quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Fuga de Capital do Mercado Secundário de Ações: Hora de Vender

Marcelle Gutierrez, Lucas Hirata e Ana Carolina Neira (Valor, 03/02/2020) informam: a saída de capital externo da bolsa de valores ganhou força nas primeiras semanas de 2020. Mesmo depois de um 2019 já marcado por saques recordes, o investidor estrangeiro intensificou a venda de ações, ainda pautado pelo ceticismo com o crescimento da economia brasileira. O movimento acaba se agravando com ondas de aversão ao risco lá fora, a exemplo do que aconteceu recentemente com o surto de coronavírus.

Em janeiro, até o dia 29, o investidor estrangeiro retirou R$ 16,1 bilhões do mercado local – marca inédita para o mês em toda a série histórica iniciada em 2006. Até aqui, a maior retirada para o período aconteceu em 2008, quando saíram R$ 4,7 bilhões da bolsa brasileira.

As vendas de ações estão concentradas no mercado secundário, ou seja, de ativos já em circulação. Isto é apresentado como um indício, para parte do mercado vendedor de ilusões, da possibilidade de o estrangeiro pode estar acumulando caixa para aumentar sua participação em futuras ofertas primárias. Só para esse ano, são esperados até R$ 200 bilhões em IPOs e “follow- ons” (ofertas subsequentes) no Brasil.

Seja como for, esse fluxo deficitário tem contribuído para reduzir, gradualmente, a participação dos estrangeiros na bolsa brasileira, enquanto o investidor local ganha protagonismo nos negócios.

Em 2019, a posição dos não-residentes saiu de R$ 828 bilhões para R$ 1,164 trilhão, um crescimento de 41%. Esse avanço, entretanto, aconteceu em uma intensidade menor se comparada à valorização das ações em circulação como um todo, em sinal da redução relativa do estoque. O valor total de ações em custódia na B3 cresceu 49%, para R$ 2,777 trilhões.

Os estrangeiros ainda mantêm uma parcela relevante do mercado, que se beneficia da valorização dos ativos. No entanto, os dados indicam: os não residentes têm evitado aumentar a exposição e retiram capital daqui em busca de outros destinos para suas aplicações.

De acordo com dados da B3, a participação dos estrangeiros no mercado havia caído de 44,3% no fim de 2018 para 41,9% no encerramento de 2019, com alguma distância para os quase 50% no fim de 2017. Aumentou o protagonismo do investidor local em ambiente de juros cada vez mais baixos.

A dinâmica do mercado brasileiro está mudando com um crescimento forte do investidor local, especialmente pessoa física, e isso tem diluído o percentual de participação do estrangeiro. O estrangeiro continua alocado no Brasil, mas os locais estão crescendo em um ritmo muito mais acelerado.

A transição é intensificada pelo fato de a bolsa brasileira ter enfrentado uma dura concorrência de mercados desenvolvidos e de outros emergentes, enquanto o cenário local continua cercado de ceticismo, aos olhos dos estrangeiros, após anos de frustração com a expansão do Produto Interno Bruto (PIB).

O investidor estrangeiro já “acreditou” no Brasil em 2017, por exemplo, diante das expectativas de retomada da economia e reformas, mas o país “deu esperanças frustradas”. Desde então, o PIB tem tido dificuldade para sair do patamar de expansão de 1% ao ano. O país passou por recessão e teve recuperação fraca, sendo três anos com crescimento de 1%. Fica na mente do investidor o temor se o Brasil consegue crescer mesmo.

Além disso, o foco parece estar no mercado primário. No ano passado, vendiam para entrar nas ofertas. Como estão sendo projetadas muitas em 2020, ele faz caixa para entrar. O estrangeiro tem preferido ofertas.

Quando se olha as operações do estrangeiro no mercado futuro, fica mais evidente a redução da exposição. Até o dia 29, as vendas no segmento somavam R$ 15,7 bilhões. Juntos, os números mostram uma saída de capital externo do mercado de ações brasileiro de R$ 31,8 bilhões em janeiro. Normalmente, o investidor vende no mercado à vista e compra no futuro. Agora foi dobrado e R$ 30 bilhões é um volume expressivo.

É preciso ter cuidado ao analisar a saída de estrangeiros, já que no mercado primário o saldo de 2019 ficou positivo em R$ 38,5 bilhões. De fato, o estrangeiro está menos representativo por aqui quando olhamos em termos percentuais, mas ao mesmo tempo o investidor local foi ganhando espaço.

Se não bastassem as questões locais, as surpresas negativas com o coronavírus e uma suposta queda da demanda chinesa por importações de commodities afeta o interesse por emergentes. Na semana passada, o Ibovespa acumulou perdas de 4,08%. No ano, a baixa é de 1,81%, demonstrando o mercado secundário estar sendo penalizado diante dos riscos representados pela doença.

Um risco externo sucedeu o outro e, no fim das contas, o estrangeiro permanece bastante cauteloso. Ficou menos atrativo investir em um país com o nosso perfil de risco dadas essas questões externas e o nosso diferencial de juros. Ele diminuiu em relação a outros países.

Quando olhava de 2016, 2017 até 2019, a impressão era se poder comprar qualquer coisa no Brasil porque ia subir. As ações estavam historicamente baratas. Agora, isso não é verdade para a bolsa toda. A atual um valuation demanda o Brasil dar certo, mas é impossível com tanta gente incapaz no governo.

No agregado da bolsa, o gestor ainda vê os múltiplos baratos, mas setorialmente e, em alguns casos específicos, há uma complicação maior. Tem de tomar cuidado onde investir, porque quando as coisas demandam muito valuation e dão um pouco errado, elas caem bastante. A famosa parte do ciclo ‘stock picking’ chegou.

Com a Selic em 4,25% ou 4,5% ao ano, e a NTN-B longa pagando um prêmio entre 3% e 3,5%, o retorno das companhias brasileiras para os investidores tem de partir de 10%. Mas não faz sentido comprar ação com menos de 15% de ganho com dividendos.

Não se pode contar com fluxos globais para o Brasil agora porque o estrangeiro vai esperar a sinalização de um crescimento maior e mais consistente. Além disso, a hostilidade do governo ao líderes de todos os países, exceto a submissão voluntária ao Trump, não atrai a menor simpatia por investir capital aqui.

Hoje, o setor com maior peso no Ibovespa é o financeiro (que inclui os bancos e empresas como Cielo e B3), com 36% da carteira teórica. Esse segmento viu sua participação crescer nos últimos dez anos – em janeiro de 2010, sua fatia era de 19%. Outro importante setor é o de petróleo, gás e biocombustíveis, com peso de 14% (com destaque para a Petrobras). Essa fatia já foi maior: há dez anos, respondia por 18% do índice.

Empresas do setor de materiais básicos, onde está a Vale, têm peso de 13% (sendo (8,604% da Vale). Esses ativos acabam sendo mais sensíveis ao noticiário internacional e às oscilações de preços das commodities. Por isso, nem sempre caminham na mesma direção da economia doméstica.

Olhando mais para o passado, em 1968, as cinco maiores participações do índice concentravam 37,2% do total, com foco nas empresas de commodities e indústria de base. Já na década de 90, as empresas de telecomunicações eram o forte do índice, com a Telebras representando mais da metade dele.

O Ibovespa, índice que reúne as empresas mais negociadas da bolsa brasileira, subiu mais de 30% no ano passado. Mas menos da metade dessa alta foi puxada pelas dez ações de maior peso nessa seleção. Dos 31,5% de valorização do principal índice da B3, apenas 13,29 pontos percentuais vieram desses papéis.

Segundo especialistas, a força motriz da bolsa no ano passado veio de empresas de menor capitalização. Com os juros mais baixos e a retomada, ainda que gradual, do emprego e do consumo, ações de companhias ligadas à economia doméstica (como varejistas, construtoras e prestadoras de serviços) se valorizaram mais do que aquelas com mais peso no índice.

As ações de maior participação no Ibovespa são popularmente conhecidas como “blue chips”. Elas são aquelas mais negociadas e que movimentaram mais dinheiro com suas compras e vendas. A cada quatro meses, a bolsa analisa a composição do índice para avaliar se a lista continua a mesma.

Ao longo de 2019, por exemplo, 11 papéis estiveram entre os 10 de maior peso: Itaú PN, Vale ON, Bradesco PN, Petrobras PN, Petrobras ON, Ambev ON, Banco do Brasil ON, Itaúsa PN, B3 ON e Lojas Renner ON.

Destes, porém, apenas quatro subiram mais que o Ibovespa ao longo do ano: JBS, com valorização de 122,6%; a própria B3, com alta de 63,3%, Lojas Renner, que subiu 47%, e Petrobras (PN), com 36,8%. Dentre as dez maiores altas do ano, apenas a JBS aparece.

As empresas chamadas de ‘small caps’ subiram muito mais do que a média. Magazine Luiza teve alta de 112%, Via Varejo subiu 154%. Elas tiveram um protagonismo maior. Por isso, as ‘blue chips’ não se destacaram tanto.

A perspectiva, para os analistas, é as small caps continuarem em alta em 2020. Eles apostam, no entanto, que algumas blue chips que “patinaram” ao longo de 2019 podem engrenar neste ano, o que pode deixar a alta do Ibovespa ainda maior. São vendedores de ilusões! Suas análises são ridículas ao encontrar causalidades em correlações espúrias!

Segundo os especialistas, o investidor pessoa física da bolsa pode continuar apostando tanto em fundos quanto em ETFs dos índices da bolsa. Eles se justificam; “Nós, que somos analistas, passamos um tempo muito grande analisando cada papel. Um investidor fazer isso para escolher as melhores ações seria um trabalho exaustivo, que levaria muito tempo. O ideal é escolher um bom fundo, com gestores que estão ali para fazer essa seleção de forma profissional. Ou até mesmo um fundo de índice, como do Ibovespa”.

Para investidores de renda variável, nos Estados Unidos, as maiores empresas nunca estiveram tão bem como agora. Enquanto o índice S&P 500 volta a testar níveis recordes, as cinco maiores empresas de capital aberto dos EUA agora respondem por participação recorde de 18% da capitalização do indicador de referênciasuperior à bolha da tecnologia, segundo o Morgan Stanley.

As ações de empresas de alta capitalização dos EUA saltaram para perto do nível mais alto em mais de dez anos em relação às chamadas “small caps” nos primeiros dias deste novo ano. As companhias que lucram mais no exterior estão perto dos maiores níveis desde abril em comparação com as domésticas, segundo as cestas do Goldman Sachs. Apple, Microsoft, Alphabet, Amazon.com e Facebook são “o outro 1%”. Esta é uma frase normalmente usada para descrever as disparidades de renda e riqueza para exemplificar as desigualdades no mercado de ações.

Embora a valorização dessas gigantes seja uma boa notícia para quem simplesmente busca uma alta do índice, para alguns estrategistas é sinal de os investidores terem perdido o apetite por risco em meio aos temores de que o ciclo econômico esteja lento.

Graças à inovação e à predominância de mercado – o argumento principal para a valorização -, essas gigantes de tecnologia podem proporcionar crescimento de lucro, independentemente do que aconteça na economia. O desempenho superior ameaça alterar muitas teses populares para 2020 em renda variável, notadamente uma preferência por ações globais em detrimento às empresas de Wall Street, bem como por ativos mais arriscados.

Os investidores estão muito mais cautelosos. Se houver realmente uma recessão, as pequenas empresas serão prejudicadas por causa do risco de crédito mais o beta de ações.

Em um ciclo de negócios em envelhecimento, muitos acreditam ser mais provável a atividade desacelerar do que acelerar e, portanto, o crescimento do lucro será mais fraco, punindo as small caps desproporcionalmente. Margens mais apertadas levaram a ganhos mais decepcionantes entre o grupo e as estimativas de lucro provavelmente serão reduzidas ainda mais.

Enquanto isso, os capitalistas acumulam dinheiro e concentram riqueza com transferência de propriedades privadas sem oferecerem empregos e adicionarem renda. O total de fusões e aquisições no Brasil ultrapassasse pela primeira vez o patamar de mil transações em 2019. Foram 1.231 operações concretizadas no ano passado — o maior número desde 1999, início da série histórica do levantamento feito pela empresa de auditoria e consultoria KPMG.

Juntas, as empresas de serviços via internet e de tecnologia da informação (TI) responderam no ano passado por 351 fusões e aquisições no Brasil em 2019. O montante equivale a 28,5% das operações no período. O segmento que mais cresce em termos de transações é o de tecnologia, mas são transações de valor pequeno, em geral.

Especificamente no grupo de empresas de serviços via internet, a expansão no número de fusões e aquisições foi de 73% ante 2018. Parte das operações concluídas no ano passado foi iniciada ainda em 2018. As transações levam de oito a nove meses para serem concluídas. Em 2019, tivemos uma colheita da safra de 2018.

O reaquecimento da economia brasileira a partir de 2017, após dois anos de recessão severa (2015 e 2016), acabou por puxar recordes no número de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) nos últimos três anos. “O total recorde de transações em 2019 – o maior na série histórica dos últimos 21 anos – reflete também a melhora das perspectivas fiscais para o país, a partir da aprovação em outubro da Reforma da Previdência”. Ora, ora, por que?!

As chamadas transações domésticas, nas quais uma companhia ou fundo brasileiro adquire ou se funde a uma empresa no país, mais que dobraram nos últimos três anos. Saltaram de 378, em 2017, para 550, em 2018, e 782 no ano passado.

Por sua vez, as operações de fusões e aquisições capitaneadas por investidores estrangeiros cresceram em ritmo mais lento. Na comparação entre o ano passado e 2018, a expansão foi de 19%. No mesmo período, as transações domésticas cresceram 42,2%.

Os ‘players’ domésticos reagem mais rápido em momentos de crise e, também, quando a situação começa a melhorar. Já os estrangeiros reagem mais lentamente: precisam defender a operação de fusão e aquisição junto ao board [Conselho de Administração], explicar por que o dinheiro não vai para a China ou para a Índia.

Em 2018 e 2017, o levantamento anual da KPMG já havia indicado um total recorde de fusões e aquisições. Em ambos os casos, os resultados foram fortemente influenciados pelo setor de tecnologia.

Afinal, qual é a hora certa de vender ações?

Weruska Goeking (Valor, 16/01/2020) avalia: cerca de 1 milhão de brasileiros começaram a investir em renda variável em 2019. E diante da expectativa de a tendência de alta do mercado brasileiro de ações permanecer em 2020, muitos estão procurando aprender a escolher empresas para investir e como encontrar as companhias que tenham as ações com maior potencial de valorização.

Mas se muitas corretoras, casas de análise e influenciadores digitais têm falado sobre quais papéis comprar, não se dá a mesma ênfase para as recomendações de venda de ações.

Existem boas horas e motivos para vender ações tanto quando ela está subindo como quando está caindo. Na teoria, a resposta para essa dúvida é simples. Se o ideal é comprar uma ação quando ela está barata, o bom momento para vender, se você acertou a entrada, é quando ela está cara.

Mas a realidade é mais dura do que isso. Seja porque o investidor pode errar na avaliação de que a empresa estava barata – e o papel cair ladeira abaixo. Seja porque, quando a ação sobe, pode existir tanto o erro de vender cedo demais como também a chance de demorar demais pra embolsar o lucro.

Como são muitos fatores envolvidos – seu objetivo financeiro, o comportamento da ação até aquela data, alternativas de investimento para aquele dinheiro, perspectivas futuras para a empresa investida, distância do preço justo etc -, o Valor Investe conversou com especialistas em renda variável e elencou os principais pontos de atenção para ajudar o investidor a tomar a decisão sobre a venda de uma ação.

Antes de checar se é hora de vender alguma de suas ações, vale lembrar que, se você não é “day trader” ou “swing trader” – profissionais que usam estratégia de compra e venda de ações no mesmo dia ou em poucos pregões -, é preciso pensar no longo prazo.

E quanto é “longo prazo”? Pelo menos 12 meses. Mas não é para “esquecer” o investimento lá por um ano ou mais. É preciso acompanhar.

O mundo já viveu momentos quando um investidor de longo prazo podia checar suas ações a cada cinco anos. Mas isso mudou. Há um risco alto em nunca olhar as ações da carteira. O mundo está muito mais dinâmico do que já foi e as tendências estão cada vez mais velozes.

Recomenda-se o investidor dar uma espiada em seus ativos uma vez por semana. Análises mais profundas devem ser realizadas a cada trimestre.

Quando você compra uma ação, compra uma pequena participação naquela empresa. Assim, nada mais natural acompanhar as divulgações da empresa, que devem ser feitas obrigatoriamente via CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Os balanços trimestrais são a principal fonte de dados para fazer uma análise fundamentalista da empresa e sua ação.

Se você faz o acompanhamento constante trimestralmente vai conseguir perceber se a estratégia da empresa está sendo seguida, melhorada ou se ela mudou o foco de forma que ela não tem mais o mesmo poder no preço de seus produtos como antes, por exemplo.

Um trimestre ruim não significa a empresa estar fadada ao fracasso e as ações devem ser vendidas imediatamente. É preciso de uma sequência de três a cinco trimestres negativos em relação ao trimestre anterior e em relação a seus pares, porque pode ser um momento delicado de todo o setor.

Já para entender se uma companhia está entregando um desempenho realmente acima da média é preciso levar em consideração o setor onde ela está inserida e o ciclo econômico. Para uma empresa de vestuário, por exemplo, é esperado que tenha bom desempenho em períodos de crescimento da economia. Se isso não está acontecendo ou se a empresa tem performance abaixo da concorrência, talvez já tenha até passado da hora de vender a ação.

Fuga de Capital do Mercado Secundário de Ações: Hora de Vender publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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