Mirella Sampaio é economista da Itaú Asset Management Felipe Tâmega é economistachefe da Itaú Asset Management. Publicaram artigo (Valor, 30/04/19) em coautoria sobre a estatística do mercado de trabalho após a reforma trabalhista.
Foram diversas as sequelas da grave crise econômica pela qual o Brasil passou nos últimos anos, mas talvez poucas sejam motivo de tanta preocupação quanto a situação do mercado de trabalho. De fato, mesmo com os sinais de recuperação gradual da economia, ainda há 13,4 milhões desempregados buscando uma oportunidade de emprego.
A situação é ainda mais dramática quando levamos em consideração esse número não considerar aqueles desistentes de procurar uma ocupação (os chamados desalentados) ou os que, por algum motivo, trabalham menos horas do que gostariam (subutilizados). [Ver os números abaixo.]
As distinções entre as estatísticas de emprego nas manchetes não se limitam a essas definições. Coexistem no Brasil – assim como em diversos países – diferentes pesquisas que se debruçam sobre esse tema, entre elas a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C), do IBGE, e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. Além de serem calculadas por órgãos distintos, cada uma dessas pesquisas retrata um aspecto particular de nossa economia.
A Pnad-C é uma pesquisa por amostra probabilística que acompanha a situação de indivíduos ao longo de um período, formando uma espécie de filme da situação de emprego de diferentes famílias ao redor do Brasil. Já o Caged se assemelha a um censo, sendo construído a partir de todos os registros de admissão e desligamento em um determinado período, como uma foto mensal do mercado de trabalho.
Ao quantificar os registros dos fluxos formais, o Caged acaba por não capturar a situação de uma parcela relevante de nossa população, que trabalha por conta própria ou na informalidade. Ao ser construída a partir de uma amostra, a Pnad-C sofre de conhecidas limitações estatísticas, podendo não ser um retrato fiel da realidade. [?!]
Na medida em que capturam aspectos distintos, cada uma dessas pesquisas traz consigo algumas vantagens e desvantagens. Uma alternativa seria usarmos informações do mercado de trabalho formal disponibilizadas via Caged como um complemento aos dados da Pnad-C. Com isso, combinaríamos o censo do emprego formal com uma medida estatística da informalidade e do auto emprego.
O contexto atual, no entanto, impõe restrições a essa alternativa. Com a aprovação do projeto de lei 13.467, ocorreu uma importante alteração das leis que regem o mercado de trabalho, equivalente a uma quebra estrutural que tende a afetar, sobretudo, o emprego formal.
Em uma avaliação superficial dos dados do Caged, seria difícil tirar conclusões claras nesse sentido. A melhora vista no saldo entre admitidos e demitidos nos últimos trimestres pode refletir tão somente a recuperação da economia. A história muda de figura, no entanto, quando nos aprofundamos na análise dos seus microdados: em primeiro lugar, mais de 180 mil vagas criadas desde a reforma estão associadas a contratos de 1 a 9 horas semanais — um número pequeno dentro do universo total de empregos, mas um salto de mais de 40% para essa categoria específica desde que a reforma foi implementada.
Em segundo lugar, os dados revelam mais da metade desses contratos foram firmados entre indivíduos e empresas de setores esperados de se beneficiarem da flexibilização dos contratos, tais como educação, comércio e atividades administrativas. Eles absorveram cerca de 35%, 16% e 11% dos contratos firmados desde quando a reforma se tornou efetiva.
Diante dessas evidências, nos parece razoável supor ter havido uma migração de pessoas que talvez antes fossem contratadas informalmente e que agora passaram a ter as suas carteiras assinadas.
No artigo “A reforma trabalhista e seus impactos na economia” afirmamos que o equilíbrio do mercado de trabalho sofreria uma alteração por conta da reforma, provavelmente consistente com um aumento do nível de emprego. De fato, encontramos sinais de que algo já mudou na dinâmica do mercado de trabalho do ponto de vista não só legal, mas também prático.
Na medida em que o Caged é um retrato fiel dos contratos firmados, mas não do emprego efetivo (isto é, horas trabalhadas e renda aferida), parece ser mais adequado analisar a questão do emprego e do desemprego a partir da Pnad-C. Afinal, podemos nos deparar com a situação em que um aumento no número de contratos de trabalho reflita, na verdade, uma elevação dos contratos firmados por trabalhador, sem que essa situação gere um aumento efetivo do emprego ou do número de horas trabalhadas por indivíduo. Isso não significa que a estatística esteja incorreta, mas sugere que um aumento dos fluxos no Caged possa não se traduzir em um aperto do mercado de trabalho.
Esperamos que, com o devido tempo, seja possível fazer outros exercícios e testar com maior robustez a validade dessas conclusões. Por enquanto, nos resta acompanhar atentamente a evolução do mercado de trabalho, mantendo em mente as características de cada tipo de estatística disponível, e lembrando que a relação entre a recuperação do mercado de trabalho e aceleração do consumo pode não mais seguir os mesmos coeficientes que vigoravam antes da reforma trabalhista.”
A taxa de desocupação (12,7%) no trimestre encerrado em março de 2019 subiu 1,1 ponto percentual (p.p.) em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (11,6%) e caiu -0,4 p.p. em relação ao trimestre móvel de janeiro a março de 2018 (13,1%)
Indicador / Período | Jan-Fev-Mar 2019 | Out-Nov-Dez 2018 | Jan-Fev-Mar 2018 |
---|---|---|---|
Taxa de desocupação | 12,7% | 11,6% | 13,1% |
Taxa de subutilização | 25,0% | 23,8% | 24,6% |
Rendimento real habitual | R$2.291 | R$2.276 | R$2.259 |
Variação do rendimento real habitual em relação a: | 0,7% (estabilidade) | 1,4% (estabilidade) |
A população desocupada (13,4 milhões) cresceu 10,2% (mais 1,2 milhão de pessoas) frente ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (12,2 milhões). Em relação a igual trimestre de 2018 (13,6 milhões), a variação não foi estatisticamente significativa.
A população ocupada (91,9 milhões) caiu -0,9% (menos 873 mil de pessoas) em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 e cresceu 1,8% (mais 1,6 milhão de pessoas) em relação ao mesmo trimestre de 2018.
A população fora da força de trabalho (65,3 milhões) ficou estável frente ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (65,1 milhões) e subiu 1,0% (mais 649 mil pessoas) frente ao mesmo trimestre de 2018 (64,6 milhões).
A taxa de subutilização da força de trabalho (25,0%) no trimestre encerrado em março de 2019 é recorde da série histórica iniciada em 2012, com alta de 1,2 p.p. em relação ao trimestre anterior (23,8%). No confronto com o mesmo trimestre móvel do ano anterior (24,6%), a variação não foi estatisticamente significativa.
A população subutilizada (28,3 milhões) é recorde da série, com altas em ambas as comparações: mais 5,6% (1,5 milhão de pessoas) em relação ao trimestre anterior e de 3,0% (mais 819 mil pessoas) em relação ao mesmo trimestre de 2018.
O número de pessoas desalentadas (4,8 milhões) subiu em ambas as comparações: mais 3,9% (180 mil pessoas) em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 e mais 5,6% (256 mil pessoas) em relação ao mesmo de 2018.
O número de empregados no setor privado com carteira assinada (exclusive trabalhadores domésticos) foi de 32,9 milhões de pessoas, ficando estável em ambas as comparações. Já o número de empregados sem carteira assinada (11,1 milhões) caiu (-3,2%) em relação ao trimestre anterior (menos 365 mil pessoas) e subiu 4,4%, (mais 466 mil pessoas) comparado ao mesmo trimestre de 2018.
A categoria dos trabalhadores por conta própria (23,8 milhões) ficou estável em relação ao trimestre anterior e cresceu 3,8% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior (mais 879 mil pessoas).
O rendimento médio real habitual (R$ 2.291) ficou estável em ambas as comparações. Amassa de rendimento real habitual (R$ 205,3 bilhões) ficou estável contra o trimestre anterior e cresceu 3,3% em relação ao mesmo trimestre de 2018.
Quadro 1 – Taxa de Desocupação – Brasil – 2012/2019
A taxa de desocupação foi de 12,7% no trimestre móvel encerrado em março de 2019 e subiu 1,1 p.p. em relação ao trimestre móvel de outubro a dezembro de 2018 (11,6%). Em relação ao trimestre móvel de janeiro a março de 2018 (13,1%), houve queda de -0,4 p.p..
No trimestre de janeiro a março de 2019, havia 13,4 milhões de pessoas desocupadas no Brasil. Esse contingente cresceu 10,2% (mais 1,2 milhão de pessoas) frente ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (12,2 milhões) e não teve variação estatisticamente significativa em relação a igual trimestre de 2018 (13,6 milhões de pessoas desocupadas).
A taxa composta de subutilização da força de trabalho (percentual de pessoas desocupadas, subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas e na força de trabalho potencial em relação a Força de trabalho ampliada) foi de 25,0% no trimestre de janeiro a março de 2019, com alta de 1,2 p.p. em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (23,8%). Em relação ao mesmo trimestre móvel de 2018 (24,6%), houve estabilidade.
Taxa Composta de subutilização da força de trabalho – trimestres de janeiro a março – 2012/2019 – Brasil (%)
No trimestre de janeiro a março de 2019, o número de pessoas subutilizadas no Brasil chegou a 28,3 milhões. Este contingente subiu 5,6% (mais 1,5 milhão de pessoas) frente ao trimestre de outubro a dezembro de 2018, quando a subutilização foi estimada em 26,8 milhões de pessoas. No confronto com igual trimestre de 2018, quando havia 27,5 milhões de pessoas subutilizadas, houve alta de 3,0%, (mais 819 mil pessoas).
O contingente de pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas foi de aproximadamente 6,8 milhões no trimestre de janeiro a março de 2019. Houve estabilidade em relação ao trimestre anterior (outubro a dezembro de 2018) e alta de 10,2% em relação ao mesmo trimestre de 2018.
A força de trabalho potencial no trimestre de janeiro a março de 2019 foi estimada em 8,169 milhões de pessoas e foi recorde da série. Esta população cresceu em ambas as comparações: mais 4,7% (364 mil pessoas) em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 e mais 5,7% (443 mil pessoas) frente ao mesmo trimestre de 2018.
A força de trabalho potencial é composta por pessoas de 14 anos ou mais de idade, que na semana de referência não estavam ocupadas nem desocupadas, mas possuíam um potencial de se transformarem em força de trabalho.
O contingente fora da força de trabalho no trimestre de janeiro a março de 2019 foi de 65,3 milhões de pessoas, com estabilidade em relação ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 e alta de 1,0% (mais 649 mil pessoas) frente ao mesmo trimestre de 2018.
A população desalentada era de 4,8 milhões no trimestre de janeiro a março de 2019 e cresceu em ambas as comparações: 3,9% em relação ao trimestre anterior (mais 180 mil pessoas) e 5,6% (mais 256 mil pessoas) comparada ao mesmo trimestre de 2018.
O percentual de pessoas desalentadas em relação à população na força de trabalho ou desalentada(4,4%) manteve o recorde da série histórica e mostrou variação significativa nas duas comparações: mais 0,1 p.p. em relação ao trimestre anterior (4,3%) e mais 0,2 p.p. contra o mesmo trimestre de 2018 (4,2%).
A força de trabalho (pessoas ocupadas e desocupadas) foi estimada em 105,3 milhões de pessoas. Houve altas em ambas as comparações: 0,3% (mais 361 mil pessoas) frente ao trimestre anterior e 1,3% (mais 1,3 milhão de pessoas) frente ao mesmo trimestre de 2018.
O número de pessoas ocupadas chegou a 91,9 milhões no trimestre de janeiro a março de 2019, com redução de -0,9% (menos 873 mil pessoas) em relação ao trimestre anterior e alta de 1,8% (mais 1,591 milhão de pessoas) em relação ao mesmo trimestre de 2018.
O nível da ocupação (percentual de pessoas ocupadas na população em idade de trabalhar) foi estimado em 53,9% no trimestre de janeiro a março de 2019, com redução de -0,7 pontos percentuais frente ao trimestre de outubro a dezembro de 2018 (54,5%) e variação positiva (0,3 ponto percentual) em relação ao mesmo trimestre de 2018 (53,6%).
O contingente de empregados no setor privado com carteira de trabalho assinada (exclusive trabalhadores domésticos) chegou a 32,9 milhões de pessoas, com estabilidade em ambas as comparações.
A categoria dos empregados no setor privado sem carteira de trabalho assinada chegou a 11,1 milhões de pessoas, com redução de – 3,2% (menos 365 mil pessoas) frente ao trimestre anterior. Em relação ao mesmo trimestre de 2018, houve alta de 4,4% (mais 466 mil pessoas).
Na categoria dos trabalhadores por conta própria, formada por 23,8 milhões de pessoas, houve estabilidade na comparação com o trimestre anterior e alta de 3,8% (mais 879 mil pessoas) em relação ao mesmo período de 2018.
No período de janeiro a março de 2019, o número de empregadores foi de 4,4 milhões de pessoas, mostrando estabilidade em ambas as comparações.
O número de trabalhadores domésticos chegou a 6,1 milhões de pessoas, com redução de -2,4% em relação ao trimestre anterior e estabilidade frente ao mesmo trimestre de 2018.
O grupo dos empregados no setor público (inclusive servidores estatutários e militares), estimado em 11,4 milhões de pessoas, apresentou queda de -2,0% frente ao trimestre anterior e se manteve estável contra o mesmo trimestre de 2018.
O rendimento médio real habitual (R$ 2.291) ficou estável em ambas as comparações.
A massa de rendimento real habitual (R$ 205,3 bilhões) ficou estável contra o trimestre anterior e cresceu 3,3% em relação ao mesmo trimestre de 2018.
Rendimento médio mensal real habitualmente recebido de todos os trabalhos – Brasil 2012/2019 – (R$)
Estatística do mercado de trabalho após a reforma trabalhista publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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