quinta-feira, 2 de julho de 2020

No lugar de W a previsão é um M na Bolsa de Valores

Adriana Cotias (Valor, 01/07/2020) informa: depois de os mercados terem sido arrastados por um crash no primeiro semestre por causa da crise da covid-19, os investidores entram na segunda metade do ano em busca de pistas na economia real que balizem os preços dos ativos. Assimilada a fase mais dura da pandemia, entre março e abril, houve uma recuperação expressiva em ações, fundos imobiliários e na renda fixa longa. Bolsa, títulos públicos e privados e ativos “offshore” compõem as recomendações para o resto de 2020.

Em junho, as ações imobiliárias é que levaram a melhor, seguidas pelo indicador que reúne as companhias de menor capitalização na bolsa (ver tabela). O Ibovespa, principal referência da bolsa brasileira, ganhou 8,8%, no terceiro mês consecutivo de valorização. Desde o piso de 23 de março de 2020, o índice já subiu mais de 40%. No ano, ainda perde 17,8%. O campeão de valorização foi o ouro, com ganhos de 53%, seguido por euro e dólar, com altas de mais de 35%.

Na renda fixa, o IMA-B 5+, que representa uma cesta com títulos públicos longos atrelados à inflação, tem perda de 5,3% no ano. Graças à desvalorização desses papéis que os retornos ficaram mais gordinhos. No Tesouro Direto, por exemplo, as Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B) com vencimentos em 2035 e 2045 asseguram taxas acima de 4%, além da correção pelo IPCA.

Apesar da Selic baixa, em 2,25% ao ano, o jogo para a renda fixa não acabou e há muito valor ao longo dos vencimentos de juros. Títulos de cinco anos com quase 6%, o longo a 8% ou a B [Nota do Tesouro Nacional série B] longa a 4,3% vale para quem pode carregar até o vencimento.

Há espaço para o Banco Central (BC) aprofundar a sua política de corte de juros. Para provocar inflação contra a Grande Depressão Deflacionária, quando o Brasil está preso a uma armadilha da liquidez com queda de preços, provocando corte de salários e lucros. Com inflação desestimula a poupança (corte de gastos em consumo) e estimula o crédito, se houve demanda para alavancagem financeira com PPP (Parceria Público-Privada) em investimentos na infraestrutura.

O Brasil passou décadas se endividando e consumindo, quando vem a recessão, ela se torna uma recessão de balanço. A dívida implode, perde-se renda. Leva anos para se digerir os excessos. O coronavírus é um choque desinflacionário. Tem de levar o juro para zero, mas falta coragem ou disposição do BCB para isso.

Para um gestor, é um erro considerar que a Selic mais baixa desancora a inflação por causa do câmbio. O ideal seria não haver prêmio de risco na taxa básica em relação às economias desenvolvidas. Se o BC faz esse diferencial na Selic, há uma dupla contagem no risco Brasil, isso eleva a curva inteira. O BC deveria se ater à meta de inflação, quando o IPCA anual acumula 0,07% em junho. Logo, pelo RMI existe espaço cortar mais os juros, observando o cupom cambial.

Com o histórico de hiperinflação no Brasil, o Banco Central tem o viés apenas para combater a inflação. Na hora do risco desinflacionário, não está treinado para isso, sempre está achando o câmbio explodir ou a inflação vai ter um repique. O ministro ideólogo só diz: precisa de reformas neoliberais!

O câmbio é hoje uma variável de segunda ordem. Não tem o mesmo poder destrutivo do passado. Não é mais um prelúdio de crise porque as reservas são sensivelmente mais altas e o endividamento externo do setor corporativo é menor.

Na bolsa, há um “cabo-de-guerra”. Se, de um lado há uma queda de atividade mais brutal por vir e uma recuperação tênue à frente, de outro a situação das grandes empresas listadas é boa. As companhias se desalavancaram, chegaram à crise capitalizadas, com custos controlados e têm acesso a crédito a 3% ao ano, não mais a 15%. Uma menor taxa de desconto nos cálculos de valor justo das ações também tem o efeito de liberar valor. Talvez haja expansão dos múltiplos e talvez não seja bolha… Ora, ora, isto é um autoengano!

Os juros menores também elevam a propensão de 2,649 milhões pessoas físicas a ter ações no portfólio (fora nos Fundos de Ações,  explicando o aumento de CPFs cadastrados na B3 bem no meio da crise: 968 mil no primeiro semestre de 2020. “Quando se coloca tudo isso junto, temos um ambiente onde a bolha de ações pode inflar ainda mais, com sustos de explosão pelo descolamento entre a atividade real e a bolsa.

Será a partir da divulgação das demonstrações financeiras referentes ao segundo trimestre que será possível traçar um panorama mais claro para as empresas. Com a divulgação de metas financeiras e operacionais dará para ter uma melhor sensibilidade do que vem pela frente.

No campo macro, a maior queda virá pelo divisor em lugar de multiplicador de renda e emprego. Não há como descobrir o preço justo por trás dos ativos. Haverá indicadores mais claros se a alta liquidez é que inflou as cotações ou se há fundamentos para isso. O comportamento das companhias na bolsa tende a ser mais heterogêneo.

Vai começar a haver diferenciação entre países, setores e empresas. As companhias de capital aberto no Brasil têm vantagens competitivas em relação às médias porque têm acesso ao mercado de capitais, vão poder consolidar setores e ganhar market share. Isto é ilusório quando não há lançamentos primários de ações e debêntures na maioria dos casos ligados à economia doméstica, exportadoras e serviços financeiros, excluindo bancos.

Após um dos semestres mais conturbados da indústria financeira, o mercado tende a perder um pouco da volatilidade no período de férias de verão no hemisfério Norte. A partir do fim de julho será possível avaliar melhor o impacto da pandemia na atividade e dos estímulos maciços feitos para mitigar a crise.

De maneira geral, a economia está bem servida de dinheiro face à preferência pela liquidez. Os bancos centrais fizeram um bom trabalho sob a ótica macro, mas o tamanho do impacto sobre salários e gastos dos consumidores e também no balanço das companhias só vamos perceber entre o fim de julho e agosto. Aí, os especuladores começam a ter a noção do estrago,  para formar os fundamentos para o próximo ciclo.”

As eleições americanas e a volta de disputas comerciais lideradas pelos Estados Unidos deixam o terreno um pouco mais movediço adiante. O cuidado tem sido contrabalancear a posição direcional com proteções, a fim de evitar sustos com quedas abruptas.

É na redução das taxas de juros futuras a propaganda enganosa de gestor para afirmar haver ainda prêmios a capturar em ações e também nas estratégias de renda fixa.

Com a Selic na mínima, o processo de migração de aplicações atreladas ao CDI para ativos de maior risco vai ter continuidade, a despeito do vaivém de preços.

O rentista, que tinha um retorno superpositivo com risco baixíssimo, foi obrigado a explorar novos mercados. Nesse cenário, ganham apelo a bolsa, ETFs [fundos de índices negociados na B3] de renda variável e títulos privados ou públicos atrelados ao IPCA.

O investidor foi na linha de aumentar a ‘duration’ [prazo médio] e colocar mais risco em crédito privado, como uma alternativa ao CDI. Há, porém, preocupação com os impactos da pandemia no balanço das empresas, portanto é preciso escolher muito bem que ativos colocar na carteira.

Nas estratégias com títulos públicos, a preferência tem sido as Notas do Tesouro Nacional série B (NTB-B) com vencimentos entre 2026 e 2028.

Entre as opções do cardápio internacional, vale buscar não só fundos que anulem o efeito cambial, como opções realmente expostas à moeda forte. O mercado internacional tem um universo maior de ativos para alavancagem. Com taxas de juros próximas de zero, há chances de retornos mais positivos com arbitragens mais consistentes do que no mercado local.

Com a atividade global mais fraca, não adianta correr para a renda fixa para proteger a parcela alocada em ações. Entre março e abril, a indicação foi comprar ativos na bolsa americana, o que trouxe algum equilíbrio para a carteira num período de forte desvalorização do real. Cerca de um terço da parcela em ações está hoje fora do país.

Especulador profissional tem evitado aumentar a parcela alocada, a fim de manter a volatilidade da carteira sob controle. Em papéis atrelados à inflação, a escolha foi pelas NTN-Bs com prazo intermediário, com vencimento em 2035, pois havia dúvidas de como o investidor reagiria à percepção de um risco fiscal maior por causa do aumento de gastos públicos.

Se a valorização se confirmar, a ideia é vender os títulos para deslocar os recursos para ações. No primeiro semestre, montou -sealgumas proteções via opções e compra de ouro. Como o custo de oportunidade dado pela Selic hoje é sensivelmente menor, esse é um tipo de posição que pode aumentar nos momentos de aversão a risco.

Enquanto o brasileiro altera a sua construção de portfólio, o capital estrangeiro demorará a voltar para o país, por mais barato que os ativos possam parecer por causa da desvalorização cambial. Isso não é necessariamente ruim. O Brasil está mudando o tipo de capital que atrai. Aquele era ruim, agora vai ser pior. No período bom eram bilhões que vinham para tirar proveito do diferencial de juros e depois saía correndo. Quando a Selic caiu de 14% para 4% acabou o carry trade.

Há fundamentos ilusórios para uma taxa de câmbio mais valorizada no Brasil, somente porque as companhias trocaram dívida no exterior por passivos em reais e há uma melhora no balanço de pagamentos brasileiro. Mas há poucas vendas para o mercado interno!

O especulador sem rumo ainda buscou oportunidades em fundos imobiliários, selecionando ativos pensando em alternativa de renda, pelos dividendos, e também de ganhos de capital – com a esperada valorização das cotas na bolsa. Na classe alternativos, entram ainda private equity, ativos imobiliários e carteiras de para infraestrutura.

Com ajuda do cenário de juros baixos e ampla liquidez global, o Ibovespa tem conseguido mostrar alguma recuperação nas últimas semanas. Em junho, por exemplo, os ganhos do índice chegaram a 8,76%, mesmo com o tombo na sessão de ontem. No entanto, a bolsa brasileira ainda foi a mais desvalorizada do semestre, em dólares, quando comparada aos demais índices emergentes e também aos Estados Unidos.

De acordo com dados elaborados pelo Valor Data, considerando a moeda americana como referência, a queda do Ibovespa nos seis primeiros meses de 2020 ficou em 39,50%, ficando à frente até do México, que tem perdas de 29,13%. No mesmo período, a bolsa da África do Sul perdeu 23,10% e a da Rússia cede 21,71%. A vizinha Argentina teve desvalorização de 21,11% em seu principal índice acionário. O Chile recua 22,29%.

Já nos Estados Unidos, o quadro é bastante diferente, com o índice Nasdaq apontando ganhos de 12,11% no semestre, enquanto o S&P 500 recuou 4,04%. Na mesma comparação, o Dow Jones cai 9,55%.

Os números demonstram como a recuperação tem sido diferente para distintos mercados, após a derrocada vista em março diante dos temores em torno dos efeitos econômicos do covid-19. Vale dizer ainda: o real foi a moeda que mais sofreu contra o dólar desde o começo do ano, considerando as divisas mais líquidas do mundo.

Passado o pior momento da crise para os mercados, a análise do segundo trimestre demonstra uma recuperação para o Ibovespa, com ganhos de 23,59% no período, também considerando os valores dólares – próximo do avanço de 30,63% da Nasdaq nestes três meses. Ainda assim, o Ibovespa segue atrás da África do Sul (25,18%) e da Argentina (45,17%), demonstrando uma recuperação ainda em curso e atrasada em relação aos demais. México (10,97%), Rússia (19,54%), Turquia (22,63%) e Chile (18,02%) também avançaram nos últimos três meses.

Apesar de incentivos como os juros historicamente baixos (atualmente a Selic está em 2,25% ao ano) e, notadamente, o preço barato do Ibovespa em dólares, o mercado local ainda inclui uma série de riscos que impedem que o índice avance ainda mais no curto prazo. Isso tem muita relação com o cenário político e com as respostas dadas à crise ainda em curso.

O avanço recente visto no Ibovespa guarda mais relação com a robustez das empresas que integram o índice e sua saúde financeira do que com avanços na economia real, que ainda promete trazer indicadores muito ruins nos próximos meses. Além disso, é importante lembrar: o Ibovespa é composto por empresas, em sua maioria, com histórico de resiliência em períodos de crise, como é o caso do setor bancário.

Quando falamos no Ibovespa, são empresas sólidas e que caíram demais logo no primeiro susto com a pandemia, mas que têm capacidade de recuperação. A alta recente tem a ver com a realidade dessas empresas, não da economia em si. Os juros baixos também colaboram com o cenário, obrigando o investidor a buscar risco.

Ontem, em uma sessão marcada pela volatilidade típica de rebalanceamento de períodos, o Ibovespa terminou o último pregão do semestre em queda e pressionado pelo setor bancário. Nos valores em reais, a baixa foi de 0,71%, aos 95.056 pontos. O giro financeiro foi de R$ 21,5 bilhões, pouco acima da média dos pregões deste ano até agora, de R$ 20,4 bilhões.

Dias de rebalanceamento normalmente resultam em um leilão com distorções, especialmente pela atuação de fundos de maior peso no mercado. Isso significa que ações de maior peso e liquidez, como a dos bancos, acabam sendo alvo da revisão de estratégia dos investidores.

A ajuda sem precedentes dos governos e bancos centrais foi a grande responsável pelo rali que tomou conta do mercado norte-americano de ações nos três últimos meses, mas ainda se dividem quando questionados se os estímulos serão capazes de levar a economia dos EUA rapidamente de volta ao caminho do crescimento e os preços de ações a níveis ainda maiores. Essa é a visão de profissionais consultados no encerramento do melhor trimestre para o S&P 500 desde 1998.

O índice amplo de ações de Nova York fechou a sessão em alta de 1,54%, acumulando alta de 19,95% no segundo trimestre, devolvendo praticamente todas as perdas registradas nos primeiros três meses do ano, quando recuou 20%, em seu pior trimestre desde 2008.

Esse rali aconteceu porque os investidores já estão olhando para a recuperação e para o crescimento. Por que eles estão fazendo isso? Porque o Federal Reserve (Fed) inundou o sistema com liquidez e tivemos uma coordenação com a política fiscal, o que faz o mundo acreditar que devemos superar primeiro essa situação, em melhor forma que o Japão e a Europa.

Há quem propaga em uma recuperação rápida da economia americana de modo a voltar ao nível do fim de 2019 já no meio do ano que vem. Também prevê que o S&P 500 termine o ano em 3.400 pontos, o que representaria uma alta de quase 10%. O Fed vai continuar fornecendo liquidez ao sistema, como vimos nas palavras de [Jerome] Powell. E fará isso porque sabe que o maior risco à economia americana é a deflação. O Japão está em deflação, a Europa, provavelmente, está em deflação e eu apostaria que a China também. Então provavelmente 38% do PIB global está em deflação, e o Fed não quer que os EUA façam parte disso.

A despeito da alta das ações, riscos passaram a se acumular nos últimos dias, especialmente com o aumento de novas infecções pela covid-19 nos Estados Unidos, o que fez com que governadores revissem medidas de flexibilização da atividade comercial pelo país, ameaçando a ainda incipiente recuperação econômica americana. O fato também adiciona incertezas sobre a continuidade do rali em Wall Street.

Os múltiplos das ações americanas, especialmente os do Nasdaq, mostram os papéis estão precificados à perfeição de um cenário impossível de se concretizar. O atual cenário se compara  à bolha das empresas de tecnologia, episódio que ocorreu no início do século.

Você pega uma cesta de 90 companhias de internet e elas estão sendo negociadas a 160 vezes o seu lucro. Se isso fosse um ‘bull market’ [mercado de alta], os valuations não deveriam estar tão altos assim. Estamos vendo problemas da economia mascarados pelas empresas de tecnologia, que puxaram a alta do mercado. Já vimos esse filme em 2000 e ele não termina bem.

De todas as 18 métricas acompanhadas pelo Bank of America (BofA) sobre o valuation do S&P 500, apenas duas indicam que o índice estaria “barato”. Uma delas é a de fluxo de caixa livre, que está “deprimido artificialmente devido ao baixo investimento”, de acordo com relatório publicado pela instituição. A outra métrica, segundo o BofA, é a que compara o prêmio de risco das ações em relação aos rendimentos dos Treasuries.

Para investidores em busca de rendimentos, o S&P 500, mesmo após uma série de cortes de dividendos, oferece aproximadamente três vezes o juro da T-note de 10 anos, perto de um recorde de 70 anos.

A enxurrada de estímulos monetários não deve ser capaz de impulsionar o crescimento orgânico da economia, como ele classifica os investimentos em bens de capital (Capex) pelas empresas. Por isso, sua aposta tem sido na valorização de metais preciosos, como o ouro, e em empresas mineradoras, que devem se beneficiar dos juros baixos e da expansão monetária promovida pelos principais bancos centrais do mundo.

Um “bear market” (mercado de baixa) está começando para o S&P 500, mas a recente euforia do mercado pode atrasar seu início nos próximos meses.O pessimismo com o mercado de ações está relacionado à provável grande decepção com a expectativa de recuperação nos lucros corporativos no próximo ano, que parte do mercado estima que estará de volta ao nível de 2019 ou em níveis até maiores.

Em previsões prudentes, a frustração será o resultado de uma recuperação econômica apenas gradual da terrível recessão do primeiro e do segundo trimestres – uma visão amplamente compartilhada por analistas econômicos, incluindo o Fed, mas totalmente ignorada pelos investidores. Os prudentes esperam uma queda de pelo menos 20% do S&P 500.

Assis Moreira (Valor, 01/07/2020) informa: o Banco de Compensações Internacionais (BIS), espécie de banco dos bancos centrais, projeta redução de 37,4% no lucro operacional médio de companhias brasileiras em 2020, na esteira da súbita paralisação da atividade econômica global causada pela covid-19.

O banco projeta também que a escassez de financiamento (“funding shortfall”) pode alcançar 31,8% no país. Isso significa que as receitas operacionais e de caixa devem ficar aquém dos custos operacionais e do pagamento de dívidas de curto prazo em 31,8% na empresa brasileira típica em 2020.

Em seu relatório anual, a instituição aponta que o brusco freio da atividade econômica reduziu os ganhos das firmas que vão muito além do que aconteceu em recessões anteriores. Estima que várias companhias globalmente podem não sobreviver mesmo se usarem todos os instrumentos possíveis para compensar as perdas, incluindo utilização de ativos líquidos, rolagem de dívidas, novos empréstimos e corte de custos.

O BIS fez simulações baseadas em balanços e comunicados financeiros de 33.250 firmas de 19 grandes economias desenvolvidas e emergentes. E avalia que a rolagem de dívidas e novos empréstimos até podem dar algum alívio, mas ainda assim a lacuna de financiamento persiste. O apoio do governo é considerado essencial para fechar o “gap”.

As simulações utilizam a hipótese de que as receitas das empresas em 2020 permaneçam inalteradas em relação a 2019 ou declinem 25% ou 50%, dependendo dos efeitos do surto em diferentes setores. Receitas na área de entretenimento, por exemplo, são estimadas em declinar 50%, enquanto em “utilities” ficariam constantes.

A conclusão é a de que um grande número de firmas poderá enfrentar perdas operacionais em 2020. Em todos os países pesquisados, as firmas médias podem oscilar de lucros confortáveis, acima de 5% de receitas, em 2019, para perdas claramente superiores a 20% de sua receita do ano passado.

Em relação ao Brasil, os custos operacionais devem exceder as receitas operacionais em 37,4% na empresa mediana em 2020, resultando nesse percentual de contração do lucro. Fica entre -50% no caso de companhias russas e em -25% em firmas dos EUA.

As perdas podem ser maiores, dependendo da composição da produção. O BIS exemplifica que um severo choque de receita poderia jogar companhias do Brasil e do Canadá profundamente no vermelho, apesar dos fortes lucros de 2019, refletindo principalmente a contração nas commodities.

A lacuna de financiamento é de 31,8% em 2020 para as empresas brasileiras, na média. As simulações indicam que a escassez de financiamento para companhias médias, entre os países pesquisados, fica em 20% da soma das despesas operacionais e custos do serviço da dívida, e pode chegar a 40% em algumas economias.

Para o BIS, as firmas vão precisar de apoio financeiro e sugere que isso pode vir em várias formas. Aponta, primeiro, rolagem da dívida. Segundo, a possibilidade de pegarem emprestado dando seus ativos como garantia, mesmo se esses estão temporariamente ilíquidos. E terceiro, com subsídios, garantias de crédito, empréstimos diretos ou esquemas que reduzam custos operacionais, cobrindo parte da conta de salários.

“Essas medidas poderiam fazer uma grande diferença”, estima o banco. Exemplifica que num cenário em que firmas não podem pegar emprestado e têm que pagar dívidas que estão vencendo, a necessidade de apoio do governo seria equivalente a seis meses da receita. Mas poderia cair para dois meses, na média, se as companhias rolarem mais da metade da dívida que vence em 2020 e conseguirem crédito equivalente a 80% de seus ativos de curto prazo.

No relatório, o BIS nota que, no geral, mesmo o dinheiro em caixa mantido por grandes companhias é pouco em relação à dimensão da súbita paralisação que enfrentam. Metade das companhias guardou dinheiro equivalente a dois meses da receita de 2019, incluindo o Brasil. A exceção é a China, com quatro meses.

As falências de empresas poderão aumentar globalmente, no rastro da crise de covid-19. Mas, ao menos que os bancos tenham problemas, é mais fácil imaginar uma recuperação econômica, mesmo na presença de insolvências, prevê o Banco de Compensações Internacionais (BIS) em seu relatório anual. Para o BIS, na próxima fase da crise o foco mudará de liquidez para solvência das empresas, e os governos devem assumir a liderança para promover uma recuperação forte e sustentável.

Para a instituição, vista como uma espécie de banco dos bancos centrais, os BCs tiveram uma força estabilizadora na crise sem precedentes que atinge a economia mundial, trabalhando com as autoridades fiscais para amortecer o golpe econômico e financeiro e apoiar empresas e trabalhadores.

“A pandemia é o evento que define uma geração”, afirmou o diretor-geral do BIS, Agustin Carstens. “A resposta dos BCs foi rápida e contundente e impediu o colapso financeiro de suportar os encargos para as empresas e as famílias, estabilizando o sistema financeiro para preservar o fluxo de crédito.”

Para Carstens, “as medidas de suporte de vida durante a fase inicial devem estabelecer a base para a recuperação, uma vez que os ‘lockdowns’ sejam levantados. No entanto, apesar das medidas, incertezas podem travar a demanda agregada e o ritmo de recuperação.”

O relatório destaca o papel da política monetária como essencial ao tratar de iliquidez, mas nota que é mal adaptada para tratar de insolvência: o BC empresta, mas não pode gastar. A vantagem comparativa da política fiscal é de tratar insolvências, transferindo temporariamente recursos para prevenir isso e apoiar os balanços das empresas na reestruturação, uma vez que isso ocorra.

Na próxima fase da crise, o foco muda de liquidez – assegurar que as firmas tem recursos suficientes para operar – para solvência, onde a viabilidade de longo prazo de muitas companhias será testada. A força da recuperação vai depender de como a pandemia evolui e da dimensão dos estragos econômicos que deixou.

Para o BIS, a reestruturação de dívidas será requerida na medida em que os recursos se deslocam de setores em contração para aqueles em crescimento. No entanto, persistentes incertezas dificultam a distinção ainda entre firmas insolventes mas viáveis, que requerem reestruturação, e insolventes sem viabilidade, que devem ser liquidadas. A questão se complica com vulnerabilidades iniciais do setor não financeiro e o tamanho do choque.

“Os bancos centrais estão plenamente conscientes dos desafios à frente, na medida em que as perspectivas para a economia mundial ainda são altamente incertas”, afirmou Carstens. “Alguns desses desafios vão além de seu mandato. A política monetária por si só não pode ser o motor do crescimento. Um premium deve ser mantido em manter a política fiscal em um caminho sustentável por meio de consolidação oportuna”, diz.

Para o BIS, enquanto o curso futuro da inflação é certo, pressões desinflacionárias podem prevalecer por algum tempo. O choque da pandemia tende a reduzir a produtividade. Cadeias globais de valor devem ter danos duradouros. Até agora, a constatação é que os objetivos de BCs e governos coincidiram. Mas o aumento das dívidas pode levar governos a colocar pressão sobre BCs a tolerar maior inflação e manter juros baixos.

No lugar de W a previsão é um M na Bolsa de Valores publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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