domingo, 28 de julho de 2019

Hiato do Produto: Aumento da Capacidade Ociosa

Arícia Martins (Valor, 18/07/19) informa: a freada na recuperação da atividade elevou ainda mais a capacidade ociosa existente na economia no primeiro trimestre, principalmente na indústria. Em uma estimativa inédita, o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) calculou o hiato do produto, que mede a diferença entre o crescimento efetivo e o potencial, para os setores econômicos. De acordo com esse indicador, o setor industrial é o que opera com maior ociosidade no momento. O Ibre é a única instituição que tem estimativas para a série do hiato desde 1980.

Segundo os pesquisadores Claudio Considera, Elisa Carvalho de Andrade e Juliana Carvalho da Cunha Trece, o PIB efetivo se distanciou ainda mais do potencial: a diferença entre eles aumentou de 3,7% no quarto trimestre de 2018 para 4,7% nos primeiros três meses deste ano. O cálculo é uma média dos seis métodos estatísticos mais usados pelos economistas para estimar o hiato do produto.

A correlação desta média com o hiato do produto extraído pela função de produção é de 86%. Nessa métrica bastante utilizada, se mostra um hiato negativo de 5,6% pelos números do Ibre. Chega-se ao crescimento potencial da economia somando todos os fatores de produção:

  1. a produtividade total dos fatores,
  2. o estoque de capital físico e
  3. o capital humano (trabalho).

Essa medida tem um sentido econômico, as outras são pura e simplesmente estatística.

O cálculo está em linha com oito estimativas do hiato do produto compiladas pelo economista Ricardo Barboza, do grupo de conjuntura econômica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A média dos oito dados, que inclui o do próprio Ibre e os de Ipea, Instituto Fiscal Independente (IFI) e LCA Consultores, entre outras instituições, mostra que a economia brasileira operou 5,5% abaixo do PIB potencial no primeiro trimestre.

Para chegar à capacidade ociosa de cada atividade econômica, porém, o único caminho possível com os dados divulgados até o momento pelo IBGE é o dos métodos estatísticos. Nessa ótica, o ramo com mais ociosidade no momento é a indústria. Na passagem do último trimestre do ano passado para o primeiro deste ano, o hiato do setor passou de 5,9% para 6,7%, dado mais negativo desde o terceiro trimestre de 1992.

Há uma série de razões para a enorme capacidade ociosa na indústria e também na economia brasileira. Como pano de fundo estrutural, a crítica ideológica aponta a má alocação de recursos na última década reduziu a produtividade e dificultou o crescimento. Já no período mais recente, o consumo das famílias e os investimentos não estão avançando, e as exportações não têm peso suficiente para liderar a retomada. Assim, todos os setores operam com folga: até os serviços, cujo hiato ficou negativo em 3,5% de janeiro a março.

Todos os ‘drivers’ de crescimento estão parados. A construção é o maior exemplo. Setor que liderou o aquecimento econômico de 2010 em diante, antes da crise, a construção civil acumulou tombo de 30% em seu PIB entre 2014 e 2018 e está longe de recuperar o patamar pré-recessão. Não por acaso, esse segmento operava 10,3% abaixo de seu crescimento potencial no primeiro trimestre, nos cálculos do Ibre-FGV, maior nível de capacidade instalada desocupada entre os setores industriais.

Na indústria de transformação, a situação não é muito melhor. O hiato do produto do setor subiu ligeiramente entre o último trimestre de 2018 e o primeiro de 2019, de 7,5% para 7,8%, evolução de acordo com os dados de capacidade instalada, também medidos pela FGV.

Segundo a Sondagem da Indústria de Transformação, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) do setor recuou a 75% em junho, 0,3 ponto percentual abaixo de maio. Para o pesquisador do Ibre, a atividade industrial não está em recessão, mas tem mostrado desempenho aquém do esperado, o que, em sua avaliação, é mais explicado pelo problema de longa data de baixa produtividade em vez de fatores pontuais.

Como exemplo, ele menciona a recessão na Argentina, um dos principais parceiros comerciais brasileiros, que tem diminuído a importação de automóveis do Brasil. A demanda de automóveis da Argentina é grande, mas não é algo tão importante quando comparada ao mercado doméstico.

Já a má alocação de capital tem peso preponderante na elevada capacidade ociosa da economia brasileira hoje. Também nos cálculos do Ibre, a produtividade total dos fatores deu contribuição negativa à expansão do PIB entre 2011 e 2019, de -0,2 ponto.

Esse desempenho é alarmante porque evidencia a insustentabilidade do crescimento, dado as economias ricas terem um crescimento sustentável baseado no aumento da produtividade, não somente na acumulação de fatores de produção.

Segundo Considera, “foram feitos investimentos errados em lugares errados”. Ele menciona como principais exemplos a construção naval para apoiar a indústria do petróleo e também investimentos em refinarias, além da política de subsídios a compra de caminhões feita pelo BNDES. “Agora há um excesso de oferta de transportes de carga e a demanda cai. Por isso tivemos a greve dos caminhoneiros.” Oh, tanta burrice… Economista ortodoxo só vê o lado da oferta e não a carência da demanda efetiva.

Hiato do Produto: Aumento da Capacidade Ociosa publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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