domingo, 5 de julho de 2020

Aversão Bancária ao Risco de Refinanciamento com Recursos de Terceiros

Ana Paula Ragazzi (Valor, 19/06/2020) informa: a crise do coronavírus deverá elevar em pelo menos três vezes a taxa de defaults corporativos na América Latina. A previsão é da agência de avaliação de risco Moody’s. Ela espera esse indicador sair de 2,2% no acumulado de 12 meses até maio para um intervalo entre 6,8% e 10,2% no final de 2020.

Dois terços dos emissores acompanhados pela Moody’s na região estão sediados na Argentina, no Brasil e no México, países que geralmente concentram a maior parte desses eventos na região. Mas a Moody’s, nesta crise, também espera que o estresse corporativo aumente em outros países, incluindo Chile, Colômbia e Panamá.

Especificamente sobre o Brasil, a Moody’s aponta: o risco de liquidez para empresas não financeiras tende a continuar “baixo ou estável” até 2021, ressaltando que agora elas dependem mais do acesso a crédito e das relações bancárias do que dos fundamentos ou da capacidade de geração de caixa.

A maioria da empresas da amostra da Moody’s acessou linhas de crédito já comprometidas ou emitiu dívida para reforçar o caixa. Uma vez que a maioria dos setores apresentará resultados operacionais mais baixos, manter liquidez robusta será essencial para evitar risco de refinanciamento.

A agência chama a atenção para o setor elétrico. Ele reúne “empresas que enfrentam risco de liquidez elevado à medida que a pandemia atinge o consumo e enfraquece a atividade econômica”. As companhias de distribuição vão arcar com o peso da redução de demanda e do aumento de inadimplência, mas a expectativa é que o fluxo de caixa melhore gradualmente com a redução do distanciamento social e medidas regulatórias para mitigar as elevadas necessidades de financiamento.

Para as concessionárias de rodovias pedagiadas, a agência espera liquidez adequada para suportar o cenário-base de queda de 15% no tráfego para 2020.

A Lucror Analytics, especializada no acompanhamento de títulos de dívida “high yield”, acredita, hoje, a possibilidade de uma onda de defaults relevante em empresas brasileiras nesta crise ser baixa, se comparado ao índice global. As companhias estão mais bem preparadas. Até o momento só houve o episódio envolvendo a Latam, mas não no Brasil. A tendência é de recuperação, e as empresas que acompanhamos têm acesso a financiamento, mesmo que mais caros. A análise não contempla uma eventual “segunda onda” da covid-19.

As empresas avaliadas por essas agências são, em geral, de grande porte, com acesso ao mercado de capitais, e portanto tendem a ser as sobreviventes das crises. A Moody’s, em relatório, destaca a expectativa de aumento do número de pedidos de recuperação judicial de empresas no Brasil, que já vinha de anos em que esse pedidos bateram recordes. Mas avalia que eles serão concentrados em pequenas e médias empresas do varejo e serviços.

A Lucror surgiu em 2010 e, há três anos, criou um braço para cobertura desses títulos também na América Latina. A empresa acompanha 97 companhias na região, com um time sênior de quatro analistas. E oferece um tipo de análise que mescla um trabalho semelhante ao de uma agência de rating, mas também com recomendações, de compra, venda e manutenção de papéis.

Em relatório divulgado ontem sobre as varejistas brasileiras, a Fitch Ratings afirmou que o risco de refinanciamento da dívida de curto prazo da maior parte das empresas que acompanha é “gerenciável”. Em abril de 2020, 9 das 12 companhias classificadas apresentavam índice de cobertura de dívidas com vencimento até dezembro com recursos do caixa superior a 1 vez. Para a agência, a capacidade de geração de caixa e os níveis de alavancagem esperados para 2021 serão determinantes para os ratings.

Estevão Taiar (Valor, 19/06/2020) informa: as repactuações de empréstimos somaram R$ 614,5 bilhões entre 13 de março e 5 de junho, o equivalente a 17% da carteira do Sistema Financeiro Nacional (SFN), afirmou o diretor de política monetária do Banco Central (BC), Bruno Serra Fernandes. “É um número bastante relevante”, disse em live do Tribunal de Contas da União.

Em março, o Conselho Monetário Nacional suspendeu por seis meses a necessidade de provisões dos bancos em duas situações de renegociação de empréstimos: se considerassem que o cliente não tinha mais condições de pagar ou se concedessem descontos por causa da fragilidade da capacidade de pagamento ou de garantias.

De acordo com o diretor do BC, as repactuações ficaram “muito concentradas” nas pequenas e médias empresas. “Provavelmente os bancos entenderam as dificuldades delas” e aceitaram a rolagem da dívida, disse. Também tiveram bons resultados as operações com pessoas físicas e imobiliárias.

Ainda assim, a maior parte dos novos empréstimos contratados ficou com as grandes empresas. Dados do BC mostram que as operações com recursos livres somam R$ 527,9 bilhões no caso das maiores companhias e R$ 467,5 bilhões no caso das pequenas e médias.

Na live, o secretário de política econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, afirmou: o governo federal implantará novas medidas de crédito para micro, pequenas e médias caso as atuais não sejam bem sucedidas. O Programa Emergencial de Suporte ao Emprego (Pese), linha emergencial para a folha salarial de pequenas e médias empresas, já vem passando por alterações, por exemplo.

De acordo com Sachsida, o Pese, o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), e a linha com cobertura do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) colocarão mais de R$ 75 bilhões no mercado.

No caso da Caixa Econômica Federal, os empréstimos do Pronampe somaram R$ 160 milhões no primeiro dia de funcionamento da linha, com mais de três mil contratos. “O lançamento [da linha] já gerou um volume muito significativo de operações”, afirmou o presidente da instituição financeira, Pedro Guimarães. O valor médio dos empréstimos ficou em R$ 51 mil.

Desde 16 de março, a Caixa emprestou R$ 7,8 bilhões para micro e pequenas empresas. Dessa quantia, R$ 1,4 bilhão veio da linha em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e R$ 6,1 bilhões de outras linhas direcionadas para essas companhias.

O relator da medida provisória (MP) 975, criando o “Programa Emergencial de Acesso a Crédito”, estabelecerá em seu parecer que as empresas terão cinco anos para quitarem os empréstimos e carência de ao menos seis meses para começarem os pagamentos. As linhas gerais do texto já foram apresentadas à equipe econômica e, segundo uma fonte, o governo não vai se opor à proposta do deputado.

Para ele, um dos motivos da MP anterior para liberação de crédito as empresas (944) não ter dado certo foi que, em alguns casos, o prazo para quitar o empréstimo era de um ou dois anos. “Está havendo reclamação de que as linhas de crédito são de no máximo um ano, as vezes três anos. Tem que ter tempo para diluir, a retomada não será tão rápida”, disse.

Os recursos da MP 944, que seriam utilizados para financiar a folha de pagamento das empresas, ficaram empoçados e o próprio governo resolveu reformular o programa. A nova MP, na visão do relator, corrige um erro que era o governo não garantir 100% do empréstimo – o novo modelo dá uma garantia global de até 30% para o conjunto dos financiamentos.

O parlamentar ainda estabelecerá um valor máximo para a taxa de juros cobrada pelos bancos. O percentual exato ainda não está definido e está em negociação com as instituições financeiras e o governo. “Será uma taxa equilibrada, para dar condição do empreendedor pagar, mas também seja atrativa para os bancos participarem do programa”, disse.

A MP previu uma taxa máxima de remuneração apenas para o Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que será de 1% ao ano, mas os juros cobrados pelos bancos ficaram para uma regulamentação posterior do Ministério da Economia. Efraim quer o valor determinado na lei.

A oposição pressiona para que a MP 975 repita uma regra prevista em outras MPs durante a pandemia e condicione a ajuda à manutenção dos empregos. “Quem quiser isso tem a opção de aderir à MP anterior [944]. A manutenção do emprego não será a causa do empréstimo, será a consequência. Uma empresa que sobrevive vai manter seus empregados. Uma que fecha vai demiti-los”, disse.

Esse projeto visa oferecer crédito a médias e pequenas empresas, com receita bruta anual de R$ 360 mil a R$ 300 milhões. O governo aportará até R$ 20 bilhões no FGI, que cobrirá parte das perdas dos bancos – 20% da carteira estará garantida pelo programa. As pequenas terão outra linha, oferecida no Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), com cobertura de 85% da carteira de empréstimos.

Na área econômica, acredita-se: serão necessários mais 30 dias, aproximadamente, até que os regulamentos do FGI sejam adaptados para exercer essa nova função.

Aversão Bancária ao Risco de Refinanciamento com Recursos de Terceiros publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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