quarta-feira, 27 de março de 2019

Liberalismo Clássico de Esquerda

O liberalismo é uma doutrina político-econômica e sistema doutrinário cuja característica maior se refere à sua atitude de abertura e tolerância a vários níveis. De acordo com essa doutrina, o interesse geral requer o respeito pela liberdade cívica, econômica e da consciência dos cidadãos.

O liberalismo surgiu na época do iluminismo, no século XVIII, contra a predominância, até então, da Monarquia Absolutista dinástica. Passou a defender a razão humana e o direito inalienável à ação e realização própria, livre e sem limites, serem o melhor caminho para a satisfação dos desejos e necessidades da humanidade. Este otimismo da razão exigia não só a liberdade de pensamento, mas também a liberdade política e econômica.

O liberalismo, em seu significado original, é defendido pela esquerda norte-americana. O neoliberalismo, em defesa apenas da liberdade econômica individualista ou empresarial, é defendido pela direita latino-americana.

O significado original do Iluminismo, quando se expressou em um movimento intelectual ocorrido na Europa do século XVIII, em particular na França com grande desenvolvimento da Ciência e da Filosofia, após as revoluções burguesas, passou a ter grande influência no contexto cultural, social, político e espiritual em diversos países. Onde o movimento teve maior expressão, as heranças feudais se chocavam com o capitalismo emergente. A burguesia, liderando camponeses e operários, se lançou contra a nobreza e o clero. Aquelas classes emergentes nas cidades disputaram a direção do movimento.

Também conhecido como “Época das Luzes”, foi um período de transformações na estrutura social, onde os temas giravam em torno da Liberdade, do Progresso e do Homem. O Iluminismo foi um processo desenvolvido para corrigir as desigualdades da sociedade e garantir os direitos naturais do indivíduo, como a liberdade e a livre posse de bens.

René Descartes lançou as bases do racionalismo como a única fonte de conhecimento. Acreditava existir uma verdade absoluta. Sua busca consistia em questionar todas as teorias ou ideias pré-existentes. Sua visão é resumida na frase: “penso, logo existo”.

O liberalismo acreditava no progresso da humanidade a partir da competição das forças sociais, inclusive as forças de mercado. Era contrário às determinações das autoridades (religiosas ou estatais) sobre a conduta do indivíduo, tanto no campo ideológico como no campo material, quando a burguesia adotou a postura de uma desconfiança básica sobre todo o tipo de obrigação (individual e empresarial) a respeito do pagamento de impostos progressivos para diminuição da desigualdade social.

Na sua origem, o liberalismo defendia não só as liberdades individuais, mas também as dos povos. Chegou mesmo a colaborar com os novos movimentos de libertação nacional surgidos durante o século XIX, tanto na Europa como nos territórios ultramarinos, sobretudo na América Latina.

No âmbito político, o liberalismo deu os seus primeiros passos com a Revolução e Americana (1783) e Francesa (1789). Os Direitos Humanos constituíram seu projeto político universal.

O liberalismo foi adotado como ideologia econômica pela burguesia industrial. Amparada por essa ideologia, conseguiu conquistar uma posição predominante nos países de capitalismo retardatário (Estados Unidos, Alemanha, Japão, etc.), durante o século XIX e até a I Guerra Mundial, quando se tornou a força política dominante em quase todo o mundo ocidental. Posteriormente, em países de capitalismo tardio, o Estado foi orientado, seja por castas dos militares, seja por castas dos sábios-tecnocratas, para a intervenção econômica em grandes projetos de investimento em infraestrutura e proteção do mercado nacional, para o capital nacional e o investimento direto estrangeiro, através de medidas de política econômica.

O princípio da liberdade na vida econômica, proclamado pelo liberalismo, se desenvolveu primeiramente em condições de grandes desigualdades sociais nos primórdios da revolução industrial inglesa. Posteriormente, na Europa, enfrentou uma forte reação através das doutrinas socialistas e comunistas, cujos movimentos se tornaram opositores do liberalismo bem mais fortes em lugar das correntes conservadoras.

Nos Estados Unidos, graças à conquista do Oeste pelo Estado militar e à concessão de terras a quem participasse do genocídio dos nativos, inclusive mexicanos habitantes da Flórida, do Texas e da Califórnia, e/ou fugisse da escravidão do Sul durante a Guerra Civil (1860-1865), a repartição de renda e riqueza obtida por esses imigrantes não foi tão desigual. Houve, assim, a possibilidade de uma pequena burguesia se associar à grande burguesia através do mercado de ações. O imaginário social da paradoxal mistura entre nacionalismo e individualismo, em defesa do “sonho norte-americano”, passou a ser adotado inclusive pela esquerda norte-americana.

O fracasso do liberalismo face aos grandes problemas políticos e sociais, depois da I Guerra Mundial, surgidos na Europa central, teve como consequência a Alemanha, Itália e outros países mergulharem em crises profundas e prolongadas. Isso contribuiu para o florescimento de regimes totalitários: fascismo, nacional-socialismo, falangismo, etc. Posteriormente à II Guerra Mundial, e face a outros movimentos de tendência democrata-cristã ou socialdemocrata, o liberalismo ressurgiu, pretendendo constituir de novo uma opção no campo político e socioeconômico.

Do ponto de vista econômico, o liberalismo vem dos fisiocratas, de Adam Smith e da Teoria do Livre Cambismo (comércio livre), desenvolvida por eles contra o mercantilismo: um conjunto de ideias e práticas econômicas executadas pelos Estados absolutistas europeus durante a Idade Moderna, posterior ao período do Feudalismo. O Mercantilismo representava a intervenção do Estado sobre a economia ao criar uma série de processos protecionistas. Eles garantiam o enriquecimento dos monarcas com base na quantidade de tesouros: metais preciosos como ouro e prata.

Laissez-faire é parte da expressão em língua francesa laissez faire, laissez aller, laissez passer. Significa, literalmente, “deixai fazer, deixai ir, deixai passar”. Simboliza o liberalismo econômico, na versão mais pura de capitalismo, quando o mercado deve funcionar de maneira competitiva, sem interferência, taxas nem subsídios, apenas com regulamentos suficientes para proteger os direitos de propriedade. Esta filosofia econômica teve seu início nos Estados Unidos e nos países da Europa, desde o fim do século XIX até o início do século XX.

O liberalismo político implicava a restrição do poder estatal, não permitindo o Estado interferir em alguns direitos fundamentais dos indivíduos, como o direito à vida, à felicidade e à liberdade. Daí à restrição da interferência econômica é um passo não dado pela esquerda norte-americana.

O propósito do liberalismo social é defender os direitos humanos e as liberdades civis dos cidadãos contra possíveis atos de opressão do Estado. No entanto, o liberalismo social vai além disso, porque defende o Estado proporcionar aos cidadãos oportunidades no contexto econômico, da saúde, da educação, etc.

No Brasil, a esquerda necessita entender e adotar as bandeiras-de-luta do liberalismo social e político. Coerentemente, deve também se aliar ao liberalismo econômico no tocante à defesa do mercado competitivo, inclusive no caso do mercado de trabalho, quando o mérito pessoal deve ser o critério único de nomeação para cargos públicos e ascensão profissional. Com isso ela rejeitará a predominância, inclusive no governo de esquerda (2003-2014), de nomenclatura, nepotismo, familismo, aparelhamento, etc. E ultrapassará a fase de protecionismo à burguesia industrial golpista, necessária na fase de indústria nascente, mas não mais hoje. Quem não for competitivo, não se deve estabelecer com base em favores corruptos estatais.

O pior capitalismo é o capitalismo de compadrio aqui predominante. A maior arma contra ele é o capitalismo de mercado competitivo com planejamento estatal e sem favorecimento espúrio ou corrompido.

 

Liberalismo Clássico de Esquerda publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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