sábado, 28 de setembro de 2019

Barões-Ladrões nos Estados Unidos (1870-1890)

Charles R. Geisset, em seu livro Wall Street: A History from its beginnings to the fall of ENRON –, publicado pela Oxford University Press em 1997 (e reeditado em 2004), narra: após a Guerra Civil, a economia americana começou a se expandir novamente, mais dramaticamente em relação ao crescimento anterior. A população cresceu, auxiliada por um influxo de europeus imigrantes, fornecendo mão de obra nova para as novas indústrias em todo o país.

O tamanho real do país triplicou desde independência, com novo território sendo adicionado através da expansão e conquista. A expansão da ferrovia começou novamente após o hiato ocorrido durante a guerra, com mais milhas adicionadas às estradas existentes a cada ano. O primeiro transatlântico cabo de telégrafo foi instalado em 1866, e a primeira ferrovia transcontinental foi inaugurado oficialmente em 1869, apesar das revelações e clamor após o caso do Credit Mobilier depois de 1867. Todas as promessas oferecidas a seus investidores europeus pelos Estados Unidos haviam aparentemente sido cumpridas e novas chegadas de imigrantes começaram alcançar maior fruição em relação a qualquer outro momento da história americana.

Acompanhar essa promessa do Novo Mundo foi a atração constante de grandes riquezas. As grandes fortunas americanas foram estabelecidas durante essa época quando se encorajou riqueza extravagante e se forneceu poucas barreiras à sua acumulação.

Os exemplos anteriores de John Jacob Astor e outros levaram muitos homens ambiciosos, muitos sem educação formal sequer para falar em público, alcançar notoriedade e fama. Isso seria inconcebível na Europa elitista. Dentro de uma geração, mesmo o mais grosseiro desses primeiros industriais, como Drew ou Vanderbilt, seria considerado parte integrante do tecido social. Ironicamente, no entanto, muitos daqueles capazes realmente de acumularem as vastas fortunas eram considerados párias sociais em seu próprio tempo.

Os investidores estrangeiros familiares também retornaram após a guerra, mas foram temporariamente desviados pelo pânico de 1873, quando Jay Cooke and Company fechou suas portas. Os investimentos britânicos novamente começaram a aumentar de forma constante. O investimento favorito em sua esmagadora maioria dos investidores britânicos eram títulos do Tesouro, estimados terem contabilizado mais de dois terços de todo o investimento estrangeiro em 1870.

No setor de negócios privados, as ações ferroviárias continuaram como os favoritos. Quase todo o estoque e a maioria dos títulos da Atlantic and Great Western Railroad eram de propriedade de estrangeiros. As ferrovias provaram ser altamente resistentes às escolhas, apesar do tratamento hostil realizado por alguns operadores americanos contra os britânicos no passado.

Embora as indústrias de manufatura e transporte estarem crescendo rapidamente, os investidores estrangeiros continuavam dedicados à ferrovias. Grande parte desse interesse estava longe de ser cega. As ferrovias estavam entre as poucas indústrias americanas capazes de oferecerem garantias patrimoniais por trás de seus títulos obrigações. Seu capital circulante forneceu algum valor real para os investidores.

Isso foi especialmente importante nos anos imediatamente após a guerra porque os Estados Unidos suspenderam pagamentos em espécie (ouro/prata) em favor de dólares (papel-moeda) durante a guerra. As ferrovias tinham melhor suporte de capital face à maioria das obrigações das indústrias e, aos olhos de alguns, também em relação ao governo dos EUA.

Este fato não foi desconsiderado por muitos dos industriais e especuladores dominadores do cenário econômico antes e depois da Guerra Civil. Ferrovias provaram ser o seu “campo de caça” pessoal. Capturaram muitas grandes fortunas antes do início da guerra. Negociação das ações da Erie and the Harlem Railroads haviam tornado as duas linhas mais atraente em 1865. Elas permaneceriam assim pelas próximas décadas.

Os desenvolvimentos no transporte ferroviário não foram feitos sem um extraordinário custo. A abertura da ferrovia transcontinental foi aclamada como um grande feito de engenharia, cheio de promessas para o país como um todo. Na realidade, ocorreu sob suspeita de saquear o Tesouro por conta de corrupção que rapidamente emergiu como o maior escândalo da história americana até então. Astutos oportunistas aproveitaram o desejo de ligar o país por via férrea ao tumulto causado pela Guerra Civil para avançar seus próprios bolsos às custas do governo.

Muitos investidores já tinham voltaram sua atenção para as ferrovias do Oeste, mas as principais estradas no Leste, especialmente dentro e ao redor de Nova York, continuaram sendo alvos favoritos até o pânico de 1873. Nos vinte anos anteriores, a municipalidade de Nova York e demais municípios em torno despejaram mais de US$ 40 milhões em subsídios às ferrovias da mesma maneira que muitos estados haviam feito pela turnpikes [estradas com pedágios] e canais fluviais para gerações anteriores, classificando-as entre os investimentos mais atraentes do país.

Mas muitas das novas estradas eram principalmente curtas linhas ferroviárias. Elas não se conectavam, permanecendo apenas linhas- tronco sem ambições maiores do que conectar duas cidades não muito distantes entre si. Depois de construídas, suas inutilidades como peças potenciais em um jogo maior de consolidação do xadrez nacional tornaram-se aparente para alguns industriais iniciantes.

A febre especulativa permaneceu forte por um bom motivo. O dinheiro e a economia haviam mudado, com uma grande quantidade de riqueza no Sul destruída e o papel-moeda sem suporte metálico tendo dominado o Norte. Os pagamentos lastreados em espécie (ouro/prata) foram finalmente retomados em 1879, quatro anos após o Congresso ter aprovado a Lei de Retomada de Espécies [Specie Resumption Act]: limitava a quantidade de dólares em circulação para 30%. Quando a retomada começou, os dólares passaram a valer seu valor nominal em ouro. Mas o intervalo entre o fim do a guerra e a depressão em seguida ao pânico de 1873 foi inquietante.

O jogo e o investimento tornaram-se mais populares face ao passado, especialmente à luz da opinião de o dinheiro estar menos valioso. Quase todos os ganhos de capital obtidos por investimentos realizados na bolsa de valores eram livres de impostos, apesar dos impostos de renda terem sido adotados durante a guerra. Declaração de renda não era uma alta prioridade entre os ricos. A atmosfera do mercado era ainda livre de qualquer influência significativa do governo.

Em 1868, a população era de trinta e oito milhões. Essa quantidade de habitantes dobraria até o final do século. Desse total, apenas um quarto de um milhão de declarações fiscais foram arquivadas. Em 1870, um total de 9.500 DIRPF foram registradas realmente admitindo renda anual de cinco mil dólares ou mais.

Embora fossem números consideráveis ​​para a época, eles empalideceram os fiscalistas em comparação com as quantias supostamente acumuladas pelos maiores ganhadores. A evasão fiscal tornou-se tão endêmica a ponto de o imposto de renda temporário ter sido abandonado em 1872 quando o governo precisava desesperadamente de fundos.

A população americana não sentia particular compaixão com os necessitados de políticas públicas a ponto de aceitar pagar impostos. Isso ocorreu de cada vez quando grandes lucros estavam sendo feitos nas bolsas de valores. Investidores estrangeiros e operadores capazes de os realizar foram aclamados pela imprensa como os investidores mais experientes. Aparentemente, o Tesouro não conseguiu converter o que foi encontrado como sinais exteriores de riqueza em os jornais em receita para si. Como no passado, o governo ainda estava brincando com a indústria e Wall Street. Tinha um longo caminho a percorrer antes de ficar à vista do setor privado em geral.

A febre especulativa não discriminou ninguém. Até membros do Congresso tornaram-se envolvidos nas “ações quentes” do dia. Um corretor lembrou como um jovem congressista chamado William McKinley veio ao seu escritório e afirmou: “Quero comprar 50 ações da Erie. Disseram-me um dia ainda ela valerá muito mais dinheiro. Aqui estão US$ 500, e se você quiser mais a qualquer momento, deixe-me saber. Enquanto isso, não me incomode telefonando. Não prestarei atenção suas flutuações. O corretor concordou em não importunar o cliente nervoso. Mas dentro de dez minutos, depois de sair do escritório, o futuro presidente estava ao telefone, perguntando: “Como está Erie agora?”

Barões-Ladrões nos Estados Unidos (1870-1890) publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



Nenhum comentário:

Postar um comentário