quarta-feira, 22 de maio de 2019

Mudança de Face da Economia Tradicional

Em “The Changing Face of Mainstream Economics”, escrito por David Colander, Ric Holt e Barkley Rosser (Middlebury College Economics Discussion Paper No. 03-27 – Department Of Economics – Middlebury College – http://www.middlebury.edu/~econ, November 2003), eles comentam: se alguém lê a literatura heterodoxa em economia hoje em dia, tem-se a impressão de a moderna economia mainstream é muito parecida com a economia de 50 anos atrás. Ela é chamada ainda de economia neoclássica” e é criticada da mesma forma como os economistas heterodoxos anteriores criticaram a economia mainstream dos anos 1950 ou 1960.

Neste artigo, os coautores argumentam muito desta crítica hoje estar anacrônica porque o pensamento econômico dominante mudou. Para eles, a economia está se afastando de uma adesão estrita à Santíssima Trindade – racionalidade, egoísmo e equilíbrio – para uma posição mais eclética de comportamento intencional, iluminado por interesse próprio e sustentabilidade. O artigo desenvolve essas ideias considerando a natureza desse processo de mudança e da dinâmica sociológica pela qual a profissão de economistas passa.

Para entender o argumento deles, é útil pensar na profissão como um sistema complexo. Os sistemas complexos não podem ser entendidos a partir dos primeiros princípios assumidos. Eles só podem ser entendidos através do processo de mudança subjacente a eles. Da mesma forma, a profissão de economista pode ser melhor entendida pelo processo de mudança caracterizadora dela.

Muitas considerações sobre o ofício de economista tendem a ter uma visão estática da profissão, o que faz parecer ser uma entidade imutável. Essa é a abordagem heterodoxa contumaz em suas críticas ao pensamento predominante entre os profissionais. Não é assim o modo pelo qual os coautores veem a profissão a lidar com a economia. Eles a veem como uma entidade dinâmica, geradora de um sistema complexo de auto reprodução com evolução de ideias através de interação entre seus membros.

Conhecer uma entidade tão dinâmica e transmitir sua essência aos outros com frequência requer dar classificações estáticas e organizá-las em períodos distintos. Historiadores do pensamento econômico devem fazer isso para fornecer uma estrutura para a consideração de economistas do passado.

Mas essas classificações são “muletas”, não caracterizações da realidade. Elas são impostas pelo observador e não são necessariamente características da essência da profissão em qualquer ponto do tempo. Qualquer classificação estática oculta a mudança dinâmica a ocorrer abaixo dela. Por esta razão, as classificações usadas por historiadores do pensamento, como o Clássico ou o Neoclássico, embora útil e talvez até necessário, são, no entanto, limitadoras e perdem dimensões importantes da dinâmica da profissão.

As mudanças na profissão são provocadas pelo chamado pelos coautores de “trabalho à margem da Economia”. O termo “borda da Economia” se refere ao trabalho desafiante às ideias “ortodoxas” anteriormente consideradas “oficiais”. Inicialmente, descreveram isso como “trabalho de ponta”, mas alguns de seus colegas apontaram o “trabalho de borda” pode ser definido historicamente como mais adequado.

É um trabalho inovador e bem-sucedido na fronteira da profissão e capaz de sinalizar a direção futura da mudança na economia e como a profissão eventualmente se torna vista e entendida por sua elite. O próprio conceito de vanguarda da profissão é concebido para sugerir uma profissão onde existem várias opiniões em debate, dentro dela, e vai contra as classificações de padrão-estático da Economia.

Aquelas classificações, ensinadas como padrão, transmitem um sentido de uma profissão imutável como possuidora de um conjunto único de ideias. Na opinião dos coautores, isso é errado. É muito mais útil caracterizar a profissão de economista como um conjunto de ideias em evolução, frouxamente mantido por sua abordagem de modelagem dos problemas.

Robert Solow (1996) escreve: “Hoje, se você perguntar a um economista tradicional uma questão sobre quase qualquer aspecto da vida econômica, a resposta será: suponhamos um modelo dessa situação e vejamos acontece… a economia mainstream moderna consiste em ir um pouco mais além desse processo.”

As classificações padrão tendem a perder a diversidade existente dentro da profissão. Não percebe as muitas novas ideias experimentadas estarem sendo incorporadas. Eles perdem o importante insight de alguém poder fazer parte do mainstream e ainda assim não necessariamente manter ideias “ortodoxas”.

Classificações padrão também enfatizam um núcleo ortodoxo bastante restrito da profissão e transmitem uma imagem de todos economistas convencionais aceitando esse núcleo duro sem nenhum questionamento. A realidade é mais complicada.

Os economistas convencionais geralmente mantêm, em simultâneo, uma variedade de visões. Se a variação de visões aumenta, enquanto o núcleo permanece relativamente inalterado, a caracterização estática da profissão não muda, mas sua caracterização dinâmica será outra ao longo do tempo.

Uma grande variação em visões aceitáveis, como surgiu na profissão nas décadas recentes, sinaliza mudanças serem prováveis ​​no futuro. Na opinião dos coautores, a interessante história da Economia nas últimas décadas é a crescente variação de visões aceitáveis, embora o núcleo da economia não tenha mudado muito.

Por exemplo, economistas tradicionais hoje, como William Baumol, George Akerlof, Thomas Schelling, Truman Bewley e Paul Krugman, em aspectos importantes dos seus pensamentos, estão trabalhando fora do geralmente considerado a ortodoxia da profissão. No entanto, suas ideias são amplamente aceitas e discutidas dentro do mainstream da economia. Esse trabalho de vanguarda aumentou a variação de visões aceitáveis ​​na profissão.

Para capturar essa variação de visões aceitáveis, as classificações estáticas devem ser vistas como elas de fato são: ficções úteis, destinadas a estudantes mas não a especialistas. Essas classificações “olham para trás”, e, para serem significativas, elas devem ser complementadas com uma discussão da variação de ideias aceitáveis ​​para o mainstream. A realidade é, a qualquer momento, uma disciplina bem-sucedida terá centenas de novas ideias sendo testadas, com novos métodos, novas tecnologias e novas informações se tornando disponíveis. Isso está acontecendo na “beira da Economia”, ou seja, nas ideias da vanguarda heterodoxa absorvidas pelo mainstream.

Essa vanguarda da Economia tem elementos intelectuais e sociais. O aspecto intelectual de Economia, na borda avançada, fundamentalmente envolve originalidade. Isso não significa todas as ideias dessa borda marginal serem totalmente novas. Ideias têm origens e crescem melhor em alguns ambientes pluralistas em lugar de outros monolíticos. A história da economia está repleta de exemplos onde velhas ideias são reabilitadas ou revividas ao serem consideradas úteis e vantajosas no novo contexto surgido.

O trabalho com ideias de ponta, anteriormente consideradas centrais para a Economia, está sendo modificado e ampliado. Esse processo está mudando a própria natureza Economia. Isso está possibilitando essas ideias se enraizarem agora, como não foram no passado.

Por exemplo, avanços na tecnologia analítica, como a dinâmica não linear, tornou possível estudar modelos muito mais complexos se comparados aos estudados antes. Graça aos desenvolvimentos nas capacidades de computação, é possível fazer estudos com simulações e modelos baseados em agentes muito mais úteis, permitindo os economistas estudarem problemas antes sem soluções analíticas.

Combinado com avanços em outras disciplinas relevantes para a Economia, tudo isso facilita a integração entre as disciplinas. A combinação desses avanços abriu maneiras completamente novas de integrar essas ideias nas crenças centrais do campo econômico. Mudou as crenças centrais de maneira importante.

Por exemplo, desenvolvimentos em dinâmica não linear estão agora permitindo modelos alternativos de processos, incluindo mudanças repentinas de um equilíbrio para outro. O desenvolvimento de modelagem está permitindo os pesquisadores explorarem modelos com agentes heterogêneos e se mover longe de um foco em equilíbrios únicos.

[Na vanguarda heterodoxa, a ideia de múltiplos equilíbrios é substituída por dinâmica caótica permanente no sentido do afastamento das condições iniciais sem alcançar nenhum equilíbrio previsto ou sequer uma “reversão ao equilíbrio prévio”. A atividade econômica é dinâmica e a economia como um sistema complexo se configura a cada conjuntura como uma feição distinta, porém inteligível por pesquisadores perspicazes.]

Fonte e demais textos de David Colander:

Acceptable and Unacceptable Dirty Pedagogy: The Case of AS/AD

Alternative Concepts of Utility and Applied Economics

The Aging of an Economist

Are Institutionalists an Endangered Species?

The Art of Monetary Policy

The Art of Teaching Economics

Beyond New Keynesian Economics: Towards a Post Walrasian Macroeconomics

Caveat Lector: Living With the 15% Rule

The Changing Face of Mainstream Economics

Confessions of an Economic Gadfly

Complexity and the History of Economic Thought

Complexity, Muddling Through, and Sustainable Forest Management

The Complexity Revolution and the Future of Economics

The Cost of Being Queen

The Death of NeoClassical Economics

Different Drummers: Offbeat, Oft-Rejected

Economics as an Ideologically Challenged Science

Economics by the Numbers

Economics – Mathematical Politics or Science of Diminishing Returns?

Economists and Higher Learning in the Nineteenth Century

Economists, Institutions and Change

Edgeworth’s Hedonimeter and the Quest to Measure Utility

Efficiency, Journal Publishing and Scholarly Research – A Discussion Paper

Effective Supply and Effective Demand

From Muddling Through to the Economics of Control: View of Applied Policy from J.N. Keynes to Abba Lerner

Functional Finance

Functional Finance, New Classical Economics and Great Great Grandsons

The Future of Economics: The Appropriately Educated in pursuit of the Knowable

Gender and Graduate Economics Education in the US

Globalization and Economics

Guiding the Invisible Hand

Hiring of an Economist

In Pursuit of the Ph.D

Information and Pollution Permit Markets: Another View

Institutional Demand-Side Discrimination Against Women

Integrating Ethics and Altruism with Economics

Integrating Sex and Drugs into the Principles Course: Market-Failures Versus Failures-of-Market Outcomes

Integrating Sound Finance with Functional Finance

Is Milton Friedman an Artist or a Scientist?

“Little Think”Economics: Is That All There Is?

Live and Dead Issues in the Methodology of Economics

The Long-Run Consequences of Trade and Outsourcing

Macroeconomics: Was Vickery ten Years Ahead

The Making of an Economist

The Making of an Economist II

The Many Roads to Serfdom

Marshallian General Equilibrium Analysis

Mr. Keynes and the “Classics” Again: An Alternative Interpretation

Muddling Through and Policy Analysis

New Institutionalism, Old Institutionalism, and Distribution Theory

New Keynesian Economics in Perspective

New Millennium Economics: How Did It Get This Way, and What Way is It?

On The Treatment of Fixed and Sunk Costs in the Principles Textbooks

Pluralism, Formalism and American Economics

Political Influence on the Textbook Keynesian Revolution God, Man, and Laurie Tarshis at Yale

A Post Walrasian Explanation of Wage and Price Inflexibility and a Keynesian Unemployment Equilibrium System

Post Walrasian Macroeconomics and IS/LM Analysis

Post Walrasian Macro Policy and the Economics of Muddling Through

Race, Economics and Liberalism

A Real Theory of Inflation and Incentive Anti-Inflation Plans

Research on the Economics Profession

Retrospectives: Edgeworth’s Hedonimeter and the Quest to Measure Utility

Retrospectives: The Lost Art of Economics

Searching Where the Light Is: Connecting Theory and Policy in Economics

A Simple Principal-Agent Experiment for the Classroom

Some Advice to President Clinton: Develop a Long Run Balanced Budget Law 

The Sounds of Silence: The Profession’s Response to the COGEE Report

Striking the Mother Lode in Science: The Importance of Age, Place and Time

The Stories We Tell: A Reconsideration of AS/AD Analysis

The Strange Persistence of the IS/LM Model

Surviving as a Non-Mainstream Economist

Teaching Keynes in the 21st Century

Teaching Tools: A Simple Principal-Agent Experiment for the Classroom

Telling Better Stories in Introductory Macro

The Textbook Aggregate Demand Curve

Thinking Outside the Heterodox Box: Post Walrasian Macroeconomics and Heterodoxy

Trade, Outsourcing and the Future of the US Economy

Vision, Judgment, and Disagreement among Economists

William Vickrey’s Contribution to Economics

Was Keynes a Keynesian or a Lernerian?

Was Vickrey 10 Years Ahead in the Profession of Macro

What Economists Teach and What Economists Do

What Exchange Rate for the Lev?

What We Taught and What We Did: The Evolution of US Economic Textbooks (1830-1930)

Wild and Crazy Ideas: In Memory of Ken Koford

Mudança de Face da Economia Tradicional publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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