sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Gestão do Patrimônio por Agentes Autônomos


O volume financeiro acumulado pelos 118 mil ricaços do Private Banking cresceu já 10,71% nos sete primeiros meses do governo neoliberal em Economia e neofascista em Política. Mas não existe só R$ 1,2 trilhão em riqueza financeira possuída pelos ricaços brasileiros. Há 14,3% a mais fora desse segmento de clientes bancários.

Adriana Cotias (Valor, 06/09/19) informa: o segmento de gestão de patrimônio, englobando a administração de carteiras e de fundos restritos fora do canal bancário tradicional, chegou a junho com R$ 170,7 bilhões, distribuídos em pouco mais de 9 mil grupos econômicos face a 57 mil grupos familiares no Private Banking.

Houve um crescimento de 15,3% no volume financeiro em relação a dezembro e de 7,5% no número de famílias atendidas por “single” ou multi-family office, estruturas dedicadas à assessoria financeira e patrimonial independente — não vinculada a nenhuma instituição financeira.

Os dados, atualizados pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), representante do mercado de capitais e de investimentos, agora trazem uma fotografia mais completa do setor. Neste ano o novo código de administração de recursos de terceiros da entidade passou a exigir o reporte obrigatório das casas aderentes às regras e atuantes na gestão de patrimônio. Ao todo, 69 empresas abriram os seus números, em comparação a 27 participantes até o fim de 2018.

Não há um valor de corte. Este depende da política comercial de cada escritório, mas na média o tíquete era de R$ 18,8 milhões ao fim de junho. Houve incremento do número de grupos econômicos, ou seja, mais famílias estão migrando dos serviços prestados pelos bancos para as casas independentes.

“Com os juros baixos, cada vez mais os investidores procuram algum tipo de assessoria para buscar alternativas ao CDI. Isso acaba atraindo as pessoas que olham um pouco mais para esse tipo de serviço”, afirma. As estatísticas não contemplam a captação, apenas o estoque, mas a expansão veio muito mais da troca de canais do que de eventos tradicionais de liquidez, como ofertas secundárias de ações, fusões e aquisições ou distribuição de dividendos. Os gestores de patrimônio têm um trabalho mais personalizado e acabam sendo uma alternativa.

Pelo mapeamento, ativos de renda fixa respondem pela maior parte do bolo de recursos sob gestão, com uma participação de 47,8%, e reuniam R$ 81,6 bilhões ao fim do primeiro semestre, com uma alta de 16,4% em relação a dezembro. Mas o instrumento que mais cresceu nesse período foram os fundos estruturados (26,2%), a R$ 11,6 bilhões, compondo 6,8% do conjunto, ante 6,2% no fim de 2018. Nessa classe entram, por exemplo, cotas de fundos de participações em empresas e de fundos imobiliários.

Essa é uma tendência. Quando se fala cada vez mais no CDI a 6%, o investidor busca ativos de maior risco, como renda variável, fundos imobiliários, estruturados e debêntures incentivadas.

A alocação em renda variável aumentou 17,9% e já há R$ 34,4 bilhões aplicados na categoria, seja via fundos de ações ou aplicações diretas na bolsa. Na comparação com dezembro, essa parcela subiu de 19,7% para 20,2%, enquanto os multimercados perderam fatia, de 24% para 23%, mas ainda cresceram 10,6% nos primeiros seis meses do ano, para um total de R$ 39,2 bilhões. Os recursos aplicados em produtos de previdência aumentaram 13,5%, para R$ 2,9 bilhões.

Quando se olha a variação do volume por produto, as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) recuaram 30,2% desde dezembro, a R$ 4,8 bilhões. Tal decréscimo se deve à falta de lastro para novas emissões porque esse é um título ainda demandado pelo investidor pessoa física, pelo apelo da isenção fiscal.

As debêntures, por sua vez, cresceram 19,2%, e alcançaram um estoque de R$ 7,2 bilhões ao fim do primeiro semestre.

E mesmo em meio a uma Selic de 6% ao ano, a mais baixa da história, os títulos públicos ainda estão entre as preferências dos investidores. Nessa classe houve um crescimento de 27,2%, para R$ 17,6 bilhões.

Pelo mapa da Anbima, a região Sudeste concentra a riqueza das famílias atendidas pelos escritórios de gestão independente, com R$ 144,8 bilhões, seguida pelo Sul, com R$ 16,6 bilhões. Norte e Nordeste responderam pelo maior crescimento em relação a dezembro, com taxas de 31,3% e 29,2%, mas com volumes bem mais modestos, de R$ 700 milhões e R$ 5,8 bilhões, respectivamente.

Uma das chamadas “jabuticabas brasileiras”, o retorno de papéis atrelados a um percentual do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), está sendo abandonado por quem não se atenta à segurança e opta por maior retorno. Comprar um título com essa remuneração, em um cenário de juros básicos em trajetória de queda, significa ganhar cada vez menos mantendo esse papel. Matematicamente, se o juro cai, o resultado nominal do percentual incidente sobre ele também vai ficar mais baixo.

Nos últimos meses, ao perceber isso, a pessoa física vem saindo do percentual
do CDI e migrando para títulos com remuneração CDI mais uma taxa prefixada. Com a queda do juro, como esse “spread” se mantém fixo, a remuneração final tende a cair menos. A venda desses papéis no secundário primeiro aumentou, depois as negociações minguaram e isso tem interferido no retorno de fundos, que fazem a marcação dos títulos a mercado.

O Idex, índice criado pela gestora de recursos JGP para acompanhar o comportamento da renda fixa, registrou em agosto rentabilidade de 95,83% do CDI (retorno nominal de 0,48%). Pela primeira vez, desde novembro de 2017, essa rentabilidade ficou abaixo de 100% do CDI. Em 2019, o Idex acumula 114,18% do CDI (retorno nominal de 4,80%).

Esse desempenho de agosto não reflete nenhum problema em uma empresa ou emissão específica, mas sim um movimento técnico: o investidor está enxergando o percentual do CDI deixando de ter sentido com o juro em queda e migrando para o CDI mais um percentual fixo. Essa movimentação influenciou o índice, mas esse ajuste parece perder força este mês, o que sugere maior estabilidade para os papéis em setembro.

A fuga do percentual do CDI também fica nítida no número de papéis do Idex, que reúne debêntures a percentual do CDI e aquelas que pagam CDI mais uma taxa. Até junho, o indicador contava com 106 títulos. Em julho, o portfólio diminuiu para 85 e, em agosto, para 75. A maioria dos papéis que deixou o indicador era atrelado a percentual do CDI, assim como cinco das piores performances do índice tinha esse tipo de retorno. Um critério principal do Idex é a liquidez: só ficam na carteira debêntures que, em um período de dois meses, receberam ordens de compra e de venda em 70% dos dias.

Essa opção de papéis pagando um percentual do CDI é uma espécie de seguro contra crises. Surgiu nos períodos mais turbulentos na economia brasileira, quando, de uma hora para outra, os juros poderiam ser consideravelmente elevados pelo Banco Central (BC).

Na lógica do percentual do CDI, se o juro sobe, o investidor não só ganha mais com essa alta por o resultado do percentual incidente sobre ele ficar maior. Se o juro cai, o resultado nominal do percentual também será menor.

Essa tradição se mostra muito eficaz em cenário quando se espera alta dos juros, por exemplo, dado o atual choque cambial se transformará em choque inflacionário e, mais adiante, choque de juros. Se eles caem, como tem acontecido, valerá mais à pena para o investidor ter papéis que paguem CDI mais um percentual fixo. O paradoxo é que a lógica nasceu de um desejo de se proteger de volatilidades fortes, o que não é exatamente característica da renda fixa.

Na virada do ano, a curva de juros no Brasil estava inclinada, apontando que o mercado esperava alta das taxas. No entanto, las medidas do governo apontavam para um cenário onde uma queda dos juros não poderia ser descartada. O que aconteceu foi que a economia não cresceu conforme o esperado e os juros, de fato, caíram, na contramão da aposta de O Mercado, este ser sobrenatural, porquanto onipresente e onipotente, porém falho em onisciência.

Dados da Anbima mostram: de janeiro a julho deste ano, as emissões de debêntures atreladas ao percentual do CDI ficaram em 34,4% do total, ante 52,5% de igual período de 2018. Agora, os papéis remuneradores do CDI mais uma taxa são a maioria, com 59,2%.

Apesar desse movimento, ainda está distante o dia quando o percentual do CDI deixará de ser um “benchmark” no mercado brasileiro. Essas emissões podem continuar saindo, desde que esse percentual esteja correto em relação ao risco e retorno do papel. Se quando a curva de juro apontava para 7,5% as operações saíam a 110% do CDI, não é aceitável quando o juro cair para 6% e esse percentual se manter em 110% — ele teria de subir. Se se chegar a um percentual capaz de garantir prêmio sobre o ativo livre de risco, haverá demanda pela operação.

O cenário visto no início do ano, de empresas lançando debêntures pagando muito pouco prêmio, ficou para trás. Nos últimos meses, houve fechamento de taxa e demanda de investidores muito maior do que a oferta de papéis. Talvez essa movimentação de agora evidencie O Mercado ter andado pouco diligente, aceitando taxas baixas demais e agora está corrigindo isso. Esse é um mercado ainda recente por aqui e daí os agentes fazem a louvação ilusória: “os investidores estão cada vez mais profissionais, bem equipados e diligentes”. Ah, é?!

Gestão do Patrimônio por Agentes Autônomos publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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