sábado, 4 de maio de 2019

Onda Esquerdista: Contraponto à Extrema-Direita

Giovanni Legorano (Valor, 30/04/19) noticia: os partidos de centro-esquerda da Europa, dada a perda de votos, recentemente, estão se voltando à esquerda para recuperar os eleitores da classe trabalhadora. Eles migraram para movimentos de extrema-esquerda e populistas. Essa iniciativa deu resultado nas eleições da Espanha na qual os socialistas arrasaram seus adversários conservadores.

Os socialistas governam a Espanha desde junho de 2018. Venceram uma competição fragmentada com uma plataforma com compromisso de tratar de questões centrais para a base social-democrata do partido:

  1. direitos para os trabalhadores,
  2. impostos maiores para os ricos e
  3. proteção do meio ambiente.

Apesar disso, o PSOE terá de formar uma coalizão com aliados menores para ter maioria no Parlamento.

As pessoas não conseguem mais se sustentar com a crise decenal e desemprego tecnológico. Está na hora de que falem sobre os pilares fundamentais da esquerda, de ser socialista, sem esses desvios para o centro.

Do mesmo modo, partidos de centro-esquerda na Alemanha, na Itália e no Reino Unido estão tentando atrair de volta eleitores perdidos por se sentirem traídos por políticas centristas ou neoliberais. Elas, acreditam, os fizeram mais pobres e ameaçaram a segurança de seus empregos. Parte desse eleitorado migrou para partidos novos, à esquerda e à direita.

O PSOE claramente virou para a esquerda. Sua retórica está altamente carregada com mensagens de esquerda e acrescenta novos temas, como a precariedade e as mudanças climáticas. Fez isso para se aproximar também dos jovens.

Os socialistas conquistaram 123 das 350 cadeiras do Parlamento da Espanha, 85 a mais do que nas últimas eleições, em 2016, enquanto o conservador Partido Popular caiu para apenas 66 vagas, ante as 137 que detinha. O PP perdeu muitos eleitores para o partido Vox, de extrema-direita. Este partido xenófobo e neofascista elegeu 24 deputados (não tinha nenhum), graças principalmente à irritação dos nacionalistas espanhóis com as ambições separatistas da Catalunha.

De todo modo, para ter a maioria parlamentar, o premiê socialista Pedro Sánchez terá de construir uma coalizão. Provavelmente, será de difícil gestão. A negociação para a formação do governo pode levar semanas. Sánchez pode ainda tentar formar um governo sozinho, sem maioria, mas isso costuma ser instável e durar pouco.

A angústia existencial que aflige os partidos de centro-esquerda da Europa reflete o debate dentro do Partido Democrata dos EUA sobre como responder ao desafio do presidente Donald Trump: ir para a esquerda para ganhar alguns eleitores, com o risco de perder outros, ou mirar no centro? Nas eleições legislativas de 2018, os democratas tiveram uma onda esquerdista.

Quando a ideia de governo grande caiu em descrédito, ao fim da Guerra Fria, os partidos de centro-esquerda no Ocidente passaram a aceitar cada vez mais a visão econômica de livre mercado, ao mesmo tempo em que buscavam limar as arestas do capitalismo em vez de mudá-lo radicalmente.

Na Europa, líderes como o britânico Tony Blair e o alemão Gerhard Schröder conduziram a mudança de perspectiva, dos generosos Estados de bem-estar social e da intervenção estatal para a desregulamentação, a privatização e a concorrência. Líderes de centro-esquerda na França, Itália, Espanha e em outros países os seguiram.

Com o tempo, os eleitores da classe trabalhadora na Europa passaram a considerar esses partidos como cada vez mais distantes das pessoas comuns. Seus seguidores sentiram-se traídos quando alguns deles, como os socialistas da Espanha e os democratas da Itália, respaldaram cortes na seguridade social para escorar as finanças do governo durante a crise financeira.

Populistas de extrema-esquerda e extrema-direita ganharam espaço, entre eleitores desiludidos, com ataques ao sistema capitalista, o que acelerou o declínio de partidos tradicionais de centro-esquerda.

É como se esses partidos tivessem levado uma pancada na cabeça e ficado desorientados. Alguns deles decidiram retomar seus princípios fundamentais para recuperar eleitores.

O Partido Trabalhista britânico, marcado pela derrota inesperada nas eleições de 2015, esteve entre os primeiros a virar à esquerda. Seu líder, Jeremy Corbyn, atraiu milhares de jovens com mensagens contra a austeridade e a guerra. Ele também defende reestatização da água e das ferrovias. Nas eleições de 2017, o Partido Trabalhista conquistou 40% dos votos, ante os 30% de 2015, mais ficou em segundo lugar, abaixo do governante Partido Conservador. O socialismo voltou à agenda.

O Partido Social-Democrata (SPD) alemão e o Partido Democrático da Itália estão se afastando das políticas econômicas pró-empresas que implementaram nas duas últimas décadas, depois de perder uma série de eleições.

Em 2017, o SPD teve seu pior resultado pós-guerra numa eleição legislativa, após perder muitos eleitores desiludidos com seu rumo centrista na economia. Tanto os Verdes, de tendência esquerdista, como o Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema-direita, tiveram ganhos significativos.

Na Itália, o Partido Democrático perdeu votos desde 2013 para o Movimento 5 Estrelas, antissistema, e para a Liga, de extrema-direita, que hoje governam juntos o país. Entre as políticas dos democratas que afastaram eleitores antigos estão a reforma da Previdência, que elevou a idade mínima para aposentadoria. O apoio popular ao Partido Democrático caiu pela metade desde o início de 2014.

O líder dos Democratas disse estar analisando uma aliança eleitoral com parlamentares que deixaram o partido por causa de políticas que consideravam muito centristas, tais como as regras que facilitavam a demissão de trabalhadores. As forças populistas se saíram melhor do que as progressistas por causa de um anseio por mais justiça.

Na Espanha, Sánchez elevou o salário mínimo em 22% antes do Natal, uma medida que teve boa repercussão entre os espanhóis de baixa renda. Sua defesa de impostos maiores para as empresas marca um contraste com o último premê socialista da Espanha, José Luis Rodríguez Zapatero, que há mais de uma década disse que “cortar impostos é de esquerda”.

Onda Esquerdista: Contraponto à Extrema-Direita publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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