pequena epifania no ano passado. Ela percebeu que sua idade – 54 – afetou sua autoconfiança profissional. “Tendo a ser menos confiante quanto a promoções… Eu me limitei e comecei a pensar que as promoções são apenas para jovens. Sempre pensei em subir na carreira, mas perdi essa aspiração.”
A revelação dessa gerente de operações foi feita durante um check-up de
carreira organizado por seu empregador, a companhia de seguros Aviva. O
evento foi parte de um projeto piloto para 100 funcionários com mais de 45 anos que cobriu três áreas: carreira, bem-estar e finanças. Após o elevado nível de participação, a companhia decidiu que este ano vai ampliá-lo para todos os funcionários com mais de 45 anos.
Programas parecidos, ao lado de inciativas como coaching e períodos sabáticos, podem ajudar os trabalhadores a fazer um balanço e planejar suas carreiras. A maior longevidade e os déficits previdenciários indicam que muitos vão trabalhar por mais tempo e se aposentar mais tarde.
Os trabalhadores na meia-idade se sentem espremidos entre a vida profissional e a vida familiar. Iniciativas voltadas para aqueles que estão na faixa dos 40 e dos 50 podem ajudar a energizar os que se sentem pouco valorizados em uma cultura que privilegia os mais jovens e baratos. Essa atitude foi resumida de maneira memorável na afirmação de Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, de que “os jovens são simplesmente mais espertos”.
Para as empresas, o benefício é a conservação de habilidades importantes e conhecimento. A Aviva, por exemplo, vai monitorar a retenção entre os que têm mais de 45 anos quando o programa for lançado. Jonathan Rauch, autor do livro “The Happiness Curve: Why Life Gets Better After Midlife” (“A curva da felicidade: Por que a vida melhora após a meia- idade”), diz que tradicionalmente a meia-idade é um período negligenciado.
Depois que o psicanalista canadense Elliott Jaques cunhou a expressão “crise da meia-idade” em 1965, ela se transformou em uma piada. Mesmo assim, Rauch afirma que esse período é uma época em que o bem-estar despenca e a ansiedade atinge um pico, de modo que aqueles que se encontram na meia-idade precisam de apoio. É difícil argumentar em favor deles porque as pessoas mais velhas geralmente já têm casa própria e emprego estável – ao contrário dos seus colegas da geração Y.
“A suposição é de que, quando estamos na faixa dos 40, estamos no auge. Assume-se que as pessoas estão mentalmente e fisicamente fortes. Não seria fácil dizer a um patrão que esse é um momento difícil”, diz Rauch. Além do mais, continua ele, aqueles que estão na faixa intermediária dos 40 têm uma concepção errada de que sua carreira está no auge, e que “depois é só ladeira abaixo. Parece que se depois dos 50 você não dominou alguma coisa, não vai dominar mais nada. Isso exacerba a espiral de queda”.
Alistair McQueen, diretor de poupança e aposentadoria da Aviva, concorda. “Há uma regra não escrita que depois dos 50 sua carreira para. Percebemos que precisamos ajudar essas pessoas e mantê-las ativas”. A Aviva foi uma de quatro empresas a realizar um check-up de carreira, junto com a Mercer, Legal & General e o Pension Advisory Service.
As iniciativas foram uma recomendação do relatório Cridland da previdência pública britânica, publicado em 2017. Antes disso, entre 2013 e 2015, o National Institute of Adult Continuing Education promoveu uma análise com pessoas empregadas e desempregadas com mais de 50 anos. Ela ajudou a melhorar a confiança dos participantes, a identificar necessidades futuras de treinamento e a planejar o desenvolvimento de carreiras.
O governo do Reino Unido deverá fazer um anúncio sobre políticas para a meia-idade neste mês. Mesmo assim, nenhuma iniciativa ajudará os empregados se eles se sentirem discriminados por causa da idade. Nos EUA, uma pesquisa feita pelo grupo ativista AARP constatou que 61% das pessoas com mais de 45 anos já foram discriminadas ou viram isso acontecer.
O “Centre for Ageing Better” do Reino Unido pesquisou a discriminação por idade no local de trabalho no ano passado e constatou que muitas das pessoas com mais de 50 anos perderam a vontade de procurar emprego por acreditarem que eles estão destinados aos jovens. Quase um terço dos participantes acreditam que sua idade foi o motivo de eles já terem sido rejeitados na busca por emprego. Pouco menos de um quarto (24%) não se sentem capazes de conversar com seus gerentes sobre planos de carreira e um quinto também acha que os planos de aposentadoria estão fora de seu alcance.
Quase um terço dos participantes (32%) disseram que têm hoje menos treinamento e oportunidades do que no passado. A Aviva diz que o programa de check-up de carreira não viola regras de discriminação etária, que exigem que todos sejam tratados igualmente – ele não recusaria jovens.
Patrick Thomson, gerente sênior de programas do “Centre for Ageing Better”, diz que a ideia de que os mais velhos “bloqueiam” cargos mais altos é um mito. “Não é obstrução de emprego a menos que você tenha uma contagem fixa de pessoas”. Por causa das leis contra a discriminação, “as pessoas se sentem pouco confortáveis em falar sobre a idade”, diz Anne Wilmot, diretora de idade no trabalho da “Business in the Community”. “Um check-up de meia-idade é um bom veículo para se falar sobre os planos futuros dos funcionários”.
Há muita coisa que os patrões deveriam fazer para ajustar atitudes em relação à idade, afirma Rauch. “Parem de ver os mais velhos como menos produtivos. Eles tornam os trabalhadores ao redor mais produtivos ao ajudá-los a enfrentar problemas sociais.”
Thomson acredita que o “engajamento de meia-idade melhora o bem-estar da equipe. A razão de empregadores não perceberem isso é que é difícil justificar a motivação comercial. Mas isso pode desaparecer se você compará-lo ao custo de anunciar ofertas de emprego, treinar e assimilar funcionários”.
McQuenn diz que a Aviva aprendeu rapidamente que a comunicação é crucial. “Preparamos comunicados à imprensa que visavam trabalhadores mais velhos e fomos informados que ninguém quer ser visto como velho. Não usamos ‘mais velho’. Não usamos ‘aposentadoria’. Esse é um programa anti-aposentadoria. Não se trata de tirar pessoas do mercado de trabalho, e sim de mantê-las nele.”
Jonathan Collie, cofundador da Age of No Retirement, um empreendimento social, diz que um check-up de meio de carreira acontece tarde demais. Os gestores precisam ser melhores nas análises de desempenho, ajudando as pessoas de todas as idades a planejarem seus próximos anos. “É tentar resolver um problema que deveríamos ter resolvido antes”, diz.
Para Jane Lockwood, da Aviva, as sessões foram um empurrão bem-vindo. Ela o descreve como um “despertar” da ambição. Desde então, ela conversou com o chefe sobre a possibilidade de uma transferência temporária. Sua colega Karen Ward concorda. Mesmo em uma companhia de serviços financeiros, o programa lembrou que eles podem estender suas vidas profissionais para reforçar a poupança para a aposentadoria. Em seu próprio caso, o processo confirmou sua aspiração de trabalhar por mais anos- e buscar novas funções. “A cultura está mudando”, diz ela. “Não tem problema trabalhar por mais tempo.”
Crise Profissional na Meia-idade publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário