“Por que as taxas de juros estão tão baixas?
Será que a hipótese da “estagnação secular” ajuda a explicar isso?
Qual é a implicação de taxas de juros tão baixas sobre a provável eficácia da política monetária durante uma nova recessão?
Que outras políticas poderiam ser necessárias experimentar, como alternativa à política monetária ou como uma maneira de elevar sua eficácia?
Essas são as perguntas de macroeconomia mais importantes. São também muito polêmicas.
Recente estudo de Lukasz Rachel e Lawrence Summers joga luz sobre essas interrogações. Seu ponto principal é respaldar e desenvolver a hipótese da “estagnação secular”, revitalizada pelo professor Summers em 2015 como relevante para a nossa era. A mais relevante inovação desse estudo é tratar as grandes economias avançadas como um bloco único. Seguem- se quatro de suas conclusões.
Em primeiro lugar, ocorreu uma queda drástica e progressiva das taxas de juros incidentes sobre ativos seguros, de mais de 4% na década de 1980 para cerca de 0 atualmente.
Em segundo lugar, esta queda secular das taxas de juros reais implica queda aproximadamente equivalente na taxa de juros “neutra” ou “de equilíbrio” (inobservável) – a taxa na qual a demanda se equipara à oferta potencial.
Em terceiro lugar, os governos não estão gerando essa fragilidade estrutural da demanda. Ao contrário, ao expandirem os gastos sociais, os déficits e o endividamento, os governos aumentaram as taxas de juros reais de equilíbrio de longo prazo, mantidas inalteradas as demais variáveis.
Finalmente, mudanças no setor privado teriam, por si sós, gerado uma queda de mais de 7 pontos percentuais na taxa de juros real de equilíbrio. Entre os vários fatores que promoveram essa queda acentuada estão, provavelmente, o envelhecimento da população; a retração do crescimento da produtividade; o declínio da concorrência; e o recuo dos preços dos bens de investimento.
Os autores concluem que a hipótese da “estagnação secular” nas economias de alta renda – uma demanda cronicamente frágil, em relação à produção potencial – é altamente aceitável.
Afinal, escrevem, “antes da crise financeira, as taxas de juros reais de curto prazo negativas, a corrosão dos padrões de crédito e a política fiscal expansionista eram suficientes para garantir um crescimento apenas moderado. O crescimento suficiente na Europa só foi mantido por meio do que, em retrospectiva, parece ter sido um nível de concessão de crédito inquestionavelmente insustentável para a periferia“.
Esta análise tem grandes implicações atualmente. Quando ocorrem as recessões, as taxas de juros reais de curto prazo têm de cair significativamente e a curva de rendimentos (que mostra as taxas pagas pelos bônus em vários vencimentos) tem de assumir uma inclinação fortemente ascendente para que a política monetária estabilize a economia.
Nossa experiência infeliz com o impacto da política monetária prova que passamos a depender muito dos bancos centrais. Mas eles não conseguem administrar com sucesso a estagnação secular. Até pelo contrário, agravam o problema, no longo prazo
Suponhamos, então, que nossas economias estivessem para cair numa recessão profunda, mas ainda tivessem taxas de juros próximas de 0 e taxas nominais muito baixas também. Suponhamos, ainda, que a inflação estivesse em algum ponto entre 0 e 2%. Nesse caso, a reação a uma recessão exigiria taxas de juros nominais de curto prazo fortemente negativas, possivelmente tão baixas quanto -5%. Isso criaria, para falar o mínimo, um cipoal de problemas técnicos, financeiros e políticos.
Essa análise implica que os bancos centrais não estão criando taxas de juros baixas, como acusam seus críticos, e sim fornecendo as baixas taxas de juros reais de que a economia necessita.
Um estudo de Claudio Borio e outros, do Banco de Compensações Internacionais, adota o ponto de vista exatamente contrário: argumenta que os regimes monetários fixam as taxas de juros reais, mesmo no longo prazo – posição que contraria opiniões padrão sobre a necessidade de separar os processos monetários dos reais em economia.
Isso parece difícil de aceitar, em geral. Mas é altamente relevante em um aspecto decisivo: o de que as taxas de juros desempenham grande papel na condução dos ciclos de crédito. Na verdade, é assim que a política monetária funciona, normalmente.
Se o banco central quiser elevar a inflação em uma economia dotada de uma demanda estruturalmente fraca, fará isso por meio do estímulo ao crescimento do crédito e do endividamento. Poderá não conseguir elevar a inflação, e sim criar uma crise de endividamento. Isso é deflacionário, não inflacionário.
Portanto, a política monetária pré-crise, voltada para elevar a inflação, criou agora o contrário: um excesso de endividamento deflacionário que opera por meio do que Richard Koo, da Nomura, chama de “deflação do balanço”. Isso, por sua vez, leva a taxas nominais (e reais) ainda mais baixas. Portanto, os mecanismos financeiros empregados para gerir a estagnação secular a exacerbam.
Precisamos de mais instrumentos de política pública. O instrumento óbvio é a política fiscal. Se a demanda privada for estruturalmente frágil, o governo precisará preencher a lacuna. Felizmente, baixas taxas de juros tornam os déficits mais sustentáveis.
De acordo com estudos recentes de Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), e Jason Furman, ex-presidente do conselho de assessores econômicos dos Estados Unidos, juntamente com o professor Summers, essa combinação não é apenas verdadeira atualmente; foi verdadeira no passado. Isso torna a política fiscal uma aposta muito mais segura.
Naturalmente, é essencial perguntar qual é a melhor maneira de usar esses déficits de forma produtiva. Se o setor privado não quer investir, o governo deveria resolver fazer isso. Mas ele pode também aprimorar o incentivo para que o setor privado invista. O mundo precisa fazer enormes investimentos em novos sistemas energéticos: uma mescla de investimentos públicos e privados é, sem dúvida, a melhor resposta.
A credibilidade da tese da “estagnação secular” e nossa experiência infeliz com o impacto da política monetária provam que passamos a depender demasiadamente dos bancos centrais. Mas eles não conseguem administrar com sucesso a estagnação secular. Até pelo contrário, agravam o problema, no longo prazo. Precisamos de outros instrumentos. A política fiscal é o ponto de partida.”
Aqui, no Brasil, não há retomada da atividade econômica em ambiente de preços contidos. Se os neoliberais não apresentam o automatismo do crescimento prometido em uma economia de livre-mercado, começa-se a indicar o juro “neutro” — a taxa capaz de permitir o máximo crescimento sem pressão inflacionária — estar mais baixo em relação ao estimado anteriormente. Esse cenário dos idiotas sugere a queda da taxa Selic até aqui não ter sido suficiente para dar impulso à recuperação da atividade, reforçando o argumento a favor de uma rodada adicional de flexibilização monetária.
A combinação entre atividade fraca e inflação controlada leva ao raciocínio neoliberal de a estratégia do BC não está sendo estimulante o suficiente para incentivar a retomada da economia de livre-mercado. Uma das explicações dos ideólogos é o patamar do juro neutro estar mais baixo.
Os ideólogos passaram a reconhecer “a necessidade de estímulo monetário adicional para garantir, de um lado, uma trajetória de crescimento mais robusto e, de outro, minimizar a probabilidade de continuarmos entregando nos próximos anos trajetórias de inflação inferiores às metas”, afirmou o economista-chefe do banco Safra.
Dizem: o juro neutro pode estar mais baixo do que o pensado anteriormente. A economia cresce abaixo do seu potencial e o hiato do produto está negativo. Isso, combinado com a desaceleração dos gastos públicos, indicaria a necessidade de uma taxa menor.
“Estimo que a Selic possa ser reduzida em 0,5 ponto em 2019, para 6%, de modo que a inflação continue dentro da meta este ano e abaixo do teto em 2020. Esse cenário estaria condicionado à perspectiva de aprovação da reforma da Previdência”, diz a ladainha de sempre propagada acriticamente no principal jornal econômico do país.
O juro real (descontada a inflação) de curto prazo está acima da taxa neutra, ou seja, a política monetária não está estimulante. O juro real é insuficiente para reduzir o grau de ociosidade da economia.
“Para haver retomada, precisaria de uma queda adicional de juros e choque de confiança com redução de incertezas, o que pode acontecer após a aprovação da reforma da Previdência”, dizem os sabidos-sacerdotes pregadores de ideologia.
Reformas econômicas recentes, como a trabalhista, a criação da taxa de longo prazo (TLP) e o teto de gastos favorecem a queda do juro neutro na visão do economista-chefe do Bradesco. O juro neutro é uma variável não observável. O que se observa é a inflação e a atividade. “Ambas, incluindo as expectativas de inflação, sugerem que o hiato no país é muito grande ou que o juro real está muito pouco abaixo do neutro, uma vez que a retomada segue lenta e sem pressões inflacionárias.”
Ele pondera, no entanto, não ter a certeza de a Selic estar de fato pouco estimulante ou se é apenas defasagem da resposta da atividade aos juros.
“Existe uma diferença no debate sobre a taxa neutra no curto prazo e longo prazo”, diz outro economista-chefe, este do Banco Votorantim. “No curto prazo, se os canais de crédito estiverem entupidos, isso derrubaria a taxa neutra, então, haveria espaço para juros mais baixos.”
Mas ele prefere olhar a taxa neutra de médio e longo prazo. “O que derrubaria a taxa seria um ajuste fiscal mais importante e o programa de privatizações.” Essa mudança não acontece rápido e, com a baixa produtividade, ele aponta a taxa estar hoje entre 4% é 5%. “Minha visão é que o país ainda tem muitas deficiências em infraestrutura, e a taxa neutra é alta, embora tenha tendência de redução”, afirma.
Outros profissionais picaretas de O Mercado também preferem adotar leitura ainda mais conservadora. Isso porque não sabem nada a respeito do futuro e se recusam a reconhecer o movimento de curto prazo poder ser apenas pontual, tendo de ser revertido em pouco tempo.
Para o pequeno economista de uma grande gestora, o BC poderia cortar juros, desde que considere que o hiato esteja maior do que se calculava anteriormente ou que ele demore mais para fechar. “A política monetária já está estimulativa, mas o debate agora é se a economia precisa de mais estímulo ainda”, diz o profissional.
Sinto vergonha dessas declarações de economistas profissionais. Denigrem a categoria.
Assimetria da Política Monetária: Juros Altos derrubam Economia, Juros Baixos não expandem Economia publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com
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