sábado, 24 de agosto de 2019

Ameaças ao FGTS

Edna Simão (Valor, 20/08/19) anuncia nova ameaça à política social ativa por parte da equipe econômica contra O Estado e a favor de O Mercado, pouco se importando com A Comunidade.

Com a queda da taxa de juros, a equipe econômica quer reformular não só a política de investimentos do FGTS como também o montante de recursos destinados como subsídios à compra da casa própria para famílias de baixa renda do Minha Casa, Minha Vida (MCMV) e as taxas cobradas pela Caixa Econômica Federal para garantir sua sustentabilidade ao longo de dez anos.

O diretor do departamento do FGTS no Ministério da Economia, Igor Villas Boas, que também é presidente do conselho curador do FGTS, anunciou a permissão de saque vai retirar do fundo R$ 40 bilhões entre este e o próximo ano para estimular a economia. De imediato, por já estarem muito baixos, não haverá redução dos investimentos em habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana. O fundo social tem R$ 100 bilhões aplicados em títulos públicos e não será necessário antecipar a venda de papéis para fazer frente aos saques no fundo.

No longo prazo, no entanto, a situação é bem diferente. Segundo Villas Boas, a conta não fecha porque 60% dos ativos do fundo estão aplicados no setor de habitação. Se forem incorporados os subsídios de algo em torno de R$ 9 bilhões ao ano, esse percentual tem retorno zero, chegando, às vezes, a ser negativo para o FGTS. Por isso, os 40% restantes devem ter uma rentabilidade de modo a compensar essa perda e garantir a retorno dos saldos das contas dos trabalhadores de 3% mais TR, o que corresponde a praticamente R$ 15 bilhões por ano.

Esse é o desafio do fundo para os próximos dez anos. O FGTS precisa de um equilíbrio, boa solução e boa aplicação dos recursos.

Com a criação do Programa Minha Casa, Minha Vida em 2009, a destinação de subsídios para a cada própria subiu consideravelmente e agora está na casa dos R$ 9 bilhões. Foi instituída em um outro momento econômico, quando as aplicações em títulos públicos feitas pelo FGTS custeavam com sobra essa conta. Em janeiro de 2009, a taxa básica de juros era de 12,75% ao ano. Esse valor caiu gradualmente encerrando em 8,75% ao ano. Atualmente, a Selic está em 6% ao ano. Por isso, os descontos concedidos precisam ser reavaliados.

A ideia é estudar mecanismos para avaliar a efetividade desse desconto para a redução do déficit habitacional e estabelecer metas, por exemplo, de redução desse número ao longo dos anos. Para ele, mesmo com o aumento substancial da concessão de subsídios da casa própria, não houve redução consistente do déficit habitacional. Não precisa reduzir o desconto. Mas é preciso definir uma métrica.

A remuneração cobrada do fundo pela Caixa foi estabelecida em 2008 e equivale a 1% do valor total de ativos. A Caixa teve um ganho real na remuneração de 50% nos últimos dez anos. Em dez anos, os ativos do FGTS foram de R$ 170 bilhões para R$ 530 bilhões.

O estímulo à concorrência, na visão da privataria, poderia ajudar na redução dos custos e no melhor escoamento dos recursos no país.O governo pró-mercado é favorável a concorrência, mas ainda não há decisão sobre permitir que outros bancos façam a gestão dos recursos. É preciso avaliar se esse custo não pode ser menor. Está estudando alternativas, mas está longe de estar definido.

O FGTS tem o papel social de garantir, como prevê a legislação, boas condições de vida ao trabalhador. Mas, para isso acontecer, é preciso fazer com as aplicações do fundo terem retorno nas aplicações feitas pelo fundo, por exemplo, pelo braço financeiro, o FI-FGTS. Se vai assumir um risco maior, é preciso ter rentabilidade mais alta. Até porque é preciso remunerar as contas do fundo e, ao mesmo tempo, conceder descontos para a compra da casa própria e ainda ter recursos para investir em infraestrutura.

Além de estar estudando formas de reduzir receitas e garantir melhor rentabilidade dos investimentos, a equipe econômica está trabalhando para alavancar as receitas.

A medida provisória da liberação do FGTS (MP 889) traz uma mudança porque estabelece as empresas ao realizarem os procedimentos para o recolhimento dessa obrigação façam a chamada “homologação automática“. Nela, há uma confissão de o recolhimento ser devido, mesmo quando a empresa não efetuar o pagamento total. A nova sistemática deve permitir não só melhor fiscalização pela Secretaria de Trabalho, mas também mais celeridade para o trabalhador verificar se os recursos estão sendo depositados e eventualmente acionar a Justiça. Além disso, será desenvolvido um aplicativo para o trabalhador acompanhar os depósitos feitos pelas empresas no fundo e, se for o caso, denunciar quando não forem realizados.

Mais de 225 mil empregadores estão inscritos na dívida ativa da União por não terem realizados depósito nas contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) dos trabalhadores. Segundo dados repassados ao Valor pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), esse débito chegou a R$ 32,1 bilhões em junho, afetando 8 milhões de trabalhadores. A equipe econômica estuda formas para ganhar maior eficiência no recebimento de recursos do FGTS pelos empregadores e também na aplicação dos recursos.

O setor de atividades de atendimento hospitalar lidera o ranking dos que mais devem para o FGTS e estão inscritos na dívida ativa (R$ 1,601 bilhões), seguido por administração pública (R$ 1,545 bilhão) e fabricação de açúcar em bruto (R$ 1,122 bilhão). O valor médio da dívida das empresas é de R$ 143 mil.

O levantamento mostra nove devedores possuírem mais de R$ 100 milhões em débitos; 190 têm débitos entre R$ 15 milhões e R$ 100 milhões, 4.463, entre R$ 1 milhão e R$ 15 milhões; 26.641, entre R$ 100 mil e R$ 1 milhão; 55.713, entre R$ 20 mil e R$ 100 mil, e 137.427, até R$ 20 mil.

A dívida dos empregadores está concentrada no setor privado, mas, do total de devedores, 595 são da administração pública. Do débito total, 6,3% do valor inscrito referem-se à administração pública, incluindo todos os entes públicos.

Segundo dados da PGFN, do total da dívida ativa, 5,5% estão parcelados, o equivalente a R$ 1,7 bilhão. Os parcelamentos envolvem pouco mais de 6 mil devedores ou 2,7% do total de empresas com dívida a título do FGTS. Mais de 70% das empresas com débitos inscritos em dívida ativa a título de FGTS não possuem situação cadastral ativa junto à Receita Federal, sendo que a maior parte delas é considerada inapta ou baixada.

Em 2019, até maio, o total recuperado superou R$ 161 milhões, melhor resultado histórico para esse período parcial. No ano passado, esse valor, incluindo os resultados da PGFN e da Caixa Econômica Federal, superou R$ 343 milhões, tendo registrado quantia de R$ 1,5 bilhão de 2013 a 2018, totalizando mais de 112 mil inscrições em dívida ativa pagas integral ou parcialmente.

Considerando somente os valores recuperados pela PGFN, foram R$ 213 milhões em 2018, um recorde – no período de 2013 a 2018, o total superou R$ 860 milhões. Em 2019, até maio, a PGFN registra R$ 98,6 milhões, maior patamar para o período e 26% acima do recorde anterior (2018).

Para facilitar a cobrança desses débitos, dentre as medidas implementadas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, com o apoio da Caixa, estão:

  1. inclusão das empresas devedoras no chamado Cadin (banco de dados com nomes dos devedores), gerando repercussão negativa de contratação com a administração pública federal;
  2. inclusão dos débitos em situação irregular (não parcelados; não garantidos integralmente; não suspensos por decisão judicial) na lista de devedores do sítio da PGFN na internet e no site do FGTS.

A permanência da empresa com débitos inscritos em dívida ativa, em situação irregular, na condição de não possuir certificado de regularidade com o FGTS, implica, por exemplo:

  1. não habilitação em licitação promovida por órgão das administrações federal, estadual e municipal, direta, indireta ou fundacional ou por entidade controlada direta ou indiretamente por União, Estado e município;
  2. não obtenção de empréstimos ou financiamentos realizados com lastro em recursos públicos ou oriundos do FGTS perante quaisquer instituições de crédito;
  3. não obtenção de isenções, subsídios, auxílios, outorga ou concessão de serviços ou quaisquer outros benefícios concedidos por órgão das administrações federal, estadual e municipal, salvo quando destinados para saldar débitos para com o FGTS.

Ameaças ao FGTS publicado primeiro em https://fernandonogueiracosta.wordpress.com



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