quarta-feira, 6 de março de 2019

Aquisição de Participações Acionárias com Dinheiro dos Outros

Max Gunther, no livro “Os muito, muito ricos e como eles conseguiram chegar lá” (1ª. ed. Rio de Janeiro: Best Business, 2015), narra: o chamado sistema de margem do mercado de açõesé outra ilustração familiar do uso de DDO. Sob determinadas condições, ao se comprar ações listadas, você pode tomar emprestado parte do preço de compra do seu corretor.

As regras de margem do mercado de ações são estritas. Há décadas não tem sido legal tomar emprestado uma percentagem tão grande do preço de uma ação como você pode tomar emprestado para comprar um imóvel. Ainda assim milhões de investidores habitualmente compram na margem. Eles obviamente acreditam: um pouco de DDO é sempre melhor.

Uma maneira de fazer o dinheiro de outras pessoas trabalhar para você é tomá-lo emprestado. Existe outra maneira. Usar o DDO fundamentalmente na forma de dinheiro de ações, mas tomar a rota da participação acionária.

Suponha você topar em uma ideia de um negócio relativamente promissor. Você precisa de dinheiro para dar partida no empreendimento. Você tem pouco ou nenhum dinheiro sobrando. O que você faz?

Você pode tomar emprestado o que precisa. Ou pode seguir a rota da participação acionária. Você procura alguns amigos endinheirados — cinco, digamos — apresenta a sua ideia e pergunta se eles gostariam de arriscar algum dinheiro como co-empreendedores. Você salienta a palavra risco.

Você não está pedindo para tomar o dinheiro emprestado; tampouco está celebrando um contrato para pagá-lo de volta. Os cinco amigos vão se tornar coproprietários do negócio juntamente com você — acionistas de uma maneira informal. Se o negócio tiver sucesso, cada um colherá sua participação proporcional nos lucros. Se o negócio fracassar, cada um vai se despedir tristemente do seu dinheiro.

Vamos supor que a sua ideia é boa e você é um sujeito persuasivo. Cada amigo coloca 5 mil dólares. Então, a companhia incipiente está capitalizada com 25 mil dólares. Cada amigo fica, informalmente, com uma ação da empresa. Você também fica com uma ação, apesar de que você mesmo não colocou dinheiro algum.

O acordo é você ter direito à sua participação acionária realizando todo o trabalho — na realidade, você já tem direito a uma parte substancial dela por ter desenvolvido a ideia em primeiro lugar. Você é o homem da ideia e o principal executivo operacional. Os seus cinco amigos têm os seus próprios empregos, com pouca ou nenhuma ingerência na administração do dia a dia do negócio. Eles são simplesmente os capitalistas investidores.

Desse modo, você lançou o seu negócio através do uso do DDO. A sua pequena companhia tem seis acionistas. De agora em diante você fica com um sexto dos lucros líquidos, se algum ocorrer.

Assim, se o empreendimento for bem-sucedido, você pode seguir em muitas direções diferentes. Pode manter a companhia em poucas mãos se você e os outros acionistas não quiserem sofrer interferências de fora.

Ou, se chegar o momento quando você ou eles quiserem colher alguns ganhos de capital em dinheiro, pode ampliar o círculo de acionistas ou até mesmo abrir o capital da empresa. Pode também desmembrar as seis ações originais em dúzias, ou centenas, ou milhares de ações com um valor equivalente, e pode vender parte das ações pelo preço que o mercado suportar.

Se o empreendimento for verdadeiramente bem-sucedido, os investidores originais irão vender suas ações por muito mais do que os 5 mil dólares originais. Sob as condições certas, você pode criar novas ações, vendê-las para o público e trazer um capital de giro novo para a empresa e ajudá-la a crescer.

Ou você pode segurar algumas ações como ações em tesouraria e usá-las no lugar do dinheiro para pagar por outras companhias menores para o seu empreendimento em crescimento comprar.

Você pode construir um império desta maneira — construir todo ele, ou quase todo, com o dinheiro dos outros.

O arranjo acionário interno da nova corporação pode ser projetado de maneira a você manter a metade das ações. O resto é oferecido ao público por preço aceitável para cada ação. Reuniu um grupo de corretores para ajudá-lo a vender as ações. Eles vendem toda a emissão de ações de porta em porta e por telefone em alguns meses. Deduzindo as comissões dos vendedores e outros custos, a corporação termina com milhão de dólares em novo capital de giro.

E não apenas isso: estabelece um novo valor de mercado alto para a sua companhia e para a sua participação acionária nela. Anteriormente, ela era apenas uma organização pequena de valor duvidoso — na realidade, de nenhum valor de mercado conhecido.

Se você tivesse tentado vendê-la, poderia ter encontrado dificuldade em encontrar um comprador. O comprador, olhando para as receitas pessoais crivadas de impostos, provavelmente não ofereceria o valor alcançado pela venda de ações. Mas agora você passa a ser proprietário de milhares de ações avaliadas no mercado de balcão local em milhão de dólares — e, em flutuações de mercado subsequentes, passariam com folga deste valor em alguns meses. Pode agora vendê-las a qualquer momento propício e cair fora do negócio como milionário.

Se quiser adquirir outras companhias sobre as quais tenha colocado os olhos — companhias grandes, ricas, algumas maiores do que a própria, pode comprá-las, seja oferecendo as ações da sua própria companhia como pagamento ou colocando as ações como garantia para os empréstimos.

As ações, é claro, valem o que o mercado diz elas valerem. Quanto mais alto o preço de mercado, mais valiosas seriam as ações para seus propósitos — maior seria seu poder de compra. O problema, portanto, é elevar o preço de mercado.

Companhias adquiridas, antes independentes, podem estar representadas nas declarações financeiras no chamado “valor contábil”. O valor contábil de uma empresa é essencialmente uma avaliação de um contador do valor da empresa. Trata-se naturalmente de uma avaliação muito conservadora. Há espaço para melhoria.

Em tempos de economia aquecida, o mercado de ações quase sempre avalia qualquer empresa sólida a mais em relação ao seu valor contábil. Então, se você pegar o preço de mercado atual das ações da empresa— o preço com investidores dispostos a pagar por elas — e então multiplicar este preço pelo número total de ações emitidas, o número resultante é provavelmente muito mais alto em relação ao valor contábil calculado pelos contadores da empresa. A razão é o mercado de ações normalmente colocar uma forte dose de esperança nos cálculos.

Aproveita-se do mundo de simulação especulativa, habitado não por gente a ser persuadida a acreditar, mas por gente em busca de uma desculpa por acreditar.

O preço das ações é baseado não somente no valor atual, perceptível e tangível da empresa, nas também naquilo cujos investidores acreditam ou esperam (ou rezam) para ela valer no futuro. Este elemento de esperança está ausente, é claro, dos cálculos de valor contábil severos.

Por que manter companhias adquiridas ao seu mero valor contábil? Por que não as estabelecer como empresas independentes, criar ações para elas, vender algumas destas ações para o público e deixar o mercado inflar o seu valor?

Primeiro divide as principais divisões operacionais em três corporações. Cada uma destas três corporações emite suas próprias ações. A companhia controladora (holding) mantém aproximadamente 75% a 80% das ações em cada caso. O resto é oferecido ao público.

O público faz o esperado. Os investidores puxam uma alta dos preços das ações das três corporações recentemente formadas. A matriz, com mais de três quartos destas ações, se torna então capaz de representar suas companhias adquiridas em termos do valor de mercado em vez do valor contábil. O valor aparente da companhia controladora também se elevou como resultado — e o mesmo aconteceu com o preço de mercado de suas próprias ações.

É um exemplo do uso inteligente do DDO. Ganha algo por nada. Todo o negócio custa quase nada além do gasto puramente administrativo e burocrático envolvido em emissões de ações.

Mas você pode fazer mais, adquirindo, em termos de vendas, uma empresa duas vezes o tamanho da sua. E como fará isso? Usando o DDO.

Se a empresa está subestimada — em relação às suas receitas e em relação a outras companhias em linhas similares de negócios – suas ações estão sendo negociadas a um preço baixo. As razões podem ser múltiplas, mas a mais notável entre elas é o fato de sempre ser uma companhia não promotora de si mesma ou suas ações tanto quanto a maioria de seus competidores. Investidores não prestam muita atenção nela.

O preço das ações é baixo o suficiente de maneira poder comprar uma participação acionária controladora relativamente barata. Onde você conseguiria o dinheiro? Com empréstimos, usando as próprias ações em forte alta para dar suporte ao seu crédito.

Você toma emprestado, compra algumas ações da empresa pretendida no mercado aberto e consegue o resto através de uma oferta de compra para os acionistas existentes. Assim, a companhia passou a fazer parte da sua holding.

Mas agora você tem uma dívida. O problema seguinte é se livrar deste fardo. Sua abordagem para o problema é transferir a maior parte da dívida para os livros contábeis da companhia adquirida. Tecnicamente falando, o dinheiro passa a ser devido pela comprada em vez de ser pela empresa controladora.

Então, como havia feito com a própria empresa original de sua holding, divide a comprada em três corporações separadas ao longo das linhas de produtos naturais da empresa. Cada uma destas três companhias novas é autorizada a emitir as próprias ações.

A maior parcela das novas ações torna-se a propriedade da empresa controladora, sua holding, e o resto é vendido ao público. O dinheiro trazido pela venda pública pode ser suficiente para pagar toda a dívida transferida originalmente para os livros contábeis da companhia comprada – e dividida.

Você consegue adquirir uma empresa gigantesca sem usar, no fim das contas, muito dinheiro de sua própria empresa.

Mas o melhor ainda está por vir. Investidores puxam uma alta dos preços das ações das novas empresas abertas, motivados em parte pelo conhecimento de você estar na direção. Sua holding é proprietária de mais de três quartos das ações das três companhias abertas. Enquanto os preços das ações sobem, da mesma maneira ocorre com o valor das companhias como registrado nas declarações financeiras da matriz.

No fim das contas, as participações acionárias da holding nas três companhias, em termos do preço de mercado, valem quase duas vezes o que a antiga companhia valia antes da aquisição. E mais uma vez, é claro, o preço de negociação da sua holding dispara para o alto.

Entendeu por que a casta dos mercadores ultraliberais de bancos de negócios, agora de posse do Poder Executivo brasileiro, sonha em transformar a economia de endividamento em economia de mercado de capitais? Enriquecerão ainda mais com jogadas como essa.

Aquisição de Participações Acionárias com Dinheiro dos Outros publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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